Ferreira de Almeida publica no quarta república um post com o título que copiei, a propósito do encerramento das escolas do ensino primário.
Penso ter deixado já clara a minha posição nesta matéria: a gravidade do encerramento destas escolas, desta maneira, é o facto de criar dificuldades à instalação de novos empreendedores em territórios de povoamento necessariamente esparso.
Nos comentários, interessantes, que o post motiva aparece o clássico argumento da inviabilidade do mundo rural em Portugal (não, as pessoas não defendem a inviabilidade do mundo rural, apenas raciocinam nessa base), ou se quisermos, do povoamento esparso, assumindo-se como uma fatalidade este despovoamento.
O despovoamento tem vantagens ambientais, é certo, mas tem também riscos, quer ambientais, quer sociais. O abandono assumido e com objectivos como os que o Miguel Araújo questiona aqui parece-me defensável em algumas circunstâncias.
A pura ruína, cansaço e desesperança que se vive no mundo rural parece-me indefensável.
Para quem, como eu, não defende a criação artificial de emprego e ao mesmo tempo reconhece que o desemprego (que é muitas vezes o mesmo que dizer, actividade económica não competitiva) é o problema central do mundo rural em Portugal, subsiste uma pergunta: o que se pode fazer?
Há uma parte do Estado.
Cinco exemplos de intervenção do Estado.
1) O Estado é responsável pela gestão das áreas protegidas, porque a conservação da biodiversidade é intrinsecamente deficitária mas produz bens difusos que são essenciais. Pois bem, o Estado em vez de criar condições de emprego digno e útil dotando as áreas protegidas dos meios necessários à sua missão, desinveste em vigilantes e em técnicos de forma escandalosa. O recentre reestruturaçã do ICNB que pretendia reforçar as equipas locais ao mesmo tempo que criava condições para um exercício profissional mais gratificante, aberto ao mundo e de relação com os outros, tem sido gerida de forma mesquinha e sem o investimento pressuposto em novas tecnologias de modo a optimizar o trabalho não centralizado assente em regras e procedimentos gerais que garantam os objectivos nacionais e internacionais que a política de conservação prossegue.
2) O Estado, na sua política de educação, resolve distribuir Magalhães a esmo, ao mesmo tempo que boicota e não executa dois programas potencialmente positivos para o mundo rural: a escola na natureza, que além de criar melhores condições de ensino para todos por facilitar o contacto directo com a realidade das áreas protegidas, geraria meio milhão de refeições ano e cerca de 250 mil dormidas, com um custo anual (que poderia facilmente nem ser todo do Estado) de 10 milhões de euros; a escola móvel, que permite juntar o ensino à distância com períodos de socialização dos alunos, uma das alternativas evidentes para territórios de povoamento esparso.
3) O Estado desenvolve um estudo para a comunicação e visitação das áreas protegidas que, se bem executado, poderia criar muitas pequenas iniciativas empresariais, com o consequente emprego. Por curteza de vistas e porque o Estado está capturado por grupos de interesse, o estudo é engavetado, não há um tostão para o assunto, a não ser uma recente iniciativa piloto. Onde? Nas áreas protegidas encravadas nas zonas de maior despovoamento rural? Não, no estuário do Tejo , em parceria com a Câmara Municipal de Lisboa.
4) O Estado tem a oportunidade de desenhar programas de financiamento do mundo rural ao abrigo da política agrícola comum, tendo uma larga margem de opção política. Faz opções no sentido de remunerar os serviços ambientais prestados pelas comunidades rurais que não são valorizáveis no mercado? Não. Enterra mais de 11% das verbas em Alqueva, financia o preço da água (naturalmente à custa de recursos que poderiam ser usados noutro lado) que é usada em actividades perfeitamente lucrativas como o golfe e o olival super intensivo, usa grande parte das verbas para apoiar actividades que são valorizáveis no mercado, por imposição comunitária programa verbas para agro-ambientais (ITIs, como lhe queiram chamar) que poderiam pagar serviços ambientais e depois boicota a sua utilização para ter argumentos para as reafectar posteriormente por baixa taxa de execução.
5) Alguns, poucos a meu ver, estão dispostos a investir em biodiversidade, trabalhando no mercado de doações que sustenta a gestão privada de áreas de conservação. O Estado apoia, nem que seja com uma política fiscal agressiva que reconheça a utilidade social quer deste trabalho, quer das doações? Não, tem uma lei de mecenato mais que duvidosa em alguns aspectos, não aplicável a sérias opções possiveis de investimento privado em conservação, e trata os proprietários que se disponham a usar a sua propriedades publicamente para a conservação e o usufruto público como se, à partida, fossem todos aldrabões.
Longo vai o post, por isso a intervenção dos privados e da adminsitração local ficam para um dia.
Encerrar escolas primárias não é uma opção para que o Estado foi conduzido pela debilidade económica destas regiões, é uma opção coerente do Estado face à sua opção ideológica de que o mundo rural é caro demais para o que produz.
Ao Estado português parece razoável gastar 3 milhões de euros para que a zona mais rica do país fique isento de portagens para ir para a praia em Agosto. Mas é um absurdo gastar os mesmos três milhões a alavancar o programa escola na natureza, gerador de economias fulcrais para dar sustentabilidade económica a muitas iniciativas no mundo rural.
Concentrar escolas reforçando as dificuldades de criação de emprego em territórios de povoamento esparso é apenas o corolário lógico desta política.
Eu não estou de acordo e acho a educação é demasiado importante para ser deixada aos educadores.
henrique pereira dos santos
2 comentários:
Todas propostas urgentes- chegou a haver alguma proposta para as Escolas na Natureza ou trata-se de uma ideia possível?
A associação de pais a que pertenço está a falar com o Agrupamento e pensamos criar uma espécie de intercâmbio com municípios vizinhos que também têm paisagens protegidas, com estadia de fim-de-semana dentro das ditas áreas ou na proximidade. A visita seria alternada e as turmas visitariam a sua área protegida (que quase todos desconhecem) e a dos "vizinhos".
Isto parece relevante porque cria-se um elo mais forte entre pessoas e protecção do ambiente com este tipo de experiências positivas do que com estatísticas-choque.
Será mais viável haver um programa nacional deste tipo com adesão voluntária das escolas, que se inscreveriam para o ano lectivo seguinte junto da coordenação do programa ou isto deveria ser um programa anual fixo a nível nacional?
Em relação ainda ao primeiro ponto, passamos férias no Parque Nacional das Ilhas Atlânticas e fiquei surpreendido com o campo de formação que lá tinham instalado com várias dezenas de novos vigilantes- pelo que nos disseram são um dois grupos de reforços agora em treino para serem distribuídos por várias áreas protegidas de Espanha.
Entretanto o nosso vizinho Parque Natural do Douro Internacional está, pelo que sei, ainda por vigiar.
A média de idades destes vigilantes no campo de treinos andava seguramente abaixo dos 30 anos...
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