segunda-feira, janeiro 26, 2009

Freeport e Conrad

Deixarei para outro post o comentário ao que hoje o Público traz sobre a QUERCUS e o Freeport para me concentrar na comparação processual do Freeport e do Conrad Hotel para se perceber que se houver corrupção no Freeport (e seguramente não vou discutir se existe neste caso em concreto e existindo quem poderá ter ganho com o assunto) não é para admirar, o que é para admirar é se for caso único (sem que isto envolva qualquer suspeição ou não para qualquer político, volto a frisar que os meus posts são de certa maneira "estruturalistas": pretendem discutir as condições em que as decisões públicas facilitam ou dificultam a apropriação de benefícios pouco transparentes por privados associados a prejuízos públicos, incluindo naturalmente o prejuízo ambiental).
Devo dizer que o meu envolvimento no Conrad foi muito marginal e tinha apenas a ver com a discussão da afectação ou não da tuberaria major (se não me engano), matéria importante mas não essencial para o que pretendo discutir.
No post que farei sobre a queixa da QUERCUS discutirei mais em pormenor a fundamentação desta minha opinião mas já afirmei que a aprovação do Freeport nas condições em que foi feito parece-me que violaria o Plano Director Municipal de Alcochete. Não foi esse o entendimento quer da Câmara Municipal, que sempre esteve fortemente empenhada na aprovação do empreendimento para fazer face aos problemas de desemprego decorrente do fecho de várias fábricas (uma delas da Firestone, no sítio onde está hoje o Freeport) nem da entidade de tutela do Ordenamento do Território, que aliás presidiu à comissão de avaliação ambiental.
Do mesmo modo, o Conrad Hotel só não violava o Plano Director Municipal de Loulé porque o plano foi legalmente suspenso exactamente para permitir tomar decisões que o contrariavam. Digamos que aqui não há ilegalidade, há sim uma alteração da lei (neste caso a suspensão de um regulamento administrativo, como é o PDM) feita à medida para um projecto específico.
E no entanto, em todas estas discussões, raramente se fala das entidades de tutela do ordenamento do território, ao contrário, por exemplo, do ICNB que é notícia nos jornais há pelo menos três dias seguidos, sendo mesmo hoje o sujeito da principal manchete do Público.
O que distingue o ICNB, que o torna tão querido para alguns e tão mal amado para outros, das entidades de tutela do ordenamento do território, onde se fazem os maiores atropelos às regras, ou, sendo mais preciso, se transformam excepções em regra com fundamentações obscuras e frágeis, sem que existe qualquer alarme social?
O que distingue estas duas políticas públicas é que existe uma política europeia de conservação da natureza e obrigações de Portugal para com a União Europeia que põem as decisões nesta matéria sob escrutínio do tribunal europeu mas não existe qualquer escrutínio legal exterior sobre o ordenamento do território.
E assim, sendo decisões como o do Conrad Hotel, tão discricionárias e fragilmente fundamentadas como as do Freeport, desaparecem na espuma dos dias e na fragilidade da nossa sociedade civil, sempre compreensiva para com o estacionamento proibido desde que não impeça o trânsito, sem que o risco de uma qualquer investigação externa aparecer perguntar por que razão se tomou uma decisão excepcional e tão de alto nível como seja suspender a aplicação dos regulamentos vigentes para dar resposta a pretensões concretas, formuladas desde o início com base na ideia de que as regras aplicáveis a todos não seriam aplicáveis a alguns.
henrique pereira dos santos

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