Confesso que fiquei desiludido com as posições das organizações ambientais que se pronunciaram sobre o novo aeroporto.
Pelo menos pelo que vi pelos jornais e respectivos sites, o movimento ambientalista pronunciou-se sobre os efeitos decorrentes da criação do novo aeroporto, não resistindo sequer ao argumento ridículo dos sobreiros (como se tivesse algum sentido discutir a questão de um aeroporto que ocupará menos de 2 000 ha com base no número de sobreiros a abater num país que tem mais de 700 000 ha de sobreiro).
Ora o que me parece mais relevante ambientalmente é a discussão dos pressupostos da decisão com a introdução das variáveis ambientais e de racionalidade no uso de recursos, o que me parece totalmente omisso no que tenho lido sobre a matéria.
Qual o preço de referência do petróleo usado nas projecções de tráfego aéreo? Quais os riscos introduzidos na operação e nos fluxos de passageiros pela possibilidade de alterações climáticas, nomeadamente se as viagens aéreas passarem a ser taxadas, quer por via de cada bilhete emitido, quer por via da taxação do combustível para a aviação?
Estas duas pequenas questões (e com certeza os especialistas poderiam encontrar mais) parecem-me introduzir em quaisquer previsões sobre o que será a aviação nos próximos anos um elevado grau de incerteza que me parece que deveria ser tido em atenção.
Lembraria os amanhãs radiosos que o porto de Sines iria introduzir na economia nacional e que por via do choque pretolífero de 1973 (e outras coisas) deixaram de existir. Quer dizer que o porto de Sines não é relevante para a economia nacional? Não, quer dizer que os seus efeitos estão longe do projectado que justificaria o uso de tantos recursos públicos na sua contrução em alternativa a outras possibilidades de uso dos mesmos recursos.
Lembraria Alqueva e o futuro radioso da agricultura prometido e a realidade de hoje o Estado português estar desesperadamente a tentar que no próximo quadro comunitário de apoio 11% dos recursos disponíveis sejam retirados ao resto do desenvolvimento agrícola (incluindo o pagamento de serviços ambientais prestados pelos agricultores) para enterrar em Alqueva, para além de tudo o que já lá está afogado, apenas porque os pressupostos da decisão desapareceram entretanto e a agricultura de amanhã já não é a que se antevia quando se tomaram as decisões.
Poderíamos andar mais para trás, para a ideia brilhante das scuts porem os nossos filhos e netos a pagar a construção das estradas de hoje no pressuposto de que a riqueza entretanto criada por elas tornaria o encargo leve.
Ou mais para trás ainda olhando os variadíssimos grandes projectos nacionais (o caminho de ferro para salamanca, cabora bassa, etc.) que afinal não deram os resultados previstos porque o futuro dos nossos avós afinal não foi o nosso presente.
Aqui chegado parece razoável supor que a solução mais adequada para o aeroporto é aquela que for mais flexível e se adaptar melhor aos tempos de incerteza em que viveremos.
E essa parece ser, sem sombra de dúvida, Portela+1. Ainda não percebi, para além das razões de alavancagem financeira a partir da especulação urbana, por que razão a Portela tem de ser abandonada.
Tenho muitas dúvidas nesta matéria, é certo, mas parece pobre que o discurso ambiental se deixe cair na ratoeira de apenas discutir impactos ambientais e não os pressupostos ambientais da decisão.
henrique pereira dos santos
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
4 comentários:
Caro Henrique,
Como referi no "post" anterior não tenho opinião formado sobre este assunto mas a minha intuição também favorece a opção portella+1.
A questão central é obviamente o fluxo de tráfego que se poderá esperar no futuro.
Uma ligeira reforma do aeroporto da portela (que está um pouco degradado, diga-se) e um aeroporto de Beja bem conectado, por via férrea, com o Algarve e Lisboa (associado a um modernização do aeroporto do Porto) poderiam ser suficientes se o aumento do fluxo de tráfego aéreo para Portugal derivasse fundamentalmente do aumento de fluxo interno europeu por via das operadoras "low cost".
Todavia, a simples optimização da rede actual - incluindo Beja - não seria suficiente se portugal se tivesse condições de se afirmar como plataforma giratória de voos internacionais, designadamente fazendo a ponte entre a Europa, o Brasil e um mundo lusófono em crescimento.
A questão é que uma coisa é querer e outra é poder.
Se é verdade que um novo aeroporto internacional de grandes dimensões seria condição necessária para que Portugal se pudesse afirmar como plataforma giratória também é verdade que tal só poderia acontecer se pudessemos oferecer custos competititvos (o que não parece assegurado). Especialmente porque estamos em competição com um aeroporto de Barajas que já
está ampliado e que já está a ganhar mercado, designadamente com o Brasil.
Por outro lado a pertinência do investimento dependeria da robustez económica dos Países lusófonos e da disponibilidade/ custo do petróleo.
Portanto são muitas as variáveis, muita a incerteza e muitos os factores de risco.
Estamos no domínio das grandes opções estratégicas e parece que nem o PS nem o PSD estão a ter capacidade de transmitir segurança nas escolhas que apresentam.
Pelo contrário, parece estarmos mais uma vez no domínio da pequena política influenciada pelos lobbies dos pequenos empresários que têm olho porque vivem em terra de cegos.
É uma pena pois a memória dos grandes elefantes brancos do investimento público é fresca e estes contribuíram de forma significativa para o estado de degradação das contas públicas. Uma degradação que está a obrigar o Estado a conduzir políticas drásticas a nível económico e social com custos visíveis para todos.
A receita para tirar Portugal do atoleiro não será certamente mais do mesmo.
Portanto, seria importante discutir, sem pressa e com razoabilidade, as opções TODAS, e possivelmente optar por uma solução parsimoniosa pois não somos um País rico e os riscos são grandes.
Pois nem o Henrique, nem o Miguel estiveram na reunião que se realizou em Alenquer, onde o que está referido no post e no comentário foi matéria substancial da reflexão ( não nos devemos deixar ir na lógica dos soundbytes). Eu, embora em representação de uma candidatura de cidadãos independetes para a CML ( unica que aceitou o convite!) fiz um discurso que parece que o Henrique ouviu. Falei da Amália Rodrigues e do projecto de Sines e de uma nova cidade que foi projectada...e hoje... faleo do Alqueva, as propotas e o que é hoje...hoje... das propostas centrais nucleares...e hoje um país que há dez anos estaria sem electricidade sem elas...e hoje...
e falei de um cenário que integre os diversos vectores, o custo e a reformulação do transporte aereo ( e os dirigiveis do futuro!) uma análise que não seja paroquial (fim dos low cost, carga para Beja, redinamiazação das Pedras Rubras, articulação com Madrid para os intercontinentais TGV para Madrid, articulação por Badajoz) e não esqueci a questão da Portela e do ruído, observância da legislação, proibição e taxação se infracção dos nocturnos ( adeus low cost), controlé das emissões com novos dispositivos ( existentes mas caros e como não há multas) e análise da Portela mais 1, eventualmente com elasticidade.
E claro vistámos um paúl, uma zona alagadiça enorme, terrenos super produtivos e o sobreiral.
Tudo isso foi feito. Tudo isso. Os soundbyte por vezes distorcem o que se diz, ou só ouvem o que lhes interessa ( fartaram-se de querer saber e então Alcochete, quando a discussão não estava aí!)
Bom já vai longo o post e tenho que ir cavar mais uns paus.
Saudações
António Eloy
Sobre este assunto vale a pena ler este artigo de Miguel Sousa Tavares no expresso de hoje:
O desvario dos socialistas
A partir do final dos anos 30, o Estado Novo lançou-se na volúpia das grandes obras públicas. Sob o comando de Duarte Pacheco, acumulando o cargo de ministro das Obras Públicas com o de presidente da Câmara de Lisboa, lançaram-se os grandes projectos emblemáticos do regime, ao estilo arquitectónico grandiloquente do fascismo italiano: a Gare Marítima de Alcântara, o Estádio Nacional, o Técnico, a ponte de Vila Franca, o aterro de Belém, destinado a preparar o terreno para o que viria a ser o culminar dessa imensa demonstração de capacidade de realização e ‘modernismo’: a Grande Exposição do Mundo Português, de 1940. Lá longe, no outro extremo da Europa, também o estalinismo se lançava nos grandes projectos megalómanos servidos por uma arquitectura monumental e esmagadora, como que destinada a mostrar aos cidadãos que eles nada eram ao pé da dimensão imensa do Estado.
Não pretendo que as grandes obras públicas dos países pobres tenham apenas uma função de propaganda dos regimes. Muitas foram e continuam a ser úteis, mas todas elas ilustram duas crenças comuns à direita e à esquerda: a crença de que para muitos males nada melhor do que poucas e grandiosas soluções, de que as obras públicas monumentais são o instrumento mais apetecível; e a crença de que o Estado é o motor da economia. Portugal conhece várias destas demonstrações, saldadas por outros tantos elefantes brancos: Sines, Cahora-Bassa, Alqueva, a Exponor, o CCB. Todos os dias pagamos a factura dessas ilusões.
Eu acredito, pelo contrário, que, para muitos males simultâneos, devem existir muitas e adequadas soluções. Parece-me fácil e barato pôr termo às condições miseráveis e degradantes que ainda se vivem em tantos hospitais públicos; parece-me fácil e barato acabar de vez com as condições de vida humilhantes de tanta gente nas grandes cidades, aproveitando os terrenos públicos, em lugar de os entregar à especulação imobiliária. O que me custa a entender é que se queiram gastar biliões num aeroporto novo cuja necessidade está por provar, e mais uns biliões num TGV para o qual se desconfia que não haverá utilizadores que o justifiquem, ao mesmo tempo que há gente a viver como nos subúrbios de África e a tratar da saúde em hospitais que parecem saídos da Idade Média. Custa-me a aceitar a convivência entre o luxo e a miséria, entre um país pobre e um Estado esbanjador.
Os nossos socialistas ‘modernos’ têm dois fascínios fatais: as obras públicas e os interesses privados. A simbiose que daqui resulta é a pior possível. O Estado, empenhado em mostrar grande obra a qualquer preço, contrata com os grandes interesses privados tudo e mais alguma coisa: as estradas, as telecomunicações, o ensino, a saúde, a defesa. E dá de si tudo o que tem para dar: terrenos e dinheiros públicos, património e paisagem, empreitadas e fornecimentos, concessões e direitos de toda a espécie. A confusão de funções, de papéis e de interesses entre o público e o privado que daqui resulta é total e perturbante. Anteontem, na apresentação do TGV (e tal como já havia sucedido com a da Ota), o Governo falou, não para o país ou os seus representantes, mas para uma plateia seleccionada dos grandes clientes privados dos negócios públicos: bancos, seguradoras, construtoras, empresas de estudos, gabinetes de engenharia e escritórios de advocacia. E o discurso foi lapidar: “Meus amigos: temos aqui 600 quilómetros de TGV a construir e dez mil milhões de euros a gastar. Cheguem-se à frente e tratem de os ganhar!”.
Dois dias antes, na Assembleia da República, o PS uniu-se como um todo para votar contra a proposta do PP, apoiada por toda a oposição, para que o estudo de uma alternativa à Ota contemplasse também aquela que é a solução que o bom-senso defende: a da chamada Portela±1. No dia seguinte, no ‘Público’, o americano do MIT Richard Neufville, uma autoridade mundial em aeroportuária, explicava por que razão a questão do aeroporto de Lisboa se resolveria melhor e infinitamente mais barato com o simples aproveitamento de uma pista já existente e a construção de infra-estruturas mínimas e eficazes para as «low-cost». Mas os deputados socialistas, representantes nominais do interesse público, não querem sequer que a solução seja considerada. Porquê? A resposta só pode ser uma: porque na Ota e no TGV estão em jogos muitos interesses, muitos biliões, que o Governo promove e protege e que o partido compreende.
Temos agora a questão do TGV. Das três linhas previstas - Porto/Vigo, Porto/Lisboa e Lisboa/Madrid -, apenas a Porto/Lisboa se mostra necessária e eventualmente rentável - e isto porque a experiência de um anterior governo socialista com os ‘pendulares’, após milhões investidos e estudos feitos, se revelou um fiasco. Mas Porto/Vigo e Lisboa/Madrid ninguém sabe para que servirão. Não há estudos sobre a utilização prevista e a relação custo-benefício da sua construção. Depois de tranquilamente nos esclarecerem que, quanto aos custos de construção, a hipótese de a sua amortização ser realizada com as receitas de exploração é “totalmente para esquecer”, a própria secretária de Estado dos Transportes duvida de que, por exemplo, a linha para Madrid consiga ser auto-sustentável. Ou seja, depois de um investimento de dez mil milhões de euros a fundo perdido, preparam-se para aceitar tranquilamente um défice permanente de exploração. Quanto é que ele poderá vir a ser, ninguém sabe, porque não se estudou o mercado para saber se haverá passageiros que justifiquem três comboios diários para Madrid. Mas, para que os privados, que ficarão com a concessão por troços, não se assustem com a vulnerabilidade do negócio, o Governo garante-lhes antecipadamente o lucro, propondo-se pagar-lhes segundo a capacidade instalada e não segundo a capacidade utilizada. Isto é, se num comboio com trezentos lugares só trinta forem efectivamente ocupados, o Governo garante às concessionárias que lhes pagará pelos 270 lugares vazios. Todos os dias, três vezes ao dia para Madrid e eternamente, até eles estarem pagos e bem pagos. Eis o que os socialistas entendem por ‘obras públicas’ e ‘iniciativa privada’!
Alguma coisa deve estar tremendamente confusa na cabeça dos socialistas e do engenheiro José Sócrates. Eles não perceberam que não são nenhuma comissão liquidatária dos dinheiros e património públicos em nome dos ‘superiores interesses da economia’ (agora, vai a ria de Alvor, em projecto PIN...). Eles não perceberam que o interesse público não é construir aeroportos e comboios de luxo de que o país não precisa, para ‘estimular a economia’ e encher de dinheiro fácil empresários que não sobrevivem sem o Estado; que não é entregar todo o património natural e a paisagem protegida a especuladores imobiliários sem valor nem qualificação; que não é ‘emprestadar’ o CCB ao comendador Berardo para lhe resolver o problema de armazenamento da sua colecção de arte. Se isto é a esquerda, que venha a direita!
A minha modesta opinião é que a grande parte dos peritos, comentadores "opinion makers" etc não passam de avençados do sistema (digo Sistema e não este ou outro Governo).
Quando se vêm a projecções de fluxos previstos somos (eu pelo menos sou) levados a pensar que tudo o que se diz da escassez crescente de petróleo, efeito de estufa etc. etc. não passam de patranhas. Estou quase a mandar às malvas os pregadores das modernas virtudes (separar lixo, reciclar, reduzir) estou quase a voltar ao antigamente, isto é, tudo num saco para o primeiro contentor, aliás o que faz a generalidade dos genuínos portugas. Se calhar eles é que têm razão.
LG
Enviar um comentário