A instituição universitária é permeável a modas. É igualmente verdade que é difícil que seja de outra forma. Se não vejamos. As universidades prestam, fundamentalmente, 3 serviços à sociedade: 1) o ensino; 2) a investigação; e 3) repositório de infra-estruturas de promoção ao conhecimento (P.e. bibliotecas).
O primeiro destes serviços tem um mercado identificado: os alunos. Se os alunos não querem aprender Taxonomia porque consideram ser “chato”, ou porque as saídas profissionais não são aliciantes, as universidades acabam por descurar a contratação de professores com essa valência e este domínio de conhecimento cai no esquecimento. As universidade não podem contornar esta realidade pois o seu financiamento depende do número de alunos e o número de alunos depende do poder de atracção dos cursos que oferecem.
Por outro lado, dadas as suas características, as universidades são desprovidas de pensamento estratégico. Ou se deixam orientar pelo mercado (i.e. por o que dá saídas profissionais), ou pelos interesses corporativos (por o que os professores das universidades sabem ensinar), ou seguem a orientação do Estado (de acordo com uma avaliação de prioridades). Em Portugal tem vigorado o peso das corporações (escudada numa interpretação abusiva do conceito de autonomia universitária), com pontuais influencias do mercado (essencialmente nas universidades novas). A componente estratégica, potencialmente dada pelo Estado, não existe.
Esta incapacidade de definir estratégias de longo prazo não é exclusiva das universidades Portuguesas. Por exemplo, as universidades Britânicas, que conheço razoavelmente, definem estratégias de ensino, fundamentalmente, na óptica do mercado. O resultado é que, regressando ao nosso tema, o ensino da Taxonomia praticamente desapareceu dos currículos académicos deste País. Com o advento da moda da biodiversidade verificou-se um renovar do interesse na ciência Taxonómica. Felizmente, para este País e para a ciência da biodiversidade, o Reino Unido tinha repositórios de especialistas nos Museus de História Natural e Jardins Botânicos (alguns dos mais famosos do Mundo) o que permitiu uma colaboração institucional no sentido de, agora que o interesse na Taxonomia se renovou ligeiramente, se oferecerem cursos de graduação em parceria (p.e. o Mestrado em Taxonomia e Biodiversidade do “Imperial College” em colaboração com o Museu de História Natural de Londres).
Ou seja, também no reino Unido (o mesmo se pode dizer da França e Espanha) se perdeu a tradição do ensino da Taxonomia nas universidades mas não se perdeu o repositório de conhecimento taxonómico devido há existência de pequenos redutos de geração de conhecimento nestes domínios.
Poderia ter sido de outra forma? Creio que não por uma razão simples. Como referi no inicio desta mensagem as universidades prestam 3 serviços à sociedade. No entanto apenas um deles tem um mercado claramente identificado e é financiado de forma consistente. E este é o ensino. A investigação é financiada por contratos programa de curta duração ou, pura e simplesmente, não é financiada. No primeiro caso resistem as equipas que participam em linhas de investigação na moda e que, por isso, conseguem financiamentos públicos ou privados (tanto mais fácil quanto mais aplicada e menos fundamental for a ciência). No segundo caso as linhas de investigação definham e acabam por extinguir-se. Esta foi a realidade subjacente à investigação Taxonómica das universidades Portuguesas.
Concluindo, a perda de interesse na Taxonomia é um padrão genérico e independente de responsabilidades institucionais. As universidades, pelas suas próprias características, não podem (ou simplesmente não têm vocação para) manter linhas de ensino e investigação desenquadradas das correntes (modas?) de cada momento. Neste contexto cabe ao Estado (que é a “quem” cabe zelar pelo investimento estratégico) criar as condições para que, além das modas, se mantenham núcleos de geração de conhecimento estratégico para a sociedade. E no caso da biodiversidade, esses núcleos de pensamento estratégico são os Museus de História Natural e os Jardins Botânicos.
Para que estas instituições cumpram as suas funções é necessário, porém, que estejam protegidas da incompetência manifesta das universidades para as gerir. Assim como as universidades prestam serviços identificados, os museus também. E quais são estes? Também 3: 1) a investigação Taxonómica e Biogeográfica; 2) a manutenção de colecções biológicas; e 3) o ensino. De notar que a ordem destes factores não é arbitrária. Para que cada uma destas valências seja desenvolvida de forma competente é necessário que o financiamento destas estruturas não entre em competição com prioridades de outras instituições como é o caso actual com as universidades. Por este motivo é FUNDAMENTAL que se transfiram os Museus de História Natural e os Jardins Botânicos, actualmente sob controlo das universidades, para a alçada directa do Ministério da Ciência (com eventuais, ainda que opcionais, participações do Ministério da Educação e da Cultura) e que estes se desvinculem, de uma vez por todas e para sempre, das universidades.
Foi um erro histórico grave associar os Museus e Jardins Botânicos às universidades. E nunca é demasiado tarde para corrigir um erro.
Miguel Araújo
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