sexta-feira, abril 27, 2007

O interesse público, a Conservação da Natureza e o sistema PIN (1)

Tal como fiz anteriormente publico aqui em fascículos, qual novela, um artigo que publiquei na revista mais ambiente.

Uma pequena história sobre um pequeno projecto

No processo de elaboração de um dos planos de ordenamento de uma área protegida surgiu o problema da localização de um estábulo com queijaria colectiva relacionada com o apoio à actividade de pastorícia.

O apoio à pastorícia era consensual, quer pelo lado da melhoria das condições de vida das populações locais, quer pelo lado da conservação já que a conservação de alguns habitats dependia de perturbações periódicas associadas ao pastoreio.

Por razões de saúde pública e de vizinhança estava fora de causa a instalação do projecto dentro das áreas urbanas.

Na envolvente os valores naturais presentes apontavam para a necessidade de contenção da construção, pelo que os regulamentos associados ao zonamento a impediam.

A solução foi criar uma excepção às regras gerais.

As excepções à aplicação de regras gerais são a principal fonte de poder ilegítimo dos funcionários da administração pública e, por essa razão, são o terreno mais fértil para o desenvolvimento da corrupção.

Por essa razão, e depois de muita discussão, balizou-se a aplicação da excepção, definindo com clareza as circunstâncias em que a excepção poderia ser aplicada e criando um processo de decisão aberto, sujeito aos escrutínio público e com mecanismos dependência mútua de mais de que uma fonte de poder.

Na prática limitou-se a aplicação aos projectos do sector primário, desde que cumprissem condições bem definidas como a ausência de alternativa de localização, a adopção de medidas de gestão de habitats associadas, a obtenção do parecer de um orgão de consulta em que estão representados outros interesses sendo a decisão precedida de um período de discussão pública[1].

Estas condições poderiam ser universais para projectos que afectem valores naturais, não sendo sequer particularmente inovadoras, já que adaptam os mecanismos de excepção previstos na Directiva Habitats para a aprovação de projectos que têm efeitos negativos na conservação.

O estabelecimento destas regras constitui o reconhecimento de que a conservação da natureza é um interesse público real, cujo prejuízo só pode justificar-se se outros interesses públicos de maior relevância o impuserem.

(a continuar)

[1] em abono da verdade esta última condição não figura na proposta final de plano porque ainda há quem na administração pública entenda que não é legal prever discussões públicas suplementares nos planos para além das que a lei explicitamente prevê!

3 comentários:

Ponto Verde disse...

E agora eis que se tira da cartola um "simplex" sobre os procedimentos administrativos dos instrumentos de planeamento do território...hummmm!!!

Mário da Silva disse...

Depois desta fantástica notícia já nada mais vale a pena.

Sinceramente, este país é para esquecer e devemos é começar a pensar sériamente na emigração.

Até mais.

Henrique Pereira dos Santos disse...

Não me parece errada esta simplificação, há de facto muita coisa que pode ser racionalizada no processo de elaboração dos planos.

Tenho no entanto uma proposta concreta para acompanhar este acordo de princípio: é que sejam responsabilizados de forma muito clara os responsáveis pela verificação da conformidade legal de um plano que contenha normas ilegais.

Simplificação processual, de acordo sem dúvida, mas consequências concretas quer para os técnicos, quer para os dirigentes das CCDRs que aceitem normas ilegais em planos.

Parece-me um bom equilíbrio.

henrique pereira dos santos