sexta-feira, maio 20, 2005

Agravamento dos imposto sobre imóveis devolutos - por fim uma medida estuturante!

Por Pedro Bingre

Em boa hora se toma a medida de desincentivar tributariamente a posse de imóveis devolutos! (vide http://www.negocios.pt/default.asp?CpContentId=259752). Melhor dizendo: por fim se penaliza, de alguma forma que seja, o subaproveitamento dos imóveis!

Pena é que esta medida por ora só afecte os imóveis habitacionais (as casas) e não afecte também os solos agro-florestais, neste país onde mais de um terço do território é desperdiçado por proprietários absentistas que nem o cultivam, nem o vendem a quem o pretenda cultivar, nem o alienam aos Serviços Florestais, ao ICN, ou a outra instituição pública ou privada que lhes dê utilidade económica ou social.

Na generalidade dos países desenvolvidos, um imóvel devoluto (rústico ou urbano, edificado ou não) está sujeito a uma de três medidas desincentivadoras de açambarcamentos especulativos e/ou sub-aproveitamentos:

- Ou paga um imposto agravado, que aumenta exponencialmente ao longo dos anos (solução tributária);

- Ou paga uma coima, que também vai aumentando exponencialmente (solução penal);

- Ou é pura e simplesmente perdida a posse do particular sobre imóvel, que transita para o património público. Neste caso, o "direito de propriedade imobiliária" é entendido como uma "concessão de uso", estando o uso estipulado no plano de ordenamento do território que tutela a localidade; o proprietário de um solo classificado em ordenamento como "florestal" só usa e usufrui da sua posse enquanto nele exercer silvicultura, de um "solo agrícola" enquanto nele exercer agricultura, de um fogo habitacional enquanto o habitar ou o arrendar, etc.

Em Portugal nada de isto se passa, pesem embora vários os diplomas legais avulsos dos últimos duzentos anos, alguns deles ainda em vigor, que buscaram emular e generalizar em maior ou menor grau a Lei das Sesmarias de 1375. Para o consumidor que procura comprar casa, esta nova tributação acrescida dos imóveis devolutos será uma benesse dos céus: fará o preço da oferta excedentária por fim ajustar-se à (escassa) procura, descendo muitos pontos percentuais. Os proprietários e promotores imobiliários ver-se-ão compelidos a vender o mais rapidamente possível os seus prédios, competindo entre si ao nível dos preços praticados. Com centenas de milhares de fogos habitacionais excedentários (panorama só igualado na Europa por alguns subúrbios da antiga Alemanha de Leste), o ajuste da oferta à procura será talvez dramático. Quem sabe se isto não provocará descidas dos preços dos imóveis em até 75%, como aconteceu em Paris durante os anos 90;

Para o ambiente, será também óptimo: acabará o flagelo do "urban sprawl" em largas áreas do país (manter-se-á, contudo, junto das áreas com maior valor cénico, onde os reformados do Norte da Europa procuram comprar imóveis). O litoral e algumas montanhas continuarão sofrendo depressão urbanística, mas por fim sossegará a pressão sobre espaços periurbanos sem valor paisagístico em especial;

Para a economia nacional e no longo prazo, esta medida será de igual forma oportuna: cessará o investimento hipertrofiado no sector da construção civil e imobiliário privados, que pela sua natureza intrínseca tende a aumentar o nosso défice da balança comercial. Os agentes económicos que desejarem investir o seu capital passarão a fazê-lo em actividades economicamente produtivas (como a indústria e os serviços) em lugar de actividades economicamente improdutivas e -dirão alguns- parasitárias como a especulação imobiliária.

Para as economias locais e no curto a médio prazo, será a catástrofe. No nosso país, os maiores empregadores depois da função pública são os construtores civis. O efeito multiplicador do investimento na construção civil é o único sustento da economia de muitos concelhos. A falência generalizada do sector da construção civil privada (as obras públicas não sofrerão o mesmo) e do seu epígono -o imobiliário- trará porventura um terrível "crash" económico, com aumentos bruscos das taxas de desemprego.

Inúmeros particulares, que investiram as poupanças em imobiliário, verão minguar de súbito do valor do seu património. De qualquer forma, o "crash" dos sectores da construção e imobilário é inevitável e resultante de factores estruturais. Nem uma retoma conjuntural do crescimento económico em geral o conseguirá impedir. Para a economia política de Portugal, esta tributação marca uma certa reposição de justiça e moral económicas. Desde há décadas nossa Lei vinha permitindo modalidades de especulação imobiliária que nos outros países são classificadas como gravíssimos crimes de colarinho branco, e punidas como tal - nomeadamente a apropriação de mais-valias urbanísticas e o açambarcamento especulativo de prédios. Veremos o que sucede. Em todo o caso, bem-vindo seja o némesis da expansão urbana sem peias. Falta agora usar estas mesmas medidas tributárias para desincentivar a posse dos solos rústicos (agro-florestais) subaproveitados que caracterizam um terço do território nacional.

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