terça-feira, junho 24, 2008

Regras para o financiamento das ONGA

Por Aline Delgado

"O poder exercido pelos órgãos dirigentes das ONGA é elevado e esse poder traduz uma responsabilidade acrescida"

Um partido político é obrigado a regras estritas de gestão financeira. E as Organizações Não Governamentais de Ambiente (ONGA)? Quais as suas regras de gestão financeira?

Actualmente, tem-se verificado que as quotas dos associados nas ONGA têm um peso cada vez menor para o seu financiamento e estas, cada vez mais, recorrem a financiamentos externos de entidades governamentais, empresas públicas ou privadas e fundações.

Tendo as ONGA, como os partidos políticos, poder de influenciar as decisões públicas e/ou privadas sobre questões de grande relevância social, é urgente uma clarificação dos seus financiamentos de forma que possamos avaliar se existem ou não conflitos de interesses que possam limitar a independência da ONGA em questão.

É imprescindível que as ONGA possuam uma estrutura organizacional bem definida, desenvolvendo projectos que representem ganhos evidentes para a sociedade e que justifiquem em pleno a utilização dos donativos que recebem, mostrando-se exemplares e isentas na utilização e gestão desses fundos. Só assim poderão exigir essa isenção e transparência a outros.

Não existe um regulamento para o financiamento das ONGA. Só o financiamento pelo Governo se encontra devidamente regulamentado. Por isso são ditadas regras por quem, internamente, detém o poder, sem a participação dos seus associados ou dos órgãos dirigentes inferiores. Verificam-se assim opções que estruturam as ONGA de forma similar às empresas.

É necessário urgente e que as ONGA preservem a sua identidade de organizações não-governamentais e se dignifiquem perante a sociedade em função da sua actividade, não se reduzindo a acções que só são possíveis em função do dinheiro que entidades exteriores lhes oferecem. Também a dependência de recursos financeiros doados pelo Governo pode levar à aceitação de imposições, principalmente quando a sobrevivência da ONGA passa a estar dependente desse financiamento.

As ONGA devem levar a cabo os projectos que, mesmo não correspondendo aos interesses das entidades exteriores, tenham interesse ambiental. Essa é a sua função e a sua obrigação. Para conseguir tal desiderato as ONGA devem ter, em termos de financiamentos, uma filosofia semelhante à dos partidos políticos. Por que razão, segundo a legislação em vigor, não podem os partidos políticos ser financiados por entidades privadas mas apenas por pessoas singulares? E não será essa mesma razão aplicável às ONGA?

Embora não pretenda sugerir que uma ONGA se transforme em partido político, considero que o poder exercido pelos seus órgãos dirigentes é elevado e esse poder traduz uma responsabilidade acrescida em termos de gestão financeira, nomeadamente no que se refere a financiamentos de entidades privadas.

Não é difícil criar um conjunto de regras que se possam aplicar ao financiamento das ONGA. Por exemplo:

1. Estabelecer um limite máximo anual de subsídios privados.

2. Abertura de conta específica para controlo de toda a movimentação de receitas e despesas, sendo os pagamentos feitos, só por via rastreável (cheque ou transferência bancária).

3. A ONGA deve respeitar os objectivos para os quais o subsídio foi concedido, produzindo, nomeadamente, relatórios periódicos de consulta pública sobre as actividades e despesas realizadas.

4. A entidade patrocinadora deve obedecer a um conjunto de regras de comportamento ambiental e o seu patrocínio deve ser justificado por um enquadramento do projecto patrocinado na sua área de actividade.

5. O projecto financiado deve demonstrar o seu fim social e de utilidade pública e justificar o contributo das entidades que o apoiam.

A “angariação de fundos” possui um conjunto de princípios de ética, definidos a nível internacional, que determina que esta ocupação não deve ser remunerada através de comissões. O “angariador de fundos”, por seu lado, deve manter-se informado sobre a problemática ambiental, encarando a sua profissão como um contributo para a sociedade e não como um acto meramente comercial.

Uma ONGA deve definir, ela própria, um código de ética que garanta uma conduta digna. Deve saber manter-se isenta e livre, para melhor desempenhar a sua função. Quem faz as ONGA são as pessoas que nelas colaboram na defesa do ambiente, não as entidades que as patrocinam.

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Artigo publicado no Público de sábado, dia 21 de Junho de 2008, pág. 46 e reproduzido no blog com autorização da autora

Aline Delgado, Arquitecta. Ex-dirigente da Quercus

14 comentários:

  1. Anónimo25/6/08

    Este artigo dá que pensar. De facto, desde os tempos em que colaborava com uma ONGA da nossa praça, que sinto que, de uma forma generalizada, existe alguma falta de transparência nas acções das ONGA. Hoje, trabalhando para uma ONGA internacional, com apertadas regras nesta matéria, aflige-me mais o facto de, ainda, não haver um controlo dos financiamentos externos apertado e de não existirem projectos com verbas destinadas com a correspondente visibilidade desejada das contas vs benefícios ambientais. E está à vista que são as próprias ONGAS que têm tudo a ganhar ao não dar as costas às vergastadas de qualquer um que se lembre, que a bem da verdade, a continuar assim estarão sempre muito expostas.

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  2. Anónimo25/6/08

    Penso que as coisas tal como estão recomendam-se. Ninguém perde a independência por meter uns cobres no bolso. Observe-se, por ex., a posição da LPN quanto à Mata de Sesimbra: são contra. E quem é o actual presidente da LPN? É precisamente quem que fez o estudo (ambiental...) dos solos da Mata de Sesimbra.

    Pode-se perfeitamente amar a Natureza hoje e ganhar a vida amanhã. Ou vise-versa. Não é um paradoxo nem penitência. É apenas reflexo dos dias que correm.

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  3. Anónimo25/6/08

    Segundo pude ler na imprensa, a LPN nunca se manifestou CONTRA o Projecto da Mata de Sesimbra. Exigiu sempre uma REDUÇÃO da dimensão do projecto e foi sempre uma posição conjunta com outras ONGA, nomeadamenta a Quercus e o GEOTA.

    A propósito do artigo aqui exposto, não posso deixar de achar no mínimo estranho que a Aline Delgado aproveite as eventuais situações irregulares que se passem dentro da Quercus para daí tirar conclusões sobre o movimento ambientalista na generalidade. Revela a meu ver uma profunda ignorância no que toca à forma como outras ONGA são geridas e como a questão dos financiamentos é partilhada com os sócios e sujeita a critérios de transparência.

    Fazer comentários como os que fez não tem qualquer cabimento. Pode fazê-los se quiser em relação à Quercus, já que é conforme assina "Ex-Dirigente" dessa associação e presume-se que a conheça bem por dentro. Contudo, o que se passa nas outras ONGA diz respeito aos sócios dessas ONGA. Não diz respeito a mais ninguém.

    E estabelecer comparações com as estruturas partidárias então é que não faz sentido nenhum. As ONGA nacionais não recebem qualquer tipo de apoio do Estado e vêm sistematicamente as suas oportunidades de participação pública negadas ou desprezadas. Com que legitimidade pode vir alguém como a Aline Delgado ou seja quem for, face a este cenário de desprezo e total autonomia, exigir rigor e transparência?

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  4. Anónimo25/6/08

    O que li, e é fácil encontrar na Net, é que a LPN (e outras ONGA) são CONTRA a Mata de Sesimbra por considerarem essa urbanização perniciosa para o ambiente. Para além da sua dimensão excessiva também encontraram outras imperfeições tais como: Defeitos de planeamento, usufruto das praias e da vila impossíveis, carga turística excessiva, ausência de garantias, especificidade de utilizadores pode pôr em causa objectivos ambientais, Sesimbra insustentável e por aí fora.

    O Victor Magno é magnânimo relativamente à pândega em torno do investimento que as empresas estão a levar a cabo nas ONGA. Também é generoso quando absolve dirigentes apanhados em flagrante com a pata na poça, como no caso do actual presidente da LPN. Mas é duro a criticar quem considera que processos pouco claros podem trazer péssimas consequências ao movimento ambientalista.

    Interessante quando afirma que o que se passa nas ONGA apenas diz respeito aos sócios dessas ONGA. Perfeito! Continuem assim, insistam na opacidade, não invistam na transparência que não é preciso. Que importa a opinião pública supor que os dirigentes das ONGA querem é "tacho" ou que o cargo em si já é um tacho, mercê dos milhares de euros actualmente doados(para projectos...) por empresas benfeitoras?
    Quanta arrogância e falta de visão!

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  5. Sou membro da direcção de uma organização, com ligações internacionais que impõe regras muito rigidas, claras e transparentes no que diz respeito às contas. Mesmo que não fosse devido a essas regras nos estatutos e regulamento interno já estava explicita regras absolutamente leoninas de transparência e controle.
    Penso que é sobre essa questão, e não lateralidades e fulanizações em torno dessas (que podem ter interesse para os CARAS mas não aquecem nem arrefecem os pontos em discussão)que se deve centrar a discussão.
    Auditores externos das contas, regras claras de circulação de dinheiro, regras também claras de financiamento (a organização de que sou dirigente vive só e exclusivamente do dinheiro de sócios e de donativos individuais, a nível nacional e internacional), sendo que os financiamentos como é referido devem ter contabilizações específicas no caso de contratos ou outras especificidades, e os relatórios de execução serem públicos e publicados.
    As questões que se prendem com os dinheiros não são simples mas devem ser claras, auditadas e fiscalizadas exaustivamente.
    Não vejo nenhum problema na mulher de Cesar, nem na história que a justifica, e embora não possamos meter a cabeça na areia e saibamos, todos ou quase todos as várias estórias desta história, com contornos "estranhos" e saibamos que tem que ver com situações na Quercus, penso que é útil abstrair o caso em concreto, que poderá ser discutido a outro nível e noutro local e sobretudo na organização, e lançar a discussão sobre o financiamento das organizações, a democracia e regras de participação e debate nas organizações, a forma de puder levar a cabo um combate político por principios sem esmigalhar esses próprios principios, defender agendas 21 e torpedeá-las ao virar da esquina, isso penso que é uma discussão que deve envolver todas a comuunidade cívica e empenhada em lógicas de sustentabilidade.
    Independentemente do conhecimento ou não que tenha sobre o caso em apreço, é um facto que a Quercus deu um tiro no outro pé. Os processos, ai senhores os processos...esses, esses é que podem e devem ser discutidos.
    António Eloy
    PS Para que não fiquem rabos de palha a organização que refiro é a Amnistia Internacional (secção Portuguesa)

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  6. Anónimo26/6/08

    Muitas pessoas não percebem ou não querem perceber que vivemos, ou deveríamos viver, num estado de direito.

    As ONGA não se podem sobrepor a este estado de direito. Têm direitos mas também têm obrigações. Pela importância e credibilidade que devem ter para a sociedade têm de ser reguladas (ou regulamentadas) para que “interesses” individuais, de grupos ou institucionais não ultrapassem os da sociedade que supostamente deveriam ser os que deveria defender.

    Este artigo põe o “dedo na ferida”. Estabelecer regras para o financiamento das ONGA, não quer dizer que o que todas as ONGA fazem está errado. Simplesmente sublinha a falta de regras... que pelos vistos existe, uma vez que só os financiamentos directos do estado se encontram regulamentados embora o mesmo não se aplica a empresa sobre a sua tutela.

    Cada vez mais, e ainda bem, os cidadãos estão mais sensibilizados e atentos para as questões do ambiente. Preocupam-se, procuram informação e ajuda. As ONGA têm sem duvida um papel da maior relevância.

    As questões ambientais estão na moda e são fonte de geração de riqueza. As grandes empresas têm grandes preocupações na sua imagem ambiental, mas muitas estão-se nas tintas para o ambiente. Fazem campanhas milionárias para terem a imagem de grandes amigos do ambiente quer o sejam quer não.

    Por falar em Mata de Sesimbra. Lembro-me bem que autora deste artigo, a Aline Delgado, na altura ainda não dirigente, mas já voluntária e activista dedicada à Quercus, se empenhou fortemente no parecer sobre o projecto. Foi através dela que o parecer saiu, pela Quercus. Lembro-me de a ouvir "chocada" com a "cidade sustentável" que se pretendia e de dizer, que o facto de se construir uma cidade de raiz já era insustentável...

    Lembro-me de dizer que uma Associação Ambientalista não se devia manter reservada a esta situação. Não descansou enquanto não fez sair um parecer desfavorável a este projecto... em colaboração com o Geota e a LPN, apesar de inúmeras tentativas e aliciamentos para a influenciar a outra tomada de posição. A Aline Delgado é persistente e não abandona os seus ideais.

    Parece que saiu da Quercus e não por vontade própria. Saiu porque a direcção da Quercus, não mais a quis lá, curiosamente no dia em que este artigo foi publicado... Será que foi porque quis tornar a questão dos financiamentos mais transparente e regulamentada? Será que a persistência dela, se tornou incómoda à Associação? Será que pôs em causa os tais interesses individuais ou de grupos e teve de ser cilindrada?

    Por certo, a Quercus e o ambiente em Portugal estão agora, menos "ricos"...

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  7. Anónimo26/6/08

    Caro “anónimo” – (será assim tão difícil dizer o nome?)

    Se o que leu e facilmente conseguiu encontrar na net (conforme diz), sobre a posição que as ONGA assumiram em relação ao projecto da Mata de Seseimbra, foi isso que referiu então deve ter andado a ler o documento errado. Porque eu tenho o parecer à minha frente e não leio a palavra “CONTRA” em lado nenhum. É preciso ser rigoroso com estas questões porque se há algo que danifica a imagem das ONGA é a falsa percepção de que, por defeito, se opõem cegamente a qualquer projecto. A verdade é que na maioria dos casos salientam as virtudes e destacam os defeitos de cada projecto, propondo alternativas e sugerindo formas de conciliar objectivos desses projectos com os requisitos da salvaguarda pelo meio ambiente. Ao “inventar” uma palavra tão forte e que não está lá – como é a palavra “CONTRA” – está a propagar uma mentira.

    Eu não sou magnânimo quanto à “pândega em torno do investimento que as empresa estão a levar a cabo nas ONGA” (usando as suas palavras). O que eu não admito é que se generalize essa suspeita. Isto porque tive o privilégio de conhecer por dentro várias destas associações, ao nível orgânico, e reconheço claras diferenças na forma como lidam com o investimento privado. Que se exija rigor a quem não o tenha mas que se louve quem sempre o teve.

    E quando digo que o que se passa a este nível dentro de uma ONGA apenas diz respeito aos sócios, faço-o no sentido de destacar que uma organização que nasce na sociedade civil, responde apenas perante a sociedade civil. O governo não tem que se imiscuir na forma como a sociedade civil organizada se estrutura. Sobretudo face ao actual estado das coisas, em que as ONGA não são escutadas devidamente! Exige-lhes tudo mas não se respeita o trabalho.

    Já agora, do íntimo do seu anonimato, que legitimidade tem para alegar que se “insiste na opacidade” quando há Relatórios e Planos de Contas e de Actividades disponíveis na net? E que “tachos” são esses que refere? Segundo sei os órgãos dirigentes das maiores ONGA nacionais são em regime de voluntariado! O financiamento que entra para projectos é, com certeza, alvo de auditoria por parte da empresa que o avança. E duvido seriamente que inclua vencimentos de membros de órgãos sociais…!

    Dizer que as ONGA têm direitos mas também têm obrigações é, no mínimo, surreal. Pressupõe que os direitos estão a ser respeitados ao passo que as obrigações não, quando é precisamente o contrário que está a acontecer, dia-a-dia, basta ler as notícias!

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  8. Anónimo26/6/08

    Caro V. Magno:

    Agradeço-lhe a correcção. Porventura as fontes que transmitiram a ideia errada que LPN, Quercus e Geota estavam contra o empreendimento Mata de Sesimbra, tais como:

    http://azeitao-sesimbra.blogspot.com/2006/04/ecologistas-contra-projecto-turstico.html

    http://dn.sapo.pt/2006/04/26/cidades/ecologistas_contra_projecto_turistic.html

    http://lexturistica.blogspot.com/2006/04/turismo-e-ambiente-ecologistas-contra.html

    (isto numa muito rápida busca pela net) também lho agradecem. Porventura poderão perguntar-lhe se afinal as ONGA estavam a favor. Você, com a sua admirável sofistica, conseguirá por certo explicar (ou baralhar) o que para muitos estava claro. Sobre este assunto talvez a Alcide também possa dizer de sua justiça.

    Entre a favor e o contra está o assim-assim. Entre o preto e branco está o cinzento. Bons tempos em que o verde era a cor dos ecologistas.

    O meu nome não lhe interessa para nada, assim como o seu nada me diz. Nos blogs discute-se ideias e é isso que aqui faço. Exemplifico:

    As ONGA não podem transformar-se em agências de empregos. Esta situação é tão nefasta para o movimento ambientalista como foi a passagem (de vários) dos principais dirigentes das ONGA para "tachos" no tempo do (des)governo Gueterres. É para mim incompreensível que, numa Assembleia Geral de sócios de uma das grandes Associações de conservação da natureza, apenas se encontrem sócios/funcionários, sócios/dirigentes ou sócios/coordenadores de projectos pagos.

    Acha que para necessita de saber o meu nome para ler estes 3 simples tópicos?

    Esta não é ideia mas apenas curiosidade: gostaria que as principais ONGA divulgassem não quantos sócios tinham inscritos mas quantos pagavam cotas.

    Quanto à Alcide desejo-lhe força e sorte, apesar de ela também ter feito parte do tal rol dirigente/funcionário/"projectista". Ao menos isso tudo com transparência.

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  9. Anónimo27/6/08

    "Que se exija rigor a quem não o tenha mas que se louve quem sempre o teve."

    Erro! Devemos exigir RIGOR a todas e louvar as que já o têm.

    "E quando digo que o que se passa a este nível dentro de uma ONGA apenas diz respeito aos sócios, faço-o no sentido de destacar que uma organização que nasce na sociedade civil, responde apenas perante a sociedade civil."

    E quem é, no seu entender, a Sociedade Civil? Os sócios? Olhe que não.

    A Sociedade Civil tem, merçê das benesses que são outorgadas a certas entidades de Direito Privado, direitos sobre a forma como essas entidades fazem uso das mesmas. Os Sócios ainda têm mais direitos sobre as mesmas conforme estabelecidos na Constituição, Lei Geral e particular, Estatutos e Regulamentos internos.

    "O governo não tem que se imiscuir na forma como a sociedade civil organizada se estrutura."

    O Estado ao facultar estatutos especiais com amplas implicações fiscais e de Direito de intervenção (seja com tempo de antena seja com isenção de custas judiciais ou com Direito a participação em determinados fora como a Concertação Social) a determinadas entidades de Direito Privado tem todo o direito a regular como essas mesmas entidades se estruturam. E até já o faz em vários documentos legais, caso lhe tenha passado despercebido.

    O que ainda falta é regular a forma como a transparência de determinados actos deve ser tratada.

    "Sobretudo face ao actual estado das coisas, em que as ONGA não são escutadas devidamente!"

    Outra confusão comum. O ESTADO não é o GOVERNO. É algo mais amplo.

    "Exige-lhes tudo mas não se respeita o trabalho."

    "Deixem-nos trabalhar" faz-me recordar qualquer coisa.

    Em todo o caso devo dizer que apostar exclusivamente em "donativos pessoais" é uma falácia com pés de barro.

    É sabido que uma das políticas de marketing (muito usada, por exemplo, nos USA -- talvez os mais regulados do mundo) é a intervenção social e participação activa em organizações da sociedade civil por parte de empresários e dirigentes de topo das empresas. Poderia disponibilizar até alguns documentos de multinacionais americanas em que falam precisamente de como isso é importante para a promoção da imagem das empresas.

    Não é por aí que se consegue "regular" nada mas outrossim pela transparência das contas, dos interesses e dos intervenientes e a sua disponibilização total ao escrutínio público.

    No UK existem estruturas do Estado (ligadas ao Parlamento e não ao Governo) que servem somente para fiscalizar e sancionar as ONG com estatuto de interesse público, e até um tribunal especifico para as mesmas.

    Nestes aspectos concordo em absoluto com o artigo do Henrique.

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  10. Anónimo27/6/08

    «E que “tachos” são esses que refere? Segundo sei os órgãos dirigentes das maiores ONGA nacionais são em regime de voluntariado!»

    Há muitas maneiras de matar pulgas.

    «O financiamento que entra para projectos é, com certeza, alvo de auditoria por parte da empresa que o avança.»

    Nem por isso. Para muitas empresas não passa de marketing e do mais puro greenwashing pelo que auditorias até são desaconselhadas.

    «E duvido seriamente que inclua vencimentos de membros de órgãos sociais…!»

    Há os chamados overheads, que por certo o amigo desconhecerá, que servem para pagar muitas coisas; desde despesas currentes a viagens dos dirigentes e acção política.

    E depois ainda existem outras situações já são menos sérias mas que são por vezes usadas.

    Olhe, lembrei-me agora mesmo do caso da festa de despedida oferecida pela Luta Contra o Cancro a Belém Roseira, lembra-se?

    Ou do carro com motorista particular que a certa senhora usava como presidente da Cruz Vermelha Portuguesa.

    Mais uma vez, há muitas maneiras de matar pulgas. Umas mais honestas e outras menos.

    O problema é que ao se querer obrigar os dirigentes de topo da ONG a serem voluntários se abre o caminho a um único tipo de pessoas e/ou a esquemas pouco claros de suporte económico dos mesmos.

    É que ser dirigente duma ONG, hoje em dia, obriga a dedicação de muito (mesmo muito) tempo.

    A mim não me ofende que os dirigentes de topo ganhem honorários, desde que isso seja claro e transparente para a Sociedade Civil em geral.

    Sempre é melhor do que ser hipócrita.

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  11. Anónimo27/6/08

    Sobre esta parte do meu comentário acima:

    «Em todo o caso devo dizer que apostar exclusivamente em "donativos pessoais" é uma falácia com pés de barro.

    É sabido que uma das políticas de marketing (muito usada, por exemplo, nos USA -- talvez os mais regulados do mundo) é a intervenção social e participação activa em organizações da sociedade civil por parte de empresários e dirigentes de topo das empresas.»


    Este link tem mais ou menos a vêr com o assunto e de como os "individuos" beneméritos por vezes se confundem com os interesses dos "individuos".

    Por cá, e nos partidos políticos onde essa prática hipócrita de financiamento já existe, é ver os resultados e os escandâlos, que vão do CDS ao PS. O PCP tem outra forma de receber os donativos empresariais mas isso não interessa para o caso vertente.

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  12. Anónimo27/6/08

    Em 1998 as ONGA eram ADA. Nesse tempo uma Associação Ambientalista, da qual era dirigente, propôs a aprovação da seguinte moção numa reunião das ADA:

    As Associações de Defesa do Ambiente (ADA) reunidas no dia 14 de Fevereiro de 1998, em Évora, nas instalações do CIAMB (LPN - Évora), solicitam que os dirigentes das ADA assumam, sob compromisso de honra, não ocupar qualquer
    cargo de nomeação política nacional, regional ou local sem que ante tenham decorrido dois anos após a cessação das funções como dirigentes associativos.
    Como principais razões que justificam esta atitude, apontam-se:
    - As preocupações ambientais constituem uma dimensão particular na vida e na sociedade.
    - A força que impele o movimento das ADA apoia-se nas capacidades, conhecimentos e voluntariedade dos seus elementos.
    - As ADA apresentam-se como suporte material e mediático para dirigentes com indesmentível carga tecno-científica.
    - Os poderes político e económico são, por sistema, os principais obstáculos no trajecto das ADA.
    - O exercício político, no caso português altamente profissionalizado substancia-se no poder de influenciar e ramifica-se na persuasão manipulação e autoridade.
    - A coerência e ética são também valores que encaminham as ADA par alertas e acções ecológicas e ambientais.
    - A personalização dos dirigentes não pode subalternizar nem condicionar em proveito próprio a participação activa das ADA.
    - A transparência, formação e informação, meios norteadores das ADA, devem projectar-se em toda a sociedade de modo que em Portugal se consigam atingir níveis de adesão associativa idênticos a outros países da Uniã Europeia.
    - O movimento associativo ambientalista corre o risco de gerar personagens e elites, perder protagonismo e credibilidade, negar-se a si próprio e fragilizar-se perante a sociedade, se se assistir à deserção dos seus dirigentes para cargos políticos.
    - Com o fim de fortalecer e nivelar superiormente a causa ambientalista, os dirigentes têm a obrigação de reflectir uma conduta desinteressada e objectiva, pois a especificidade da forma e conteúdo das ADA demarca-as de quaisquer outros tipos de associações.

    Esta moção foi chumbada, sem apelo nem agrado, pela maioria das ADA. As associações com mais peso foram absolutamente contra. Pouco tempo depois assistiu-se à "fuga" dos principais dirigentes das ADA, ou dos mais mediáticos, para os "jobs made in PS". Alguns, ainda hoje, andam com um pé nas ADA outro nos cargos políticos (sempre PS).

    Não é isso que se passa também no futebol? Pois se o Povão mais esclarecido desconfia da amálgama futebol/política, não desconfiará esse mesmo Povão do ambientalismo politiqueiro?

    Hoje as coisas começam a estar mais sofisticadas, o engraxamento já não se faz com tachos mas com a "massa" que coze nos ditos. Há muitos modos de matar pulgas, como muito bem disse o anterior comentador. O PS é o partido político com os melhores técnicos de marketing (Xicos-espertos para o Povão esclarecido, apenas espertos para a maioria). As empresas que não são públicas também fácilmente aprenderam a lição. Para ser sincero não sei quem inventou a disciplina, se as empresas verdes se o PS.

    Já agora esclareço que, enquanto dirigente da tal associação que apresentou a moção acima referida, nunca QUISEMOS receber um centavo de subsídios. Estava previsto no orçamento da CM da nossa área de actuação uma verba mas recusámo-la peremptoriamente. E fizemos tanta, tanta coisa! Ensino como se arranja dinheiro: cotas dos sócios; venda de rifas; venda de T shirts, bonés, bolsas, etc. com o logótipo da associação, almoços e jantares convívios com leilão de oferendas;...Claro que as primas donas que acima de tudo trabalham para aparecer na TV e jornais, preferem o subsídio (recorrendo a profissionais!!!) que suar estopinhas a engendrar esquemas claros de obter pecúlio.

    Parece que a Aline pretendeu moralizar sem sucesso, acabando por ser expulsa. Há 10 anos outros também o tentaram e não o conseguiram: eu e outros desistimos. Não do ambiente, claro.

    Jaime Pinto

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  13. Anónimo28/6/08

    Caro anónimo,

    Não vejo onde está a sofística ao entender que o que as ONGA referidas no caso do projecto da Mata de Sesimbra exigiam era essencialmente uma redução do projecto. Afirmar que o projecto, tal qual estava, apresentava maior número de defeitos que de virtudes não impede o reajuste do projecto! E isto não é cinzento, é o verde subjacente ao que o desenvolvimento sustentável exige – que se concertem as posições.

    Li com bastante interesse as opiniões tecidas pelo Mário Silva a algumas das minhas afirmações, e acho que é justo tecer algumas considerações com base nesses comentários.

    Quando diz que se deve exigir rigor a todas e louvar as que já o têm, não posso estar mais de acordo. Mas se encontramos os melhores exemplos de rigor precisamente na actuação de algumas ONGA (sobretudo quando comparando com a actuação de algumas estruturas públicas) vale a pena pensar se o nosso esforço de exigência não devia começar por ser dirigido a outras entidades.

    Quanto ao meu conceito de Sociedade Civil é claro que a entendo como o todo que lhe corresponde. Mas não descarto os problemas de representatividade associados ao facto de nem sempre o conjunto dos sócios ser verdadeiramente representativo desse conjunto global. É um problema com efeito, mas para já eu diria que as ONGA e os sócios que as constituem, continuam a ser a melhor opção disponível em termos de representatividade.

    E se é verdade que a Sociedade Civil tem direitos sobre a forma como certas entidades de Direito Privado fazem uso de benesses que lhe são outorgadas, então também valia a pena o Mário ou alguém interessado neste ponto de vista trazer aqui exemplos concretos dessas entidades e das tais benesses…

    E que “amplas implicações fiscais” são essas? E que “estatutos especiais” são esses também que refere? Porque não devem ser os mesmos que eu conheço. Não as apelaria de “amplas” definitivamente, nem de “especiais”.

    Quando falei em “actual estado das coisas” e no facto das ONGA não estarem a ser escutadas devidamente, não vejo de que forma dei a ilusão de confundir Estado com Governo. Acredite que bem sei distinguir os âmbitos!

    Quanto ao exemplo de como as organizações da sociedade civil existem e funcionam nos Estados Unidos da América – país no qual correspondem ao 3º maior sector empregador – é claro que estamos a falar de uma realidade bem diferente! Lá o financiamento privado assenta numa lógica filantropa com pelo menos dois séculos de evolução. Mas não me surpreende que algumas empresas de lá usem a cooperação com as ONGA para se auto-promover, em Portugal acontece o mesmo! O problema é que aqui praticamente SÓ acontece isto. E aí estamos de acordo, há muito greenwashing. Mas também é verdade que os mais preocupados com essa questão estão precisamente nas ONGA. E os que procuram desdramatizar, no governo. Quem assistiu à Conferência de lançamento da iniciativa “Business & Biodiversity” no ano passado, pôde constatar precisamente isso.

    Mas volto a salientar que a nada me oponho em termos de implementação da transparência. Mas se os mecanismos de regulação estiverem nas mãos de estruturas governativas então primeiro que tudo, que se exija idêntico rigor a essas estruturas.

    Quanto à questão dos “tachos”, não é com uma colorida mas inútil expressão como “há muitas maneiras de matar pulgas” que se responde. Que se exemplifique então.

    E engana-se redondamente quando sugere que eu por certo desconheço o conceito de “overheads”. É claro que conheço. São os “overheads” que permitem às ONGA manter fundos de maneio e diversificar o seu próprio financiamento! Não vejo mal algum nisso.

    Quanto ás situações que referiu sobre a Cruz Vermelha Portuguesa ou a Luta Contra o Cancro, não vou tecer qualquer comentário. Eu estou aqui a comentar as ONGA e não as ONG no geral.

    Eu também não me oponho que os dirigentes de algumas ONGA, caso os estatutos aprovados pelos sócios o permitam, tenham vencimentos! Mas não gosto é que se refira isso quase como um status quo, quando a situação actual é precisamente o contrário! A verdadeira hipocrisia está na forma como alguns tentam dar a ilusão de que assim é.

    Ainda um comentário final para o anónimo que nos contou a estória de uma votação que não seguiu no rumo que gostava que tivesse seguido. A democracia tem destas coisas… nem sempre se ganha. Mas dizer que as “associações com mais peso foram absolutamente contra” sem nos explicar que argumentos usaram para sustentar essa posição, é deixar a estória mal contada… Teria sido uma grande lição de ética se tivesse aprovado tal moção, lá isso é verdade. Sobretudo face a notícias recentes de ex-governantes que saem para ocupar cargos em grandes empresas cujo âmbito governativo abrangia. Mais uma vez teria sido a Sociedade Civil a pioneira na procura de algum decoro.
    Quanto às formas de ganhar dinheiro, tão diversificadas que referiu – acho que estamos todos de acordo, devem e estão a ser usadas.

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  14. Anónimo1/7/08

    "vale a pena pensar se o nosso esforço de exigência não devia começar por ser dirigido a outras entidades" - VM

    O esforço de exigência deve ser com todos e principalmente com o Estado e com as entidades que beneficiam de estatutos especiais.

    «E que “amplas implicações fiscais” são essas? E que “estatutos especiais” são esses também que refere? Porque não devem ser os mesmos que eu conheço» - VM

    Vá lá lêr a Lei.

    «Quanto à questão dos “tachos”, não é com uma colorida mas inútil expressão como “há muitas maneiras de matar pulgas” que se responde. Que se exemplifique então.» - VM

    Só alguns exemplos que não tenho tempo para detalhar:

    1. Despesas de representação
    2. Ida a colóquios internacionais em nome da entidade e colocar a ida no curriculo profissional sem mencionar a dita ONG. Certas idas são muito boas para o curriculo universitário de alguns.
    3. Consultorias como individuo em resultado da sua participação em ONG (já aconteceu como sabe).
    4. "tachos" público ou privados resultantes em parte da participação orgãos de ONGs, até lhe dava exemplos mas faça o favor de procurar os dirigentes das maiores ONG nos últimos anos e vêr onde é que andam todos.
    4. Muita outras formas de "matar pulgas" que lhe poderia indicar mas deixo à sua vontade de pesquisar.

    «Eu também não me oponho que os dirigentes de algumas ONGA, caso os estatutos aprovados pelos sócios o permitam, tenham vencimentos» - VM

    Como você bem sabe a maioria hipocritamente não permite.

    Mas explique-me lá como é que alguns têm tanto tempo para dedicar diariamente às suas ONGs e de forma pública e notória? São ricos? Têm patrões complacentes? São professores universitários ou de outros empregos interessantes no Estado e por isso não precisam de trabalhar nos seus empregos pagos por todos nós?

    A verdadeira hipocrisia é fingir que não se vê nada de estranho e achar que não é preciso nenhuma transparência nem fiscalização.

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