quinta-feira, dezembro 17, 2009

Sócrates, Portalegre e Beja (ou coisas do ambiente que até parecem nem ser)


Li algures que ontem José Sócrates chegou atrasado a vários sítios e a outros nem chegou.
E li também que responsabilizou pelo atraso de duas horas na chegada a Beja um dos membros do seu gabinete que estava convencido de que uma hora bastaria para ir de Portalegre a Beja.
Se este fosse um blog de comentário político eu comentaria o facto de haver um primeiro ministro que parece não saber que tarefas se delegam, mas responsabilidades não, e o facto de haver um chefe que se justifica com erros dos seus subordinados.
Como não é, fico sem perceber se deverei comentar a ignorância do Primeiro Ministro sobre o país (mesmo sendo da Beira Baixa e de já ter feito inúmeras campanhas pelo país, quer em eleições, quer como governante o Primeiro Ministro não tem a noção do tempo que demora a ir de Portalegre a Beja), se o desfasamento do seu gabinete face à realidade (não têm noção do tempo que demora ir de Portalegre a Beja), se a pura incompetência (na preparação de uma deslocação são incapazes de ir ao googlearth ver quanto tempo se demora cumprindo os limites de velocidade, 2h e 41m, diz o google).
Ou então há outra explicação: foram ao google e como de costume olharam para os quilómetros e não para o tempo da viagem. E acharam que era razoável estimar uma hora para a comitiva do primeiro ministro fazer 181 kms, e ainda sobrava algum tempo para os troços em que não era mesmo possível ir a mais de duzentos à hora.
Pelo menos Manuel Pinho, Ministro da Economia, quando apanhado pela GNR a mais de 200 achou normal e contestou a multa (por essa altura houve mais uma mão cheia de carros oficiais apanhados a mais de duzentos, mas esses não contestaram a multa). Pelo menos o chefe da segurança nacional acha normal ir a alta velocidade na Avenida da Liberdade, sem cinto de segurança, simplesmente porque tem a faculdade de não o usar e de não cumprir os limites legais se assim entender.
Tal como o primeiro ministro tem a faculdade de andar a 250 se assim o entender.
Lembro-me de uma ministra que vencida pelo cansaço dormitava numa deslocação para uma cerimónia para que tinha saído atrasada deLisboa e de vez em quando, abrindo os olhos, admoestava o motorista, aflito para chegar a horas, porque já lhe tinha pedido muitas vezes para nunca ir a mais de 200.
A lei, e bem, permite isto tudo.
A ética, essa que é individual, deveria ser suficiente para que todos estas pessoas responsáveis soubessem que a sua obrigação é nunca usar as excepções da lei sem ser absolutamente necessário. Deveriam saber que os privilégios concedidos pela lei pressupõem que as pessoas tenham a noção clara dos seus deveres, começando pelo dever da pontualidade (a virtude dos reis) e acabando no dever de ser mais cumpridor da lei que os cidadãos comuns.
Mas cumpridor da lei nas suas normas gerais, e não cumpridor da lei através das normas excepcionais que existem para situações excepcionais e que em Portugal qualquer pessoa com o mínimo de poder entende como sendo para usar corriqueiramente (há excepções, claro, conta-se que João Cravinho, Ministro que tutelava uma boa quantidade de empresas públicas e juntas autónomas, costuma viajar sempre em turística nos aviões, cumprimentando de passagem os seus tutelados que viajavam quase todos em primeira, porque as regras permitiam, como evidentemente permitiam a João Cravinho).
Penso que até os mais negacionistas das alterações climáticas concordarão comigo que a enorme quantidade de emissões resultantes deste tipo de atitude de quem não sabe o significado da palavra ministro (servidor, servo) são completamente injustificadas.
E não se pense que é uma questão lateral. O aumento de produtividade em Portugal seria real apenas com o cumprimento de horários e com a atitude mental a que obriga.
E os ganhos ambientais seriam inegáveis.
Adenda: A hipótese de neste caso a comitiva ter excedido os limites de velocidade deve naturalmente ser descartada. Visto que o atraso se deveu ao facto de um dos membros do gabinete ter previsto uma hora de viagem, a viagem terá demorado a hora prevista, mais o atraso de duas horas. A comitiva terá então demorado três horas entre Portalegre e Beja, seguramente por ter adoptado uma condução de baixo consumo e baixas emissões, abaixo do limite legal que implicaria 2h e 41m de viagem
henrique pereira dos santos

3 comentários:

João Menezes disse...

Olhando para as várias hipóteses, acho que não foram todas listadas..., por exemplo, será que o PM queria mesmo ir ao Conselho de Estado? e será que estava com disposição para aturar os deputados do PS?...ou então não será que aconteceu o mesmo que a um presidente de um conhecido Instituto do Estado que tendo dado indicações ao seu motorista para ir para o Porto, adormeceu por volta de Coimbra e quando acordou estava perto de Aveiro, mas no sentido Porto - Lisboa (parece que o motorista deu a volta à circunvalação e regresou por outra ponte sem ter dado por isso)..., outras hipóteses poderiam ser colocadas, mas a falha de planemaento parece-me a menos provável...

Anónimo disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
Henrique Pereira dos Santos disse...

Caro anónimo,
Não sou administrador e sou muito pouco dado a cortar comentários e coisas que tal.
Mas se depender de mim, e farei essa proposta, seguramente o seu comentário será apagado porque me parece totalmente inaceitável.
E ainda por cima com a coragem demonstrada pelo anonimato.
henrique pereira dos santos