Muito se tem falado sobre os impactes dos parques eólicos sobre a avifauna, em especial os negativos. Embora aceite que em zonas de elevada densidade de aves possa existir impactes sobre este grupo faunístico, reconheço que a meu ver, existem outras estruturas e actividades antrópicas bem mais impactantes que muitas vezes são negligenciadas ou subvalorizadas.
Após os trabalhos de recuperação paisagísticas dos taludes de um recente parque eólico construído na Serra de Montemuro, que terminaram a finais de Abril, este parque eólico entrou em pleno funcionamento em início de Maio. Enquanto fazia prospecção de mortalidade desse parque eólico em finais de Maio, um casal de Monticola saxatilis (merlo-das-rochas) chamou-me a tenção pela frenética actividade que desenvolviam no entorno de um dos aerogeradores. Bastaram 10 minutos sentado encima de uma rocha para descobrir que este casal de melro-da-rocha, tinha escolhido o talude deste aerogerador para nidificar, aparentemente com sucesso verificado pelos 3 juvenis voadores, observados nas imediações passado mais ou menos um mês.
Estranho este casal de merlo-das-rochas ter escolhido um local de nidificação onde 2-3 semanas antes se encontravam gruas, camiões e até uma retroescavadora envolvida na recuperação e modelação do talude onde nidificara e estar situado a escassos 5 metros de um aerogerador.
Será que para este casal de Monticola saxatilis a construção do PE teve um impacte positivo?
7 comentários:
Já ouvi falar de um ninho de bufo real instalado numa estrutura que se encontra suspensa sobre uma estrada...e já vi vários bufos reais atropelados...
Já me contaram que foram encontrados alguns um Microtus cabrera numa berma de uma auto-estrada...e o impacto global das AE nestes roedores não é positivo (fragmentação do habitat, atropelamentos etc)...
Às vezes encontram-se situações curiosas, mas não passam disso.
Em Portugal, mais que em qualquer outro lado, existe o culto da excepção e uma grande tendÊncia para estabelecer relações de causa efeito sem grande base para isso...por isso costumo ter um bocado de medo de ouvir isto...especialmente quando existe tanta gente mal intencionada interessada em subverter questões ambientais.
Viva Paulo.
Eis mais uns exemplos curiosos, para ires listando factos nesta matéria.
Há uns anos(2002-2003), havia o caso de um Peneireiro (deduzi pela descrição que me fizeram) que entrava frequentemente na "nacelle" de um aerogerador (para quem não domina o termo, a nacelle, é a estrutura onde se acoplam as pás e - dependendo dos modelos -, se encontra o gerador propriamente dito), num parque na região do Barroso. Estive várias vezes nesse parque, mas nunca pude comprovar.
Já na serra da Lousã, chegámos a observar, numa plataforma de montagem dum parque recém construído(onde após a construção do parque se semearam herbáceas), um corço a pastar tranquilamente às 3 da tarde. Isto para não falar dos veados que continuaram a frequentar aquela serra mesmo depois da entrada em funcionamento do parque.
Haverá concerteza outras situações; os guardas e os técnicos de manutenção dos parques são pessoas que provavelmente têm outras observações invulgares, que seria útil recolher.
Marco
Caro Anónimo,
A minha intenção não era generalizar este exemplo, e tive o cuidado na pergunta final que me referir a este caso concreto.
O processo de AIA em Portugal é uma coisa recente (eu diria que é menor de idade), por isso o conhecimento dos impactes, seja eles positivos, nulos ou negativos, são exíguos. Este e outros casos similares dão-nos indicações sobre essa falta de conhecimento.
Marco,
A abertura de clareiras em espaços fechados (seja ele de matos ou floresta) beneficia a presença de espécie como as que referes, assim como por exemplo o coelho-bravo, as pessoas que normalmente trabalham em PE, são sensíveis a este fenómeno (aumento de latrinas em plataformas de AG’s), mas nunca vi em EIA’s de PE’s a avaliação do possível impacto que o aumento da presença de coelho-bravo em plataformas de Ag’s possa ter na mortalidade de espécies de rapinas por colisão.
Pois, daí ser relativamente comum encontrar-se rapinas(diurnas e nocturnas) atropeladas, em locais onde caçam pequenos roedores e répteis nas bermas das estradas sem arbustos e apenas com erva.
Interessante era verificar a relação dos parques com a Gralha-de-bico-vermelho (onde a haja),que se alimenta no solo e depende das tais clareiras, que escasseiam onde o pastoreio tem regredido, não?
Caro Paulo
Sim, ficou claro que o seu post se referia ao caso daquele casal.
Estava só a aproveitar o seu exemplo para referir outra questão que por vezes decorre das excepções.
Na última vez que visitei um parque eólico vi duas crianças a brincar mesmo ao pé de um aerogerador!!
Os caríssimos Marco e Paulo não quererão também comentar:
http://www.youtube.com/user/joaopauloforte#p/a/u/1/Sd4b1xJmvAI
O título deste post vai de certeza causar comichão a muita gente. Relativamente ao assunto em questão, todos sabemos que existem mais impactes (positivos e negativos) do que aqueles que o senso comum à partida no diz.
Muitas vezes vemos relatórios de monitorização que mostram que a diversidade de espécies se manteve mais ou menos resiliente às alterações causadas pela implementação de um parque eólico. Contudo, analisar alterações na diversidade de espécies é algo extremamente frio no sentido em que a diversidade pode manter-se mais ou menos constante mas a estrutura da população pode ter sido completamente alterada.
Excepções como esta são extremamente valiosas para perceber essas alterações na estrutura das populações.
Não estou a levantar bandeiras a favor da energia eólica nem a dizer que impactes como este são recorrentes, o que acontece muitas vezes é que estamos no terreno focados no óbvio (pesquisa de mortalidade, neste caso) e não damos atenção a estes pormenores porque achamos que são irrelevantes ou são excepções que não merecem destaque.
Obrigado ao Paulo por partilhar estas observações.
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