"Com a aparição adventícia das ervas ruins, associa-se uma outra aparição adventícia, a dos brutos, ou antes dos brutinhos, atentas as pequenas proporções habituais dos visitantes.
O jardim é o chamariz de uma multidão de seres, que vêm imprimir vida ao cenário, em parte com prejuízo das plantas, em parte com vantagens, mas sempre recreando-nos.
Acode o bando de pardais - atrevidos cosmopolitas! - pisando, saltitando, devorando migalhas, de dia para dia mais afoitos; enquanto que os corvos berram nas alturas, espreitando o que se passa cá para baixo. Em mais próximo e interessante convívio, afluem os insectos, com uma sem-cerimónia campesina - borboletas, vespas, abelhas, cigarras, tira-olhos, grilos, ralos, louva-a-deus, variadíssimos coleópteros, a chusma inteira, enfim. Muitos desses serem voejando de arbusto para arbusto, de flor para flor, colaboram indiscutivelmente como elementos decorativos dos jardins; dos jardins e, de quando em quando, das casas igualmente, pois alguns deles, como as vespas, invadem-nos o casebre e vêm construir ninhos nas paredes. "Não moleste estes bichos", recomendo eu à criada, deliciado com semelhantes adornos imprevistos, com esta parceria de existência entre a minha humilde pessoa e um enxame de vespas, então de todo inofensivas, respeitando, por carinhoso instinto, quem partilha com elas pousada e agasalho.
Pelas noites do estio e do outono, vários destes entes alados, com manhas de trovadores, aos quais se juntam as rãs, povoam o jardim, regalando-me com serenatas gratuitas. Bem hajam!..."
Wenceslau de Morais outra vez.
Pergunto-me por que mistério tanta gente que escreve sobre biodiversidade, com esta matéria prima como motivo, escreve coisas chatas e sem graça.
Acho que nos levamos demasiado a sério e nos chocamos facilmente quando alguém trata a porcaria da bicharada por "brutos".
Fazemos mal.
henrique pereira dos santos
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