sábado, outubro 02, 2010

ICNB

Muito mais que em relação a outros institutos do Estado, o ICNB é responsabilizado pelas políticas de conservação, com demasiada frequência.
Na realidade este instituto, como os outros, não define políticas, executa-as.
Os seus recursos são os que são postos à sua disposição pelo Orçamento do Estado (ou seja, pelos senhores deputados) e marginalmente pelas suas receitas (a conservação é inerentemente deficitária e tem sido opção de diferentes governos não definir taxas que revertam para o ICNB de forma significativa).
Os seus recursos humanos são os que são postos à sua disposição e a margem de manobra própria do ICNB é muito reduzida na matéria actualmente (houve tempos de vacas gordas em que não foi assim.
Há com certeza responsabilidade do ICNB na gestão destes recursos e na forma como aplica as políticas, mas verdadeiramente cabe à tutela política a primeira e principal responsabilidade sobre o desempenho do ICNB.
Embora eu tenha actualmente relativamente pouco contacto com as pessoas do ICNB (com excepção da minha mulher, mas o ICNB é assunto tabu cá em casa) esta semana por acaso cruzei-me várias vezes com pessoas do ICNB.
E aó agora me apercebi de uma coisa cuja responsabilidade é evidentemente da tutela política e que de todo não compreendo, tanto mais que as políticas de conservação são políticas de conhecimento intensivo: haverá alguma razão pela primeira vez desde que o ICNB existe (que eu saiba) toda a sua cúpula estar ocupada por pessoas que não têm qualquer curriculum ou formação base em conservação?
Bem sei que a gestão de uma organização é um trabalho que exige que se saiba mais de gestão que do assunto em concreto, mas até há pouco tempo havia sempre na presidência do ICNB alguém com claro perfil de conservação, com curriculum e experiência na matéria. Esta solução fazia sentido: é preciso ter algum treino e sensibilidade para pesar os diferentes interesses em presença nas decisões, incluindo a integração adequada dos aspectos da conservação.
Dir-se-á que os serviços e os técnicos farão essa ponderação.
Talvez, mas eu não percebo a vantagem de ninguém da presidência do ICNB perceber nada de conservação ou ter experiência na organização.
É uma opção legítima da tutela política? Sim, é.
A conservação fica a ganhar com isso?
Tenho dúvidas.

Adenda: Depois de escrever este texto achei melhor acrescentar que parte desta situação se deverá provavelmente à dificuldade em recrutar pessoas com curriculum na matéria para lugares na Presidência do ICNB. Que eu saiba, desde quase todos os dirigentes mais visiveis das maiores ONGS, passando por alguns jornalistas que habitualmente escrevem sobre o assunto, até alguns académicos, muitas foram as pessoas que ao longo dos anos foram convidadas a prestar o serviço público de passarem de comentadores de bancada para materialização das suas ideias e críticas. Por muitas e legítimas razões a verdade é que as recusas foram a resposta habitual. Eu compreendo: este serviço público é chato, desgastante, absorvente e com frequência bem mais mal pago que o que as pessoas fazem habitualmente. Mas que pelo menos a alguns ter-lhes-ia ficado bem pegar o toiro pelos cornos, lá isso teria, sobretudo depois de tudo o que dizem sobre a gestão do ICNB.

henrique pereira dos santos

1 comentário:

Paulo Barros disse...

Henrique,
Não é por se chato, desgastante, absorvente e com frequência bem mais mal pago que o que as pessoas fazem habitualmente, é porque é preciso responsabilizar-se e assumir o risco de errar e isto é que é complicado para pessoas.
Este tipo de acções (fugir a responsabilidade e assumir o risco de errar) é recorrente por muitas entidades/pessoas em muitas matérias ligadas à conservação da natureza.