Hoje há várias notícias (por exemplo) sobre os preços da água de Alqueva para rega.
O que se está a passar é notável.
O Estado gastou o dinheiro dos contribuintes a fazer uma barragem e o respectivo sistema de rega, no pessuposto de que esse dinheiro serviria para criar riqueza.
No fim do empreendimento feito, o Estado propõe-se subsidiar fortemente o preço da água para que os agricultores reconvertam o sequeiro para regadio, para "garantir o aproveitamento possível" do empreendimento nas ingénuas mas certeiras palavras do Senhor Ministro da Agricultura (em economia acho que se chama a isto um "sinking investment" mas não sou economista).
Ora aqui está uma boa causa ambiental para o movimento ambientalista pegar, no concreto, não no abstracto de dizer que os preços da água devem reflectir os seus custos de disponibilização, garantindo o princípio do utilizador pagador.
Qual é o valor social prosseguido pela subsidiação pública do preço da água? Teoricamente a criação de riqueza, o aumento de produção agrícola e a criação de emprego.
Aparentemente acredita-se que a subsidiação de factores de produção é uma opção económica inteligente e eficaz para criar emprego e riqueza (já o aumento da produção agrícola não é um objectivo em si mesmo há muitos anos, como demonstra tudo o que é dito sobre a reserva agrícola nacional pelos mesmo responsáveis por esta política).
Pois eu não estou de acordo.
O dinheiro aqui enterrado, para além dos impactos ambientais negativos que provocou, faz falta noutros lados. O Estado não tem nada que usar o dinheiro dos contribuintes para tornar competitivo o que os empresários não sabem (ou não podem) tornar competitivo no mercado. E o Estado não tem nada que provocar reconversões agrícolas artificiais que deixarão os empresários na miséria quando um dia descobrirem que os recursos não chegam para manter indefinidamente a subsidiação dos factores de produção.
O que o Estado pode fazer é intervir onde existem falhas de mercado, isto é, intervir para suportar produções com valores sociais positivos não apreensíveis pelo valor de mercado, por exemplo, apoiando a gestão de lameiros através de produções pecuárias que são inerentemente não competitivas nas condições de mercado actuais, mas que produzem biodiversidade. A razão para o apoio a essa actividade económica não é criar riqueza mas apenas o facto dessa ser a forma mais barata e eficaz de manter os lameiros.
A verdade é que no nosso PRODER (onde estão os dinheiros para o desnevolvimento rural) 11% das verbas previstas são para afogar em Alqueva e tenho as maiores dúvidas que nelas estejam já incluídas estas subsidiações ao preço da água.
Por isso falta dinheiro para apoiar a biodiversidade que resulta da relação com as actividades do mundo rural. Por isso falta dinheiro para apoiar os desenvolvimento local de comunidades especialmente frágeis face aos seus condicionamentos naturais à produção. Por isso falta dinheiro para aumentar o papel de gestão de combustiveis dos rebanhos. Etc., etc., etc..
Questionar, inclusivamente na justiça, nomeadamente quanto ao cumprimento da directiva quadro da água, esta decisão sobre os preços da água em Alqueva era uma acção a que eu daria sem dúvida apoio.
henrique pereira dos santos
4 comentários:
Que Alqueva nunca seria economicamente viável não é novidade. A novidade talvez seja o reconhecimento disso... Não sei o que se passa por exemplo na Andaluzia, mas suspeito que tal como em Alqueva (e em Israel) que a aparente pujança agrícola seja também ela altamente subsidiada (de uma maneira ou de outra)...
E desiludam-se os que acreditarem que Alqueva vai ser rentabilizado através do golfe ou do turismo fluvial.
Alqueva cumpriu o seu papel naquele modelo de criar riqueza baseado na ideia de que se podem contratar 10 pessoas para abrir buracos e outras 10 para os fechar.
A questão central tem a ver com qual a estratégia que se pretendente não só para o Alentejo, mas para todo o interior. Mais, donde é que virá a nossa comida e matérias primas? Trabalhar no campo é duro, e ninguém quer hoje em dia trocar um confortável escritório pelas agruras do trabalho rural.
Se por um lado não acredito que o azeite ou o vinho sejam panaceias para resolver os nossos problemas, também tenho dúvidas num sistema baseado no apoio das actividades tradicionais possam dar a médio prazo resposta às nossas necessidades.
Este debate é talvez uma das questões fundamentais a que Portugal terá de dar resposta nas próximas décadas.
Alexandre Vaz
Notável é que nenhum dos 36 fale em Alqueva, talvez porque tem culpas no cartótio, assim como é notável que os Verdes (os tais) nunca tenham aberto a boca sobre a grande barragem, a não ser para apoiá-la.
Quem lá passa por este dias vê a enorme desgraça em que o lago se transformou, com milhares, muitas milhares de azinheiras e outras árvores "protegidas" submersas e a aumentarem a "qualidade" da água, que continua com transvases empncados e noutros os custos a formarem nuvens de irrealidade.
E KWh é vé-los...também no digito arabe....
Mas nem os 36 nem os verdes se preocupam com esta desgração e andam a perseguir ou moinhos de vento no ar ou em terra,,,,
António Eloy
HPS,
Completamente de acordo com a sugestão de que o preço da água - como aliás o da electricidade - deve transmitir ao consumidor final, duma forma exaustiva, os custos suportados para a disponibilizar.
O confronto com a realidade forma a consciência, molda o carácter, e ajuda a tomar decisões (especialmente em períodos eleitorais...).
Não desejo que o Estado tenha uma atitude paternalista de esconder o custo real da água. Mas desejo que o Estado tenha a atitude autoritária de - ao contrário do que sucedeu com a electricidade, e em especial com a rede de muito alta tensão - assumir o controlo integral da produção e distribuição da água, e que nenhum Governo (a começar pelo constituído pelo bando de vigaristas que neste momento lá está) ceda à tentação de as privatizar.
JM
Em Portugal, duvido que a privatização total da água ou electricidade resolva alguma coisa relativamente às contas públicas.
Com a privatização e sendo o aumento de preços o mais provável, acredito que o povo poupasse em ambas e as empresas não teriam os lucros desejados ao final do ano. Aí, certamente que existiria uma cláusula de contrapartidas no contrato e no final o estado tinha de indemnizar as empresas pela perda de lucros esperados... Não é isso que está a acontecer com o Magalhães?
Se os preços se mantivessem, era sinal que o estado estaria a subsidiar as empresas.
Algum destes cenários vos parece irreal?
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