sexta-feira, dezembro 05, 2008

A crítica da crítica II

A observação das estatísticas de consulta deste blog (e suponho que de muitos outros) são desanimadoras.
Não por serem baixas (são razoáveis para um blog que trata de matérias mais ou menos densas, minoritárias e num registo mais de ensaio que ligeiro) mas porque os seus altos e baixos, descontando o fim de semana, se devem essencialmente à existência ou não de posts com potencial implicação em guerras de alecrim e manjerona.
Com a excepção de alguma discussão mais ou menos recorrente (que eu diria em espiral e não em círculos) em matéria de fogos florestais, com algum frisson em matéria de direitos animais e coisas que tal (e mesmo assim se for com base em posts mais provocatórios, porque o post do Miguel sobre a atribuição de direitos aos grande símios não mereceu grande discussão) o que aparentemente motiva as pessoas é o que permite a argumentação ad hominem.
Critiquei um discurso público num acto público de um presidente da SPEA, imediatamente salta a visitação do blog e a discussão resvala para questões pessoais e motivações pessoais (valha-nos alguma derivação final para a discussão do uso do anonimato e para o que é a justa crítica para elevar um bocadinho a discussão).
E isto é recorrente em Portugal (há um pormenor fabuloso de Ricardo Araújo no sketch sobre o silêncio de Manuela Ferreira Leite, quando a qualquer desenvolvimento do raciocínio dos assessores ele imediatamente começa a vociferar contra Sócrates).
Portugal no seu melhor não discute ideias, discute pessoas e intenções.
E no entanto, mesmo se a discussão de ideias é indissociável dos seus defensores, o que verdadeiramente pode produzir alguma coisa de útil é a discussão de ideias independentemente das pessoas envolvidas.
henrique pereira dos santos

3 comentários:

Paulo Pereira disse...

Posso até concordar uma certa tendência, quase esquizofrénica, para a condução das discussões no sentido que o Sr. HPS se refere, mormente no que toca ao ponto das críticas às ONGAs. Muito embora concorde com algumas das críticas que faz a algumas ONGA's, o que parece ser estranho e instigador de um certo mal-estar entre alguns de nós é a sua aparente insistência em produzir criticas num tom exasperado e à espreita de uma qualquer oportunidade para expor publicamente à evidência todas as fragilidades que lhe ocorrem sobre as mesmas, que embora possam ser merecidas muitas das vezes, mais parece que são feitas de forma reactiva, em resposta a criticas que mais naturalmente se esperam às instituições publicas por estas serem estruturas oficias do estado e tudo o que isso implica.
Claro que lhe reconheço o direito de fazer todas as criticas que entender mas, no mínimo, fica mal essa toada e cadência com que as faz, sabendo que as ONGA's com todos os defeitos que têm, são apoiadas num movimento voluntário, na maioria, por pessoas que trabalham de forma despretensiosa.
A discussão construtiva a que o Sr. HPS apela das ideias em vez dos ataques pessoais obviamente que é assim que tem de ser mas a questão põe-se mesmo ao nível da elegância e justiça das criticas de quem as faz desta forma e que provêm, aliás, de alguém que parece reconhecer e respeitar o papel e importância que as ONGA's tiveram e ainda têm no nosso país. Não me custa acreditar que as criticas que faz são motivadas por um interesse genuíno em mudar um estado de coisas que não será o ideal mas certamente que concordará que vindas de alguém com o seu perfil profissional e antigo sócio e eventualmente, ainda, sócio de algumas ONGA's, provoca mais danos que outra coisa.

Henrique Pereira dos Santos disse...

Caro Paulo Pereira,
Agradeço o tom cordato e a clareza de pontos de vista.
É verdade que tenho feito críticas em reacção a algumas posições de ONGs críticas do ICNB (foi o caso da QUERCUS, em relação ao seu parecer do Plano Sectorial) mas essas são situações minoritárias.
Mesmo esta última não é nenhuma reacção a qualquer crítica ao ICNB (que não existiu no discurso do Presidente da SPEA, pelo menos que eu desse por isso) mas sim a um discurso fechado sobre si próprio, quase autista.
Mas não é essa a questão de fundo.
O que nos divide é a questão da oportunidade das críticas e dos seus efeitos.
Usemos a sua argumentação mas aplicada a alguns dos visados por críticas das ONGs. Faz algum sentido que o Ministro do Ambiente venha queixar-se de que as críticas das ONGAs só o fragilizam e o tornam mais vulnerável face aos adversários do ambiente (o que, diga-se de passagem, muitas vezes é verdade)?
Evidentemente ninguém aceitaria isto. O que se aceita é que o Ministro discuta se a crítica é justa ou injusta e não se é oportuna ou inoportuna ou se tem o efeito positivo ou negativo na acção do Ministro (seja ele qual for).
Esse é o critério que deve prevalecer também para quaisquer tipos de críticas: que sejam justas ou injustas, que sejam fundamentadas ou não fundamentadas.
Todos os outros critérios obrigam a uma análise de utilidade da crítica que está à partida contaminada e que a perverte.
O que me preocupa no movimento ambientalista é que o seu único verdadeiro activo é a confiança que a sociedade deposita nele. Para muitos pragmáticos isso é um pormenor e o relevante é se a influência sobre as decisões é determinante ou não.
Partindo destas diferentes premissas claro que a utilidade e oportunidade das críticas nunca pode coincidir nos dois pontos de vista.
Avaliemos pois as críticas por critérios de justiça ou injustiça e deixemos os critérios de oportunidade e utilidade para a avaliação das decisões.
henrique pereira dos santos

Gonçalo Rosa disse...

"Avaliemos pois as críticas por critérios de justiça ou injustiça e deixemos os critérios de oportunidade e utilidade para a avaliação das decisões."

Concordo Henrique. E e por isso mesmo que me parece algo ao lado esta questao da eficacia ou nao da critica aqui ou ali.

A minha experiencia pessoal, quer na SPEA, quer na Quercus (ainda que, nesta ultima, ha ja mais de quinze anos...) e que individuos que questionem formas de funcionamento, decisoes e modos de actuar das ONGAs e seus corpos sociais sao manifestamente indesejados e ostracisados. O que e pena, porque acho que as ONGAs, enquanto instituicoes, perdem com isso.

"Daí a perda de relevância das assembleias gerais, que passam a ser meros rituais legalmente obrigatórios, tanto mais que a crítica interna é rapidamente tratada como aqui se viu, o que convenhamos que pouca gente está disposta a aturar, desistindo por isso de procurar alterar o estado de coisas no movimento ambientalista."

Pois e, Henrique. Ca esta uma das varias faces das perdas. E o afastamento e tao grande que, em muitas ONGAs, por altura das eleicoes, e o cabo dos trabalhos conseguir arranjar uma lista candidata aos corpos sociais. E que a falta de uma cultura do associativismo, em Portugal, tem as costas largas, muito largas... talvez fosse bom questionar quais os principais culpados!

Goncalo
E desculpem a falta de acentos e de cedilhas, mas no fim do Mundo, os teclados sao o que sao...