O blog da ambio tem o prazer que publicar, em primeira mão, trechos seleccionados do discurso de tomada de posse do novo Presidente do ICN, João Menezes. A publicação deste discurso, com devida autorização, é particularmente oportuna dado o espaço que recentemente dedicámos à reforma do ICN. Comentários e opiniões serão, como sempre, bem vindos.
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"Tomei posse como Presidente do Instituto da Conservação da Natureza, com sentimentos de gratidão, de responsabilidade e de confiança.
Estou grato pelo convite honroso que Vossa Excelência, Sr. Ministro Secretário de Estado, me fez, em consonância com o Sr. Secretário de Estado. O convite é porventura generoso na apreciação das minhas qualidades pessoais e profissionais. E sou talvez imodesto no meu juízo de poder ser útil nas funções em que fui investido.
É inevitável referir que o convite foi feito em circunstâncias políticas muito diferentes das actuais. Contudo, nada se alterou quanto à natureza da Gestão Pública e quanto às necessidades e aos problemas da Comunidade.
“O Governo é o mecanismo social que usamos enquanto comunidade para actuar de forma conjunta na solução de problemas colectivos. O serviço público é apenas uma das suas instituições.
A fixação dos objectivos do ICN cabe pois aos titulares governamentais, os únicos com legitimidade democrática para tal. À Presidência cumpre propor estratégias, coordenar a actuação, que se pretende eficaz e eficiente, e liderar a mudança.
Assim, em linha com os objectivos e as prioridades designados por Vªs Excªs, Sr. Ministro e Sr. Secretário de Estado, a Presidência do ICN prosseguirá as políticas de conservação da Natureza e da biodiversidade no âmbito de uma estratégia de desenvolvimento sustentado, onde a articulação e integração dos objectivos de conservação e valorização do património natural, cultural e paisagístico se assume como factor estruturante do território e dos diferentes sectores da actividade económica e social.
Estou ciente do momento e da responsabilidade que assumo neste contracto de gestão. O ICN é uma componente nuclear do Sistema da Conservação da Natureza, com uma missão crucial, em particular quando o País enfrenta múltiplos, difíceis e inadiáveis ajustamentos estruturais.
A forma como olhamos e estamos no planeta tem vindo a mudar à medida que a percepção que temos sobre o desenvolvimento da sociedade e sobre a qualidade de vida a que aspiramos se tem alterado.
Hoje, esta qualidade de vida já não é vista somente como sendo apenas dependente do desenvolvimento tecnológico e do crescimento económico. Emerge fundamentalmente de como nos integramos com o ambiente que nos envolve. Estamos assim perante a construção de um Novo Paradigma Ecológico na sociedade.
A Conservação da Natureza, a gestão das reservas, dos parques e a defesa da biodiversidade e das paisagens e sítios tem que ser assumida como aposta nobilíssima do exercício da cidadania, como atitude individual e como esforço colectivo, como instrumento essencial do desenvolvimento sócio-económico de um povo e de um país.
A missão pública que a Constituição incumbe ao Estado faz parte integrante deste esforço, não lhe é estranha, não pode ser desempenhada em conflito e não deve usar à partida a coacção e o impedimento. Deve sim, esta missão, ser prosseguida com os cidadãos, através dos cidadãos, envolvendo-os numa participação activa e não apenas meramente consultiva.
Como instrumentos fundamentais para a concretização desta aposta realço entre vários, as acções que terão de ser projectadas e desenvolvidas para a implementação da Estratégia Nacional de Conservação da Natureza e da Biodiversidade; o Plano Sectorial para a Implementação da Rede Natura 2000, em fase final de aprovação; bem como os Planos de Ordenamento das Áreas Protegidas, em conclusão.
Ao ICN, desde a sua criação, então ainda denominado Serviço Nacional de Parques, Reservas e Património Paisagístico e ao labor de décadas, a todos quantos nele e com ele trabalharam e trabalham na execução deste esforço devemos todos nós, cidadãos, as Áreas Protegidas que temos e das quais desfrutamos.
Contudo, é hoje evidente a dificuldade acrescida do ICN para cumprir o essencial da sua missão, a Conservação da Natureza. Tal deve-se à não adequação da proposta de valor veiculada à evolução que a sociedade tem vindo a sofrer.
Esta incapacidade deriva essencialmente, no nosso entender, do facto de nas sociedades modernas, desenvolvidas e democráticas o poder formal e administrativo do Estado já não ser hoje, só por si, suficiente para atrair “energia positiva” para a defesa do Sistema. Isto conduz, em muitos casos, a uma postura defensiva, reactiva e inevitavelmente perdedora.
Consideramos assim, em consonância com Vªs Excªs, Sr. Ministro e Sr. Secretário de Estado, que o ICN terá de reformular a sua proposta de valor a fim de conseguir um posicionamento na sociedade que lhe garanta capacidade de resposta para actuar pro-activamente, aproveitando as novas oportunidades que se lhe deparam e assumindo um compromisso com os portugueses, assente em quatro vectores-chave interdependentes e indissociáveis:
§ Conservar a Natureza e defender a biodiversidade;
§ Disponibilizar o lazer na Natureza;
§ Desenvolver localmente a cultura, o emprego e a economia sustentáveis;
§ Posicionar internacionalmente Portugal, como país com Áreas Protegidas qualificadas e certificadas, e deste modo contribuir para a sua competitividade externa.
Esta oferta agregada deverá, no nosso entender, ultrapassar a lógica apenas da preservação, para se focalizar na da criação de valor. Para tal, torna-se necessário reequilibrar legitimidades internas e externas e apostar decisivamente na participação e envolvimento activo e permanente da Sociedade.
O envolvimento daqueles que usualmente designamos por stakeholders, neste caso externos, é, assim, uma prioridade na gestão do ICN, devendo-se procurar formas de interacção onde, entre outros, os agentes económicos, o poder local, as populações residentes intra-áreas protegidas, bem como as ONGA’s, encontrem um espaço de expressão dos seus interesses legítimos.
Para que esse espaço seja criado, devemos ter capacidade de ajustar não só o quadro referencial de prestação de serviços, como também o modelo de gestão, para que a missão e os objectivos do ICN possam ser cumpridos na sua plenitude.
Esta participação e visibilidade dos stakeholders na gestão é uma necessidade, e porventura a única via, para que os interesses da comunidade, em particular no contexto da conservação do património natural, sejam, de facto, defendidos de uma forma pro-activa e mobilizadora, com a necessária exposição à avaliação constante por parte dos nossos concidadãos.
É nosso propósito construir esse enquadramento de participação, não excluindo o desenvolvimento de projectos em comum, assente numa clara distinção entre o papel do Estado e dos privados, mas somando recursos e competências para financiar e desenvolver novos projectos, que permitam que a Conservação da Natureza, em Portugal, seja gerida no contexto de um ciclo virtuoso, onde mais interacção com os stakeholders seja sinónimo, igualmente, de mais conservação do património natural.
Até agora, referi intenções de fazer o quê e com quem, porém não posso deixar de abordar o como.
Pese embora o actual momento político que o país atravessa, é minha convicção profunda que um novo posicionamento do ICN passa por uma reforma significativa da sua organização e do seu modelo de gestão.
Há que passar de uma lógica pensada como autoridade para outra construída também em torno de competências. Passar de uma organização reactiva, centralizada e vocacionada para a análise, para outra com capacidade de resposta ágil, motivada e cujo foco é a acção em ajustamento contínuo com a sua envolvente.
Por outro lado, o quadro referencial de prestação de serviços deve agrupar, de forma indivisível, as áreas de gestão da visitação, do turismo ambiental, da educação ambiental e dos projectos de conservação do património natural.
Igualmente, o modelo de gestão deve ser orientado para uma lógica de remuneração dos serviços prestados, independentemente da origem dos respectivos financiamentos, vinculando a organização, e todos aqueles que nela se inserem, ao valor que, de facto, criar para a comunidade.
Deverá ser no contexto destes novos modelos que os stakeholders encontrarão esse espaço de participação na gestão da Conservação da Natureza, de uma forma progressiva e gradualmente mais eficaz, vislumbrando na proposta de valor do ICN a remuneração dos seus legítimos interesses.
Não posso, finalmente, deixar de referir nesta intervenção já longa o mais importante dos recursos: as pessoas – os colaboradores do Instituto, qualquer que seja o seu cargo, estatuto e a função.
A confiança, com que inicio as novas funções, decorre do apoio, que tenho por adquirido, dos dirigentes e funcionários do Instituto. Todos, mas todos, serão necessários para a nova vida desta casa, só se excluirão aqueles que se auto excluírem.
A Presidência a que presido estará atenta aos seus direitos e deveres, às suas condições de trabalho, necessidades de formação e às suas expectativas profissionais, para que todos contribuam, de forma esforçada, criativa e motivada para a melhoria do serviço público prestado pelo Instituto de Conservação da Natureza. (...)"
“O Governo é o mecanismo social que usamos enquanto comunidade para actuar de forma conjunta na solução de problemas colectivos. O serviço público é apenas uma das suas instituições.
A fixação dos objectivos do ICN cabe pois aos titulares governamentais, os únicos com legitimidade democrática para tal. À Presidência cumpre propor estratégias, coordenar a actuação, que se pretende eficaz e eficiente, e liderar a mudança.
Assim, em linha com os objectivos e as prioridades designados por Vªs Excªs, Sr. Ministro e Sr. Secretário de Estado, a Presidência do ICN prosseguirá as políticas de conservação da Natureza e da biodiversidade no âmbito de uma estratégia de desenvolvimento sustentado, onde a articulação e integração dos objectivos de conservação e valorização do património natural, cultural e paisagístico se assume como factor estruturante do território e dos diferentes sectores da actividade económica e social.
Estou ciente do momento e da responsabilidade que assumo neste contracto de gestão. O ICN é uma componente nuclear do Sistema da Conservação da Natureza, com uma missão crucial, em particular quando o País enfrenta múltiplos, difíceis e inadiáveis ajustamentos estruturais.
A forma como olhamos e estamos no planeta tem vindo a mudar à medida que a percepção que temos sobre o desenvolvimento da sociedade e sobre a qualidade de vida a que aspiramos se tem alterado.
Hoje, esta qualidade de vida já não é vista somente como sendo apenas dependente do desenvolvimento tecnológico e do crescimento económico. Emerge fundamentalmente de como nos integramos com o ambiente que nos envolve. Estamos assim perante a construção de um Novo Paradigma Ecológico na sociedade.
A Conservação da Natureza, a gestão das reservas, dos parques e a defesa da biodiversidade e das paisagens e sítios tem que ser assumida como aposta nobilíssima do exercício da cidadania, como atitude individual e como esforço colectivo, como instrumento essencial do desenvolvimento sócio-económico de um povo e de um país.
A missão pública que a Constituição incumbe ao Estado faz parte integrante deste esforço, não lhe é estranha, não pode ser desempenhada em conflito e não deve usar à partida a coacção e o impedimento. Deve sim, esta missão, ser prosseguida com os cidadãos, através dos cidadãos, envolvendo-os numa participação activa e não apenas meramente consultiva.
Como instrumentos fundamentais para a concretização desta aposta realço entre vários, as acções que terão de ser projectadas e desenvolvidas para a implementação da Estratégia Nacional de Conservação da Natureza e da Biodiversidade; o Plano Sectorial para a Implementação da Rede Natura 2000, em fase final de aprovação; bem como os Planos de Ordenamento das Áreas Protegidas, em conclusão.
Ao ICN, desde a sua criação, então ainda denominado Serviço Nacional de Parques, Reservas e Património Paisagístico e ao labor de décadas, a todos quantos nele e com ele trabalharam e trabalham na execução deste esforço devemos todos nós, cidadãos, as Áreas Protegidas que temos e das quais desfrutamos.
Contudo, é hoje evidente a dificuldade acrescida do ICN para cumprir o essencial da sua missão, a Conservação da Natureza. Tal deve-se à não adequação da proposta de valor veiculada à evolução que a sociedade tem vindo a sofrer.
Esta incapacidade deriva essencialmente, no nosso entender, do facto de nas sociedades modernas, desenvolvidas e democráticas o poder formal e administrativo do Estado já não ser hoje, só por si, suficiente para atrair “energia positiva” para a defesa do Sistema. Isto conduz, em muitos casos, a uma postura defensiva, reactiva e inevitavelmente perdedora.
Consideramos assim, em consonância com Vªs Excªs, Sr. Ministro e Sr. Secretário de Estado, que o ICN terá de reformular a sua proposta de valor a fim de conseguir um posicionamento na sociedade que lhe garanta capacidade de resposta para actuar pro-activamente, aproveitando as novas oportunidades que se lhe deparam e assumindo um compromisso com os portugueses, assente em quatro vectores-chave interdependentes e indissociáveis:
§ Conservar a Natureza e defender a biodiversidade;
§ Disponibilizar o lazer na Natureza;
§ Desenvolver localmente a cultura, o emprego e a economia sustentáveis;
§ Posicionar internacionalmente Portugal, como país com Áreas Protegidas qualificadas e certificadas, e deste modo contribuir para a sua competitividade externa.
Esta oferta agregada deverá, no nosso entender, ultrapassar a lógica apenas da preservação, para se focalizar na da criação de valor. Para tal, torna-se necessário reequilibrar legitimidades internas e externas e apostar decisivamente na participação e envolvimento activo e permanente da Sociedade.
O envolvimento daqueles que usualmente designamos por stakeholders, neste caso externos, é, assim, uma prioridade na gestão do ICN, devendo-se procurar formas de interacção onde, entre outros, os agentes económicos, o poder local, as populações residentes intra-áreas protegidas, bem como as ONGA’s, encontrem um espaço de expressão dos seus interesses legítimos.
Para que esse espaço seja criado, devemos ter capacidade de ajustar não só o quadro referencial de prestação de serviços, como também o modelo de gestão, para que a missão e os objectivos do ICN possam ser cumpridos na sua plenitude.
Esta participação e visibilidade dos stakeholders na gestão é uma necessidade, e porventura a única via, para que os interesses da comunidade, em particular no contexto da conservação do património natural, sejam, de facto, defendidos de uma forma pro-activa e mobilizadora, com a necessária exposição à avaliação constante por parte dos nossos concidadãos.
É nosso propósito construir esse enquadramento de participação, não excluindo o desenvolvimento de projectos em comum, assente numa clara distinção entre o papel do Estado e dos privados, mas somando recursos e competências para financiar e desenvolver novos projectos, que permitam que a Conservação da Natureza, em Portugal, seja gerida no contexto de um ciclo virtuoso, onde mais interacção com os stakeholders seja sinónimo, igualmente, de mais conservação do património natural.
Até agora, referi intenções de fazer o quê e com quem, porém não posso deixar de abordar o como.
Pese embora o actual momento político que o país atravessa, é minha convicção profunda que um novo posicionamento do ICN passa por uma reforma significativa da sua organização e do seu modelo de gestão.
Há que passar de uma lógica pensada como autoridade para outra construída também em torno de competências. Passar de uma organização reactiva, centralizada e vocacionada para a análise, para outra com capacidade de resposta ágil, motivada e cujo foco é a acção em ajustamento contínuo com a sua envolvente.
Por outro lado, o quadro referencial de prestação de serviços deve agrupar, de forma indivisível, as áreas de gestão da visitação, do turismo ambiental, da educação ambiental e dos projectos de conservação do património natural.
Igualmente, o modelo de gestão deve ser orientado para uma lógica de remuneração dos serviços prestados, independentemente da origem dos respectivos financiamentos, vinculando a organização, e todos aqueles que nela se inserem, ao valor que, de facto, criar para a comunidade.
Deverá ser no contexto destes novos modelos que os stakeholders encontrarão esse espaço de participação na gestão da Conservação da Natureza, de uma forma progressiva e gradualmente mais eficaz, vislumbrando na proposta de valor do ICN a remuneração dos seus legítimos interesses.
Não posso, finalmente, deixar de referir nesta intervenção já longa o mais importante dos recursos: as pessoas – os colaboradores do Instituto, qualquer que seja o seu cargo, estatuto e a função.
A confiança, com que inicio as novas funções, decorre do apoio, que tenho por adquirido, dos dirigentes e funcionários do Instituto. Todos, mas todos, serão necessários para a nova vida desta casa, só se excluirão aqueles que se auto excluírem.
A Presidência a que presido estará atenta aos seus direitos e deveres, às suas condições de trabalho, necessidades de formação e às suas expectativas profissionais, para que todos contribuam, de forma esforçada, criativa e motivada para a melhoria do serviço público prestado pelo Instituto de Conservação da Natureza. (...)"
2 comentários:
No mínimo encorajador. Que os actos sigam as palavras! E fica um recado bem dado aos funcionários: "Todos, mas todos, serão necessários para a nova vida desta casa, só se excluirão aqueles que se auto excluírem.". Gostava que todos ouvissem bem estas palavras, para contrariar o grau de desmotivação e de pessimismo que existe actualmente no ICN. Ficam então as expectativas e esperemos por resultados.
Luís Costa
Não me sinto habilitado para me pronunciar sobre actos do Divino por isso, exluindo milagres, só actos concretos me farão acreditar que um presidente escolhido por um governo com os dias contados, pese embora a justiça da sua escolha, que está para se provar, terá tempo e meios suficientes para pôr em prática estas palavras. Vamos torcer para que sim. Nota globalmente positiva! Uma nota negativa apenas - os funcionarios não são excluídos nem se auto-exclúem, ou o poder vigente os consegue motivar e retirar o melhor que cada um tem para dar, ou não! Isto é que é difícil. Fácil é encontrar os "auto-excluídos"!
Nuno Banza
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