quinta-feira, outubro 15, 2009

O Estado entertainer


"Se tinhas parado um metro ao lado lá se iam sessenta mil euros na melhor das hipóteses", poderia ser a legenda desta fotografia, com base no novo código florestal:
"Artigo 86.º
Contra -ordenações
...
3 — Constituem contra -ordenações muito graves:
...
d) A realização de qualquer operação que mutile ou danifique exemplares de sobreiro ou azinheira, bem como quaisquer acções que conduzam ao seu perecimento ou evidente depreciação e as acções de descortiçamento que provoquem danos no entrecasco, em infracção ao disposto no n.º 4 do artigo 43.º;
...
Artigo 90.º
Montantes das coimas
...
4 — Às contra -ordenações muito graves correspondem as seguintes coimas:
a) Se praticadas por pessoas singulares, de € 25 000 a € 100 000;
b) Se praticadas por pessoas colectivas, de € 60 000 a € 500 000."

A mim ninguém me tira da cabeça que escrever isto num diploma legal sem explicar o que quer dizer "mutilar ou danificar" só pode mesmo ter um objectivo: tendo os Governos desistido de resolver os gravíssimos problemas do endividamento e da competitividade, dedicam o melhor da sua actividade a pôr-nos a rir disto tudo.
Ouvi dizer que a Associação Europeia de Circos quer processar o Estado Português por causa desta portaria que proíbe os animais dos circos, mas cá para mim defenderiam melhor os seus interesses pondo uma acção por concorrência desleal aos seus palhaços.
Adenda:
parte da explicação do pendor estatista do código florestal pode ser encontrada no seu "Artigo 3.º Política florestal nacional
1 — A política florestal nacional visa a conservação e desenvolvimento sustentável das florestas, a sua valorização produtiva, a beneficiação dos sistemas naturais associados, a definição de programas de gestão associados, a satisfação das necessidades da comunidade num quadro de ordenamento do território, bem como o fortalecimento das instituições do sector."
É notável como se considera que a política florestal serve o fortalecimento das instituições do sector em vez de se considerar que são as instituições do sector que servem a política florestal. Postas as coisas nestes termos percebe-se melhor o que pretende o Estado com esta lei.
henrique pereira dos santos

7 comentários:

Spawm disse...

Quer dizer que nem se pode podar um sobreiro ou azinheira? E se esmagar uma bolota a germinar? Terei que vender o meu carro para pagar a multa?

ps: já a gora qual é o decreto-lei?

Henrique Pereira dos Santos disse...

Pode podar sobreiros e azinheiras, desde que cumpra o que está no Decreto-Lei n.º 254/2009 de 24 de Setembro que contém o novo código florestal. Porque podar não é necessariamente danificar, o que o legislador pretende garantir através de um pedido de autorização quando o quiser fazer.
Boa leitura. O diploma, se aplicado a sério ao que o próprio Estado faz enquanto gestor, teria a enorme vantagem de levar o Ministério da Agricultura à falência, o que me pareceria muito positivo.
henrique pereira dos santos

Spawm disse...

Será que percebi bem, para podar umas azinheiras terei que passar a pedir autorização?
Ui que os meus terrenos agora passaram todos a só ter carrascos.

A ser assim estamos realmente entregues aos bichos, estamos a ser governados por gente que nunca saiu de uma cidade só pode!

Henrique Pereira dos Santos disse...

Artigo 49º do referido decreto-lei: "6 — A poda de sobreiros e azinheiras carece de autorização da AFN, apenas sendo permitida quando visa melhorar as suas características produtivas."
O problema não em parece que seja o facto de nunca terem saído de uma cidade mas sim o facto de terem saído por engano de Rilhafoles.
henrique pereira dos santos

Henk Feith disse...

Face à absurda proteção de sobreiros e azinheiras, as eternas vacas sagradas da floresta Portuguesa, nada como plantar as restantes espécies de carvalhos ou outras folhosas autóctones, onde já se pode fazer o que bem lhe apetece: podar, cortar, danificar, mutilar etc. sem dar cavaco a ninguém.

Henk

Spawm disse...

Pois isso é muito bonito em sítios onde por exemplo as azinheiras não nascem espontaneamente com facilidade e em grandes quantidades.
Agora em sítios onde elas nascem em grandes quantidades, é surreal ter que estar a pedir licença de cada vez que quiser podar algumas azinheiras, ou mesmo desbastar, azinheiras que se encontram amontoadas e a dificultar que as azinheiras maiores possam crescer desafogadamente, e desbastes esses que também permitem minimizar estragos que possam ocorrer devido a incêndios.
Pois eu por exemplo sou de uma zona onde o azinho é uma árvore essencial para obter lenha, para o inverno, pois existem muito mais azinheiras do que carvalhos ou mesmo pinheiros.

Henk Feith disse...

Caro Spawm. Compreendo perfeitamente o desespero e eu meu comentário era um pouco cínico. O post serve para ilustrar quão ridícula a legislação Portuguesa frequentemente é. Infelizmente...

Se arranjar tempo vou expor uns outros exemplos do caricato Código Florestal, novinho em folha.