terça-feira, janeiro 26, 2010

o polvo



Acerca de teorias da conspiração em geral, que parecem fazer algum sucesso, também no meio ambientalista; e de uma em concreto, particularmente rebuscada, publicada ontem na lista Ambio sobre um suposto sismo (?) que recentemente abalou o Haiti...

Este mês, é a segunda vez que me roubam galinhas. Decidi montar guarda, para ver se descubro o culpado. Ou melhor, eu sei quem é o culpado... apenas quero provar quão certo estou, para não se rirem mais da minha cara, na tasca da aldeia. Coitados. Boa gente, sempre pronta a acreditar em respostas simplistas para tudo o que acontece. Não veem para lá do visível! A meio da noite, o inusitado e frenético cacarejar vindo do galinheiro faz-me saltar da poltrona. Da janela embaciada, nada se vê. Saio em passos corridos rumo à escuridão, por entre a pequena vinha, e vejo raios de luz riscarem o céu. Estrelas cadentes, chamam-lhes alguns, mas eu sei lá o que mais inventaram... dos aviões auto-pilotados que espiam tudo, aos satélites que, do céu, conseguem ler as páginas dos jornais que eu, no alpendre da casa, folheio... Eu sei lá! O imperialismo usa os mais maquiavélicos meios de controlo para tudo e todos vigiar. É como um enorme polvo, inócuo, com infinitos tentáculos que percorrem cidades, vilas e aldeias de todo o mundo, abrem portas, ouvem as mais silenciosas conversas, matam incómodas personagens. Move supostos poderes, que mais não são do que seus testas de ferro. Pinta de diabo os santos que escolhe aniquilar. Monta o cenário e, com bombas ocultas no fundo do mar, ceifa agora a vida a muitas dezenas de milhares de inocentes. Os seus tentáculos percorrem agora as ruas de Port-au-Prince. Por entre corpos inertes, entulho e desgraça, sugam o fruto do seu veneno.

O breu da noite sem luar não me deixa ver para além do escuro. Volto para casa. Embrulho-me em dois cobertores. Tenho frio. Muito frio. A luz dos carros, que fazem a curva da estrada, penetra pela janela da pequena sala. As paredes brancas da sala, são pontualmente percorridas por pequenos mas assustadores quadrados iluminados. Parecem olhos que me observam e não me deixam dormir. De madrugada, menos duas galinhas no meu galinheiro. Na vinha, coberta de geada da invernia, nem o cantar dos pássaros se ouve. Silêncio. Apenas um vulto de uma raposa que corre como se tivesse visto o diabo, por entre as videiras já podadas. Um dia destes provo a certeza da minha suspeita. Aos simplistas, porque para mim há muito que deixou de ser preciso.

Gonçalo Rosa

4 comentários:

Nuno disse...

Bravo!

As teorias de conspiração, seja em realação ao imperialismo ou ao ambientalismo, têm imenso êxito nalguns comentários neste blogue mas não costumam demonstrar esta criatividade.

João Sismeiro disse...

Bom dia,

Gostava de lhe enviar uma informação de sustentabilidade relacionada com uma empresa portuguesa, no entanto não encontro os respectivos contactos.

Se mos pudesse facultar, agradecia.

Cumprimentos,

trepadeira disse...

Boa noite

Se não fora tão escuro ainda ia contar as minhas galinhas.
Amanhã logo verei quantas faltam.
Tenho a certeza.Quem as rouba já me deu algumas palmadinhas nas costas.
Quando mostra os dentes fico sempre sem saber se é para se rir se é para me morder.À cautela tento sempre deixar a tal distância de vara e quarta.

オテモヤン disse...
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