Com alguma regularidade, almoçávamos no pequeno restaurante perto da sede. Era prático. Suficientemente rápido para não prejudicar o andamento dos pareceres que se amontoavam em cima da secretária, mas nem tanto, para pormos a conversa em dia. Lamentava-se sistematicamente. O mau estado das viaturas do serviço, as novas limitações nas senhas de combustível e de ajudas de custo, a falta de dinheiro para tudo e mais alguma coisa, a ausência de cobertura política para um passo mais ousado. O último vigilante tinha-se ido embora há pouco e o próximo concurso tinha sido adiado. Lá longe, um confrangedor vazio de ideias acerca do que realmente pretendia para aquela área e uma total ausência de objectivos a curto, médio ou longo prazo. Uma necessidade paranoica de tudo controlar o que naquela área se passava. Na sua área. Porque tudo era passível do seu conhecimento, parecer, idealmente autorização. Um certo sentimento de posse que alguns dirigentes têm, bem camuflado numa alegada necessidade de gestão. Ao fim, lá longe, um qualquer superior, diabólico, capaz de destruir a sua mais pequena e indubitavelmente bondosa iniciativa. Enfim, o único culpado do actual estado das coisas, alíbi da sua incompetência e incapacidade.
No meio de tanta lamentação e negritude, um dia perguntei-lhe o que me parecia evidente, "porque não te demites?", pasmado, olhou-me por um bom punhado de segundos, e entre a amizade que nos aproximava e a sua condição de superior hierárquico deixou escorregar "não, não... mais um ano e subo a assessor".
Gonçalo Rosa
domingo, maio 10, 2009
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1 comentário:
Pois, a posição de assessor deve ser bem boa.
Depende também do que, ou de quem, se assessoria, não é?
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