domingo, agosto 06, 2006

Ainda os fogos (e outra intuição)

Ver a notícia do el pais on line de hoje (ou primeiro comentário deste "post" também).

Referi que me parecia que o Noroeste de Portugal estaria este ano mais vulnerável.

Olhando para o mapa dos fogos parece que se confirma, mas é cedo para conclusões. Não era esse o ponto de discussão que queria trazer aqui, mas outra das constantes do que tenho vindo a escrever sobre o assunto: é que o que se deve comparar não são entidades políticas e administrativas, mas entidades bio-geográficas.

Isto é, não tem sentido comparar Portugal a Espanha em matéria de fogos, mas comparar a Serra do Caldeirão com Huelva, ou o Minho com a Galiza. Se o que digo fizer algum sentido (em 2003 o que ardeu em Portugal não tem correspondente bio-geográfico em Espanha, mas em 2004 quando ardeu o Caldeirão, ardeu a Andaluzia (Huelva) também), então quando arder o Minho, estará a Galiza às aranhas.

Conclusões não se podem tirar de um exemplo, mas...

henrique pereira dos santos

12 comentários:

Anónimo disse...

La Xunta denuncia "intencionalidad" en los 27 incendios declarados anoche
El fuego ha arrasado miles de hectáreas en esa comunidad y en el Alto Ampurdán gerundense

ELPAIS.es - España - 06-08-2006 -

El fuego devora Galicia. Al menos 48 incendios forestales asuelan esta mañana esa comunidad. De ellos, 22 están fuera de control y otros 26, aunque domeñados, aún siguen ardiendo, según fuentes de la Consejería de Medio Rural del Gobierno autonómico, que ha señalado que 27 de ellos se iniciado anoche. El consejero de Medio Rural, Alfredo Suárez Canal, ha indicado que este último dato “hace intuir la clara intencionalidad que se esconde detrás de los incendios”, y ha culpado de esta situación a “una actividad criminal desaforada”.

Pontevedra es la provincia más afectada, con 24 incendios (11, fuera de control aún). Allí, al menos 4.000 hectáreas de monte han quedado destruidas. Además, el viernes perdieron la vida dos mujeres en el municipio de Cercedo, carbonizadas en su vehículo cuando trataban de huir del fuego. En A Coruña hay 17 incendios, y sólo cuatro han sido controlados. En Ourense, hay seis y únicamente uno bajo control, mientras que en Lugo sólo hay dos y controlados.

Tres focos han requerido la activación del nivel máximo de alerta por generar riesgos para la población: los de Cercedo y Vilaboa, en Pontevedra, y el de Muros, en A Coruña, que ha obligado a desalojar una urbanización de la parroquia de Louro. Los bomberos han bajado el nivel de alerta del fuego que afectó ayer al casco urbano de Santiago de Compostela y que ya está controlado.

Fuego en el Alto Ampurdán

En la comarca gerundense del Alto Ampurdán, los bomberos han trabajado toda la noche para tratar de extinguir los incendios de Ventalló y Cistella. Los dos se declararon el viernes; el primero ha arrasado 1.010 hectáreas, y el segundo 260.

El fuego de Ventalló se estabilizó a las ocho de la noche de ayer dentro de un perímetro cerrado, pero aún no ha sido controlado. Trabajan allí 33 dotaciones terrestres y cinco medios aéreos, a los que se sumaron otros 12 esta mañana. Los municipios más afectados por este incendio son los de Viladamat (314 hectáreas quemadas), La Tallada d'Empord (301), Albons (170), Garrigoles (132) y Ventalló (93). Casi 700 de las hectáreas quemadas son de zona arbolada, un centenar de matojos y el resto de cultivos.

En Cistella trabajan 17 dotaciones terrestres. El fuego fue estabilizado ayer por la mañana pero aún no está controlado, en parte por culpa del viento de tramontana que sopla en la zona. Las llamas han destruido allí 260 hectáreas, la mayoría en Cistella y tres en Terrades. La mayor parte de la superficie quemada (164) es bosque, aunque también hay matojos (55) y cultivos (39).

Anónimo disse...

Olhando para as imagens de satélite no site do MODIS vêem-se os fogos nos 2 lados, a norte e a sul do Minho.
A este respeito tentei há algum tempo (2004) comparar o regime de fogo (1994-2003) em Portugal e na Galiza. Apenas por dificuldades de desagregação da informação disponível para Portugal é que não me limitei ao Norte. Ainda assim creio que a comparação é válida, dado o pouco peso que os incêndios a sul do Tejo têm para as estatísticas globais nacionais.

Aqui vai um excerto do relatório de então:
"Em primeiro lugar é de assinalar que uma análise de correlação detectou a existência de associação entre as características da época de fogo na Galiza e em Portugal (ainda que nem sempre estatisticamente significativa, dado a pequena dimensão da amostra). Tal significa que um ano severo em Portugal tenderá a sê-lo igualmente na Galiza, provavelmente devido a influências meteorológicas que operam à escala regional; o ano de 2003, e somente para os indicadores relacionados com a magnitude da área ardida, constituiu a única excepção evidente a esta associação.
A incidência (nº/área)de fogos em Portugal e na Galiza é similar, bem como a proporção de fogachos. O que realmente distingue as duas regiões, colocando imediatamente o nosso País num patamar superior de gravidade, é a área queimada por fogo (dupla), a área arborizada por fogo (quíntupla), a área florestada que arde relativamente ao queimado total (dupla), e a percentagem do espaço florestal que é queimada anualmente (quase o dobro)."

Estas diferenças expliquei-as na altura (e mantenho a explicação) essencialmente pelas diferenças no combate entre os 2 países, já que do ponto de vista meteorológico ou da vegetação não são suficientemente expressivas:

"Na Galiza a prontidão da primeira intervenção tem sido melhorada desde a década de 1980 e, apesar da sua eficiência ser inferior à que é conseguida noutras regiões do Mundo sob condições mais adversas, o dispositivo operacional tem um bom desempenho global, especialmente considerando o número elevado de ignições simultâneas. Em Espanha a introdução de helicópteros em meados dos anos 1980 baixou grandemente o tempo de resposta, que se situa agora em menos de 15 minutos em cerca de metade dos fogos. Também o rendimento (expresso como o comprimento de perímetro do incêndio activo que é controlado por homem) das equipas espanholas de elite é superior ao dos E.U.A"

E da conclusão:

"As actuações dos últimos 15 anos suavizaram acentuadamente os indicadores de gravidade dos incêndios florestais na Galiza. Tal foi possível graças à criação do SDCIF, em torno do qual se estruturaram várias funções e competências, que em conjunto com outros organismos, entidades e associações permite manter sob controlo os incêndios florestais. O facto da tutela da supressão ser florestal trouxe inegáveis vantagens, entre as quais o conhecimento do comportamento do fogo, a experiência com equipamento florestal e a adopção de técnicas indirectas de extinção"

Paulo Fernandes

Pedro Almeida Vieira disse...

Subscrevo tudo aquilo que o Paulo Fernandes escreveu. O Henrique Pereira dos Santos continua, diria teimosamente, a encontrar uma correlação entre Portugal e Espanha em relação à incidência dos fogos e o contributo das condições meteorológicas.
Os espanhóis conseguiram (quer na Andaluzia quer na Galixa, quer em todas as regiões) melhorar a eficácia no combate. E Portugal piorou. Olhar para as notícias - e sobretudo os títulos - em jornais espanhóis sem a devida relatividade é enganador: lá, um incêndio de 100 hectares é uma catástrofe; em Portugal, já são «peanuts»...

Anónimo disse...

Notícias do incêndio de Paredes, as do costume: excesso de meios(com colunas deslocadas desde Leiria, etc.) com muito fracos resultados, as frentes são apagadas mas reacendem a seguir uma dúzia de vezes porque não há a prática de ancorar o fogo deixando-o arder até aos caminhos (e os recursos que isto absorve...), a protecção de casas isoladas que absorve outros tantos recursos, artilharia pesada de autotanques com milhares de litros inúteis de água, a expansão do incêndio a ser limitada mais pela área queimada o ano passado do que pelos esforços do combate, ....
Tudo indica que se o cenário meteorológico se mantiver o sistema vai estar esgotado daqui a 2 ou 3 dias. E a certeza que as modificações implementadas este ano foram meramente cosméticas.

Paulo Fernandes

Henrique Pereira dos Santos disse...

O Paulo Fernandes é sem dúvida das pessoas que mais respeito nesta matéria de fogos.

Sabe a dormir o que eu nem sonho acordado.

Mas com o atrevimento da ignorância, diria que as suas conclusões sobre a comparação entre a Galiza e Portugal me merecem dois comentários:

o primeiro, o de que não se pode comparar a Galiza com o conjunto de Portugal por falta de desagregação de dados em Portugal. Na verdade a discrepância que o Paulo refere nas suas conclusões (a área queimada por fogo (dupla), a área arborizada por fogo (quíntupla), a área florestada que arde relativamente ao queimado total (dupla), e a percentagem do espaço florestal que é queimada anualmente (quase o dobro)) é também a discrepância que se encontra entre o Minho e o resto do país, pelo menos nos últimos anos (não sei que período de tempo foi analisado no estudo, mas é fundamental para dar solidez às conclusões). Se se clicar no link do artigo do jornal que é citado no post já não é a inicial a que se vai dar mas a uma actualização bem demonstrativa de como a situação na Galiza neste ano está bem mais severa (tal como no Minho, insisto);

O segundo comentário, mais geral, é que a política galega é de supressão do fogo, e esse tipo de políticas, se não associadas a remoção de combustíveis, são apenas bombas relógio que explodirão num ano de condições especialmente adversas (não é o caso deste ano até agora porque só vamos em três dias de vento leste, que tem sido fraco a moderado), como aconteceu em 2003 numa parte de Portugal (o Minho não ardeu nesse ano, provavelmente porque tinha chovido quase continuamente até ao fim de Junho) em que existiram 15 dias seguidos de vento leste forte a muito forte (fenómeno relativamente raro).

São hipóteses, mas o essencial continuo a insistir, é não comparar o que não pode ser comparado: Portugal a Espanha, ou a partes de Espanha que não sejam comparadas com as partes correspondentes em Portugal.

Fora isso, não tenho dúvidas de que se pode melhorar o combate, o que duvido é que sirva para muito se não estiver associado a uma política de gestão de combustíveis, como os EUA e a Austrália bem demonstram.

henrique pereira dos santos

Pedro Bingre do Amaral disse...

Até que ponto fará sentido comparar o regime de incêndios da Galiza com o de Portugal a Norte do Tejo, sabendo-se de antemão que na primeira área o clima é predominantemente eurossiberiano, enquanto na segunda é mediterrânico? A Galiza recebe mais precipitação -inclusivamente no Verão- do que o Norte de Portugal.

Henrique Pereira dos Santos disse...

A actualização do meio dia da situação na Galiza segundo el país. E ao lado, na página do el país (onde este é o tema de entrada), estão as referências da CNN sobre a situação.
Isto é, parece que a tese central (em circunsâncias desfavorávereis tanto arde o Minho como a Galiza) tem algum apoio no que está a passar.

Veremos a evolução, e veremos depois a contabilização final de perdas e danos.

henrique pereira dos santos

INCENDIOS FORESTALES
Galicia moviliza todos los medios disponibles para sofocar los 79 fuegos activos

Hasta 79 incendios seguían activos a mediodía en Galicia, 35 bajo control. La Xunta ha ordenado la movilización de todos los medios humanos y materiales disponibles. Un hombre de 74 años murió ayer en Pontevedra en la extinción de un fuego, por lo que son ya tres los fallecidos por la ola de incendios.

Henrique Pereira dos Santos disse...

Terça feira dia 8 e a Galiza continua numa roda viva a procurar combater os fogos.

Não nenhum pejo em reconhecer que provavelmente o fará melhor que o Minho português.

Mas a minha preocupação é apenas a de dar a César o que é de César e dar a Deus o que é de Deus: Espanha não resolveu o problema dos fogos e nem só em Portugal há problemas em condições meteorológicas adversas.

Penso que a demonstração da importância das condições meteorológicas adversas é tão esmagadora que nem admite grande contestação, face à exactidão da previsão do que ia acontecer apenas a partir da previsão meteorológica.

Cabe agora lembrar que as condições meteorológicas nem sequer forma muito adversas porque o vento se tem mantido fraco.

Se melhorarmos a eficácia do combate sem a adequada gestão dos combustíveis estaremos muito satisfeitos muitos anos (sobretudo se não fizermos contas aos custos), mas estaremos a incubar uma futura desgraça posterior.

A pálida imagem que hoje temos do que seria a Galiza se o vento estivesse forte a muito forte parece-me que é suficientemente assustadora para nos deixarmos de queixar permanentemente sobre as nossas condições do combate aos fogos e nos concentrarmos na discussão das políticas agrícolas que nos vão conduzindo para estas situações.

henrique pereira dos santos

Anónimo disse...

Volto a recorrer ao meu relatório de 2004 sobre a Galiza:
"... é francamente preocupante e denota insucesso nas estratégias de prevenção que o número de incêndios (e a sua componente de intencionalidade) se mantenha tão elevado. Nenhum programa de supressão ou gestão de combustíveis pode ser economicamente efectivo se não houver forma de regular o número de ignições. Se a esta abundância de fogos se unir a elevada combustibilidade dos espaços florestais galegos é forçoso reconhecer que o problema dos incêndios persiste.
A concentração de esforços na supressão, ignorando ou relegando a gestão de combustíveis para um papel secundário, resulta num paradoxo bem conhecido: a melhoria das estatísticas de incêndios é paralela ao aumento da vulnerabilidade dos espaços florestais, com uma probabilidade acrescida de futuros incêndios grandes e severos, perante os quais os meios de combate serão cada vez mais insuficientes. A este respeito é sintomático o incêndio ocorrido no Verão de 2004 na Andaluzia, que atingiu uma magnitude (mais de 20.000 ha ardidos) desconhecida em Espanha desde 1994.
A Galiza, como o resto da Espanha, centrou a sua atenção no aperfeiçoamento da coordenação e do dispositivo operacional da supressão e actividades associadas. Mas a experiência, particularmente a experiência Norte-Americana, mostra à exaustão que estas estratégias apenas contêm o problema no curto prazo, por muito fundamentado, racional e sistemático que seja o seu planeamento e execução. Quando os incêndios têm raízes socioeconómicas, como é claramente o caso na Galiza, são exigidas medidas gerais no âmbito da política florestal e do ordenamento do território e um apurado trabalho com as comunidades locais"

Paulo Fernandes

Henrique Pereira dos Santos disse...

Só para sublinhar que este comentário do Paulo Fernandes, que tem muito mais credibilidade que eu, é tão claro que dispensa comentários.

Subsiste a questão: sendo assim, o que fazer?

Talvez pelo meio de Agosto eu tenha tempo de fazer um post sobre isso.

Para já vou fechar esta série de posts com um comentário à notícia do público sobre os fogos na Galiza.

henrique pereira dos santos

Nuno Ferreira disse...

Felicito a ambio, HPS e os comentadores pela excelente discussão.

É muito provável que o que vou dizer seja demasiado óbvio e não traga nada de novo à discussão, mas não queria deixar de (re)lembrar que o arquivo dos dados de satélite do MODIS pode permitir aferir de uma forma simples o critério de previsão baseado no vento de leste referido por HPS, através da observação da direcção das colunas de fumo.

Devo dizer que este critério de previsão baseado no vento de leste parece estar de acordo com as imagens de satélite que retenho na memória (e que vi por curiosidade apenas, durante as épocas de fogos dos anos passados), mas apenas uma análise detalhada e sistemática o poderá eventualmente comprovar.

Neste link (http://rapidfire.sci.gsfc.nasa.gov/fas/?Europe_3_01/2006220&altdates) acede-se, no fundo da página, às imagens de satélite de 2005 e 2006, sendo possível assim ver-se de uma forma simples como era o regime de ventos nos dias de mais fogos (aconselho a visualização das imagens com melhor resolução, 250m/pixel). Sei que há imagens de outros anos, mas não sei o link.

Uma vez que as zonas activas dos incêndios estão delimitadas a vermelho, penso que não seria muito difícil processar automaticamente as imagens obtidas nos dias de incêndios florestais dos anos anteriores por forma a extrair a informação da direcção dos ventos dominantes durante os fogos (eu penso que saberia como o fazer, mas infelizmente não tenho tempo disponível - deixo a ideia para quem a puder aproveitar, parece-me que seria uma investigação interessante e muito útil). A partir daí, seria fácil realizar uma análise gráfica cruzando esta informação com outros dados (base de dados de fogos florestais, áreas ardidas, informação meteorológica, etc).

Finalmente, não queria deixar de lembrar que as condições meteorológicas são apenas uma das partes do problema e que a dimensão temporal (a observação da evolução no tempo - últimas décadas - do problema dos fogos) é igualmente importante para se poder aferir a importância do factor humano. Por exemplo, o gráfico que publiquei aqui (http://abaheisenberg.blogspot.com/2005_08_01_abaheisenberg_archive.html#112458293365345617) parece-me que ilustra claramente este aspecto. Ou seja, parece-me que a evolução temporal deve também ser tida em conta, por exemplo, em eventuais comparações entre Portugal e Espanha.

Observando esse gráfico, pergunto-me se não serão as diferenças sociais / políticas os principais factores que determinaram a evolução da gravidade do problema dos fogos nas últimas décadas...

Nuno Ferreira disse...

Só uma pequena adenda relativamente ao que disse no comentário anterior:

- neste link podem ver-se alguns dados MODIS de 2003. Numa das fases mais críticas dos incêndios desse ano (o pior em área ardida), os ventos vinham de sul (imagem), indicando que podem existir outros regimes de ventos que tornam especialmente fácil a propagação de incêndios.