quarta-feira, agosto 01, 2007

Lisboa: 25% da nova construção a baixo custo

O PS e o Bloco de Esquerda chegaram a um acordo que estabelece que 25% das novas áreas construídas tenham de ser vendidas a preços sociais.

O sector da construção, habituado a não pensar nas suas responsabilidades sociais, contesta a quota considerando-a ilegal. Não sei se, ao abrigo da Lei Portuguesa, tal quota seja ilegal mas gostaria de salientar que esta medida é uma cópia de um procedimento implementado, por Ken Livingstone, na cidade de Londres (ver plano estratégico aqui).

Nesta cidade a regra é que 30% (em certos casos 35%) das novas construções sejam colocados no mercado com preços moderados ou baixos. Falta avaliar o resultado desta medida mas à partida parece ser um modelo interessante para controlar a especulação imobiliária.

Em Portugal, em particular em Lisboa, antevê-se um certo aquecimento do mercado imobiliário em virtude do arrefecimento do mercado em Espanha e da procura, por parte dos investidores Espanhóis, de novos paraísos para especulação. Esta medida pode ser mais importante do que parece.

3 comentários:

Henrique Pereira dos Santos disse...

Caro Miguel,

Confesso que não sei de que regras falas.

Ouvi realmente falar de qualquer coisa parecida com o título do post. E li hoje qualquer coisa nos jornais.

Mas de concreto apenas percebi que as regras só se aplicam a novas autorizações e será necessário alterar o PDM primeiro.

Mesmo considerando que o PDM de Lisboa está em revisão, o tempo necessário para qualqer revisão dificilmente deixará de rondar um ano.

Depois de tudo definido ainda será necessário mais um ano para começar a aplicar a regra (seja ela qual for) mas nessa altura estaremos de novo em eleições.

Não percebo pois do que falamos em concreto, para além do sound bite que nos distrai do facto de José Sá Fernandes ter passado de oposição para situação com o programa de outros.

Mas sei muito bem como já houve presidentes de câmara que procuraram usar o mercado imobiliário e o poder de licenciar para resolver o problema da habitação social.

O que mais longe levou essa lógica foi um presidente de câmara chamado José Luís Judas.

O resultado pode ser avaliado visitando o concelho de Cascais com uma fotografia aérea com mais de dez anos na mão.

henrique pereira dos santos

Miguel B. Araujo disse...

Caro Henrique

A questão tem pelo menos 3 planos de abordagem e creio que os misturas no teu comentário.

O primeiro plano é o dos princípios e é esse que pretendi abordar. É ou não correcto propor que uma percentagem de cada construção nova tenha preços abaixo do mercado para permitir ocupação por residentes que de outra fora teriam de residir no subúrbio? Em Londres é óbvio que tal é necessário pois uma cidade não pode ser só ocupada por milionários. Por estranho que pareça conheço menos bem Lisboa (já são muitos anos fora) mas parece-me que esta medida poderia ajudar a atrair as populações jovens que a cidade parece carecer.

O segundo plano é o partidário. Faz ou não faz, o BE, bem em aceitar um pelouro? A discussão deste tema estimula-me pouco mas não vejo razão para um partido que se apresenta consecutivamente às eleições se recusar a assumir responsabilidades no poder. Há limites para o contra-poder e para o mal dizer. Chega um momento onde, a bem da credibilidade, há que por em prática o que se prega. Esta é uma boa oportunidade e o facto da entrada do BE ter sido precedida de um acordo publicitado nos jornais, contrariamente à prática corrente dos acordos de cavalheiros sem regras conhecidas, parece-me interessante.

O terceiro plano é o da implementação prática dos acordos. Já lá vão mais de 12 anos que não olho a legislação Portuguesa em matéria de planeamento municipal mas se bem me lembro não faz falta alterar um PDM para reservar 30% da nova construção para habitação a baixo custo. No pior dos cenários seria necessário alterar planos de pormenor (o que parece ser mais fácil) e no melhor dos cenários esta medida política pode constituir uma simples regra a aplicar na discussão de medidas compensatórias (frequentemente traduzidos em arruamentos, parques, etc); algo que é prática corrente na gestão municipal e que não implica complicações de maior. Em todo caso, qualquer medida política tem de ser proposta antes de ser aplicada. O facto de poder haver um "decalage" entre intenção e gesto não implica que a medida não seja correcta. E se não for voltamos ao ponto que eu gostaria de discutir que é a questão dos princípios.

Miguel

PS. Não conheço o caso de Cascais nem sei o que se pode observar das cartas mas em todo o caso será difícil estabelecer relações de causa e efeito entre uma medida deste género e a evolução do padrão de ocupação urbana pois existiriam muitos outros factores a considerar.

Henrique Pereira dos Santos disse...

Miguel,

Respeitemos os três planos em que queres que a discussão seja feita, mas deixa-me alterar a ordem, começando do menos importante para o mais importante.

Não tenho nada contra o facto do Bloco de Esquerda ter mudado da oposição para a situação. Apenas referi que me parece que este acordo, no seu aspecto mais sonante, é uma cortina de fumo muito útil ao disfarce dessa mudança. Isto não é muito importante em si, mas revela um desconforto do BE em relação à chegada ao poder que me preocupa pela demonstração de imaturidade que constitui.

O segundo aspecto a que tu chamas exequibilidade da medida não fui eu que o inventei: quem disse que era preciso mudar o PDM foi o José Sá Fernandes. Ora como eu também não percebo bem qual é o objectivo dessa mudança do PDM mas sei que esta condicionante atira com a sua execução para as calendas, verdadeiramente para fora do tempo deste mandato, naturalmente fico de pé atrás.

Agora a questão de fundo. Quando aparece uma ideia nova eu tenho uma espécie de filtro de análise rápida para a avaliar: verifico qual é a racionalidade energética, para saber se é boa, verifico a racionalidade económica, para ver se é exequível.

É um filtro de análise rápida e posso enganar-me facilmente nesta primeira aproximação.

Neste caso a racionalidade energética não me ajuda na avaliação, portanto tenho de medir a sua bondade por outros meios, mas a racionalidade económica deixa-me muito preocupado.

Na forma como a ideia é apresentada os construtores vão "pagar" a habitação social através de um corte nos seus lucros.

Ora ninguém prescinde dos lucros de boa vontade. Portanto, ou este corte se dá por via regulamentar, ou por via contratual.

Se é por via regulamentar não vejo muito bem como se obriga um promotor a entregar de mão beijada 20 casas das cem que construiu sem reflectir esse custo nas outras oitenta.

Tendo em atenção que um dos problemas da gestão urbana é a desertificação do seu centro por via da tercearização e de uma lei de arrendamento absurda, estaremos a empurrar a classe média para fora de Lisboa, o que me parece errado.

Mas o mais natural é que o modelo não seja o de fazer diminuir os lucros dos promotores (pelas complicações e dificuldades que isso traz e são muitas, não descartando as que dizem respeito ao financiamento partidário), mas sim a via contratual, em que se permite mais construção em troca da disponibilização de habitação social (é o modelo de José Luís Judas).

Aqui não há perda para os cofres públicos nem para as empresas, nem distorção dos preços de mercado, há só densificação da ocupação do espaço.

Os exemplos em Portugal são muitos, desde a expo 98, ao pólis, passando por várias experiências de habitação social espalhadas pelo país.

Por isso Miguel te disse que não vi medida nenhuma, ouvi falar de uma intenção que não consigo discutir em abstracto.

Falaremos melhor quando houver concretização.

Nessa altura teremos tempo para discutir se é no preço das casas fixados administrativamente ou no apoio directo às famílias que se deve apostar quando quisermos apoiar um uso socialmente mais diverso do centro das cidades.

henrique pereira dos santos