quinta-feira, outubro 28, 2004

O ICN visto de dentro...

Utilizando os meios internos do ICN, divulguei o debate na ambio sobre o seu futuro escrevendo no final da nota que enviei aos meus colegas uma frase provocatória “Não se esqueçam que responsáveis não são só os responsáveis, são também os que não pedem responsabilidades aos responsáveis”.

Na volta do correio recebi uma resposta cujos extractos que abaixo se reproduzem pedi ao gestor do Blog que fossem utilizados como comentários aos textos já enviados como ilustração de um estado de espírito que existe no interior da instituição. Não retrata o ICN todo, evidentemente, mas parece-me suficientemente expressivo de uma parte.

Henrique Pereira dos Santos

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“… Parece-me que há um equívoco na frase que utilizas: "são também os que não pedem responsabilidades aos responsáveis". A minha experiência, nos últimos anos diz-me que o que tenho feito é pedir responsabilidades a irresponsáveis. … É a estes que peço responsabilidades? Estou muito cansado de fazer isso e há mais vida e conservação da natureza "para lá" do ICN.

Quanto ao forum de discussão da Ambio, eu fico sempre mal disposto quando leio [algumas] coisas ... Isto porque são pessoas ligadas à conservação da natureza, a quem é dado crédito ao mais alto nível … mas que nada sabem da realidade da conservação no dia a dia (o que nós sofremos para fazer qualquer coisita, o que é esbanjado, a "corrupção" de forma dos processos, as irregularidades, os abusos cometidos por funcionários e os olhos fechados dos chefes, as incapacidades de dar respostas às coisas mais simples, o acumular e prolongar de dívidas que estes serviços têm em qualquer acção que fazemos, as vergonhas que passamos e um número infinito de coisas pequenas e grandes que impedem o ICN de cumprir os seus objectivos). E nem sequer conseguem perceber que a PAC fez mais conservação da natureza que o ICN, nos últimos dez anos e que talvez fosse este o caminho a tomar. Fazer com que o ICN trabalhasse com as pessoas pagando-lhes os serviços de conservação da natureza, mesmo que o serviço fosse não fazer.

… Desculpa lá o desabafo, … mas parece-me que isto, a solução, é muito maior que os forums de discussão. Devia era haver forums de reflexão em que tudo estava caladinho e só se pensava nas situações e nos factos que lhes seriam colocados. Por exemplo, o ICN nunca gerir a floresta nas APs, O ICN ter há muitos anos a possibilidade de fazer um calendário venatório para as Áreas Classificadas e nunca o ter feito; haver … funcionários … que ganham o ordenado como os outros e nunca cá põem os pés … O ICN pagar portos de pesca … mas não comprar dispositivos de prevenção de prejuízos e de preferir dar licenças de espantamento para matar abelharucos e outras espécies. Enfim, milhares de outras coisas, algumas das quais muito, muito mais graves do que estas e muito mais importantes para fazer um diagnóstico correcto dos problemas. Já agora aproveito para dizer que também me parece que não é a falta de dinheiro que faz o ICN andar mal. Acho que até foi o excesso de dinheiro, nos últimos anos, que levou a desvirtuar a missão do ICN.

Em relação ao resto, concordamos um com o outro com a excepção do forum de discussão da Ambio. … não estou com vontade de participar em forums de discussão, nem sequer me parece que seja perceptível aquilo que quero dizer. … a maioria das pessoas sabem de conversas, de boatos, mas não vivem aquilo que vivemos nós e por isso estão em comprimentos de onda (de comunicação) muito diferentes. E eu estou cansado, muito cansado. Imagina o que é dever … x euros … a um pastor … e ter que me deitar todos os dias a pensar como e quando é que isso se vai resolver. Provavelmente, … vamos ter que pagar [nós]… porque temos mais vergonha e mais respeito pelas pessoas do que o ICN
….

… Claro que podes por tu o texto [no blog] ou apresentá-lo como excertos, ou da forma que achares mais adequada. …

Tem que haver regras base para saber quais os meios humanos materiais, financeiros e outros para dotar uma AP, seja ela reserva natural, parque natural, tendo em conta se é uma área de montanha, de litoral, etc. (o mesmo se aplica a cada divisão e direcção de serviços). Mas não havendo esta base essencial … na organização do ICN, nada se pode fazer. Nem por muito boa vontade que haja, muito voluntarismo, muito amor à camisola, que de resto servem para desculpar tudo o que sai mal, o que é "irregular" ou apontado como mal feito … Por isso é que nesta discussão da Ambio eu nem sequer consigo tomar partido. Se é para acabar com o ICN e começar do zero fazendo este tipo organização que falta, então concordo plenamente, e o que vier, que venha com o nome o com a estrutura que entenderem mas com esta organização tão necessária! Se for para continuar, por amor de Deus, "organizem" este serviço. Para dizer a verdade, acho que nunca se vai organizar esta casa porque é extremamente conveniente, em termos políticos, dar mais dinheiro para ali, outras vezes para acolá e não havendo regras, nem meio das verificar ou de as fazer cumprir, isto é sempre possível fazer. Basta ver as dotações orçamentais de Esposende ao longo de muitos anos em comparação com as dotações orçamentais de Parques Naturais. Aqui, nem o estar no litoral é suficiente para as diferenças! Bem e depois há os objectivos. O único objectivo que conheço em todo o ICN é a famosa "execução financeira". O objectivo é gastar tudo o que se tem, independentemente se é bem ou mal gasto, se é em conservação da natureza, ou não pouco interessa. Por isso é que há o desenvolvimento e muitas outras coisas "convenientes" que fazem com que paguemos, portos de pesca, saneamentos … carros do lixo, etc, etc.


Bem, desculpa lá a seca. Nada disto é novidade para ti.”

4 comentários:

Anónimo disse...

Começo por dizer que gostava de ter mais tempo para conseguir ler com a atenção que merecem, os textos aqui publicados. Tive uma experiência de excelência no ICN. Conheci o serviço antes de ter qualquer ligação a ele, e conheci muitos dos seus funcionários antes estar lá dentro. Passei quatro anos e meio da minha vida numa área protegida. Aprendi tanta coisa que, quando penso nisso, enchem-se-me os olhos de lágrimas. Tentarei dar um contributo em breve mas quero desde já deixar aqui o meu obrigado às pessoas que acreditam que é possível fazer a diferença e que como este amigo, fazem esse esforço todos os dias.

Nuno

Anónimo disse...

... lembro que no passado, no ICN, personalizaram-se críticas, há não muito tempo chamou-se a atenção que se não deviam publicar coisas relativas ao ICN sem passar pelo «crivo» hierárquico e, além disto, em termos de contexto alargado, este habituou-nos a debates inconsequentes, de mera «campanha eleitoral», que morrem com a tomada de posse dos eleitos. Assim, não é de admirar que as pessoas se recusem a correr o risco de serem «entretidas» ou até instrumentalizadas em debates e comentários, que aliás o ICN tem tido sempre muita dificuldade em digerir. No final não é de admirar o SILÊNCIO, que, diga-se de passagem, é algumas vezes bem mais eloquente! Quando de facto o ICN no geral e os seus dirigentes em particular, isto é, todos nós, tivermos uma cultura de real tolerância e de saber ouvir, para crescer; quando houver real interesse em diagnosticar para mudar ver-se-á que as coisas mudarão. Aliás, na minha opinião, a mudança significativa não depende no presente do «ruído» da «arraia miúda», que somos todos nós no ICN, ou de pequenos rearranjos de «poleiro», que não levam a nada e às vezes até a pior. O substantivo depende muito mais do contexto e da respectiva tutela exterior, onde, ao que parece, o perceber alguma coisa de conservação da natureza até mais complica!

Não voltarei ao assunto ... porque ninguém deve pressionar ninguém a participar no debate de ideias, mesmo que o processo nada tenha de equívoco subjacentemente (dado o SILÊNCIO, pelos vistos quase geral, o instinto das pessoas parece ter outra opinião ou então -outra hipótese- julga-se talvez que «não vale a pena gastar cera com ruim defunto» e a ninguém custa mais admitir isto do que a mim)!
Robert Manners Moura

Anónimo disse...

Sou um leigo nesta matéria, mas, gostaria apenas, e, pela experiência que tenho como funcionário, não só do ICN, como de outros organismos por onde passei, que tudo roda através dos dirigentes ( a sua gestão, é preponderante no seu funcionameto). Uma má gestão tem sempre comsequências negativas em todos os aspectos, sejam os corriqueiros aspectos administrativos, financeiros... Na maior parte dos casos, os funcionários ou não têm qualquer direito de opinião, ou nem sequer são chamados a tê-la. Bom, mas cá vai a minha: opinião ( mesmo não sendo para isso chamado. O ICN, precisa de uma liderança, baseada num apoio político, porque sem ele, não há orçamento que resista, isto já para não falar das decisões, dos projectos, e, por a fora. porque toda a burocracia necessária ao funcionamento dos serviços, não sendo ultrapassada politicamento também não é doutra forma.
Conclusão: Nada se resolve sem dinheiro e vontade política, o que "infelizmente falta muito neste país" .É esta a sincera opinião de um simples funcionário, que para tudo isto só pode contribuir com o seu modesto trabalho. O português, pode não ser grande coisa, mas por isso também só posso pedsir desculpa. Muito obrigado pela pachorra que tiveram em
ler este amontoado de frases sem grande sentido, mas espero de alguma forma ter contribuido para que alguma coisa se transforme positivamente.
Muito obrigado.

Francisco Teixeira

Anónimo disse...

Como funcionário do ICN tenho seguido com atenção os comentários e opiniões registados no "blog" mesmo que não me tenha pronunciado até agora. Tal como disse, concordo inteiramente com a expressão de que o dinheiro ou falta dele, não é um fim em simesmo mas apenas um meio, existindo muitos trabalhos em prol da conservação da natureza (verdadeiro objectivo do ICN, a meu ver) que não exigem grandes meios mas mais vontade, muitas vezes apenas vontade dos técnicos que por aqui andam (uma palavra de estimulo dos directores e/ou presidente também não ficam mal...)
Tal como referido em vários comentários, acho que o ICN se deve recentrar no seu objectivo (conservação da natureza) e todas as acções que prossiga, devem ser subordinadas ao mesmo e bem fundamentadas (o apoio a um porto de pesca pode constituir uma acção de conservação mas ...?).
O que se observa é que o ICN, apesar de ter muitas competências, não tem conseguido definir estratégias de actuação, nem muitas vezes, definir os objectivos a atingir com determinadas acções. Se tal é verdade ao nível do ICN, também é verdade ao nível de cada área protegida, e ai, sem iniciativa dos directores, não há volta a dar.

cumprimentos, Jorge Coimbra