A troca de palavras efectuada a semana passada no Ambio sobre o posicionamento de Associações Ambientalistas versus decisões em tribunal sobre projectos com fortes impactos ambientais, no seguimento do que se passou sobre o Costa Terra, fez-me recordar uma conferência de Vaclav Havel a que assisti em 2007 em Berlim.
Mas comecemos pelo essencial e este não se situa entre o reconhecimento de ilegalidade ou não versus negociações com promotores. A questão essencial é a patente “Falha de Estado” que estes processos tornam visíveis sem que ninguém, pelo menos aparentemente, se apresente minimamente incomodado.
Falhas de Estado são aquelas que levam a que o Estado não consiga garantir e distribuir recursos de forma a assegurar bens essenciais, como a segurança, a educação e os cuidados de saúde. A incapacidade de controlar o seu próprio território, a existência da corrupção e a incapacidade de Governação são igualmente Falhas de Estado.
Ora, face a um dado projecto de investimento de dimensão, o Estado tem a responsabilidade, seguindo determinados procedimentos, de verificar dos seus impactos ambientais e eventualmente identificar e fazer cumprir medidas compensatórias conducentes com a avaliação efectuada, a discussão pública havida e a decisão tomada. É pressuposto que essas medidas sejam proporcionais (com maior ou menor latitude) aos danos causados. Contudo, quatro situações anormais podem acontecer.
Primeira, o Estado actua de forma a que o promotor aceita sobre - compensações muito para além do que o projecto e a avaliação de impacto ambiental permitiriam equacionar (para mim, exemplo disto é caso do Sabor pós interrogações da Comissão) visando a aceitação política do projecto nas várias instâncias. Segunda, o Estado aceita do promotor sub - compensações (caso inicial do Sabor, igualmente na minha opinião) normalmente aceitando que o projecto não gera receita suficiente para suportar este custo, mas que o mesmo é importante para o desenvolvimento local/regional.
Pode acontecer também que o Estado, embora assegure do promotor a execução das medidas compensatórias adequadas, actue posteriormente no sentido de o levar a aceitar envolvimento em acções e custos que estão para além daquilo que tinha sido definido como o razoável em termos de compensações (frequente na esfera do poder local).
Por último, o Estado, embora não actuando directamente sobre os promotores, permite que outros, nomeadamente privados (e as associações ambientalistas são entidades privadas), o façam como forma de não vir a ter problemas futuros durante a execução do projecto.
Em qualquer das situações descritas, que parecem ser comuns nos nossos processos de ordenamento do território, estamos perante a presença de falhas de Estado graves, ou porque não existem recursos, informação e organização que permita determinar e fazer cumprir o decidido em sede de avaliação de impactos ambientais, ou por incapacidade em afirmar o ordenamento do seu próprio território, ou, o que é ainda mais grave, porque existe captura do poder de decisão pelo interesse privado, ou finalmente, porque o Estado aceita pura e simplesmente a “extorsão mais ou menos oficializada” sobre privados.
Ora, recordando a conferência que referi no inicio, foram exactamente estas algumas das muitas razões que levaram a que Vaclav Havel afirmasse que a principal medida para os ministérios do ambiente não era dotá-los de recursos e organização, mas sim transformá-los em verdadeiros “Ministérios da Decência”.
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