A imagem do sítio da plataforma, tirada do site da QUERCUS, bem demonstrativa da adequação do sítio à construção de armazéns
Nas apresentações que faço dou com frequência o exemplo da plataforma logística de Castanheira do Ribatejo como a decisão mais estúpida que conheço do ponto de vista do ordenamento do território: aterrar 100 ha dos melhores solos agrícolas do país em pleno leito de cheia do Tejo para construir armazéns é uma coisa que nem o texto delirante da wikipedia sobre o assunto consegue fazer-me compreender:
"A Plataforma Logística de Lisboa Norte é uma plataforma multimodal, que está a ser criada com o intuito de dar apoio à Área Metropolitana de Lisboa e porto de Lisboa. Esta plataforma é servida por uma rede de transportes rodoviários, ferroviários e marítimos e o seu objectivo é uma dinamização da economia nacional/regional, visto que interliga os fluxos logísticos internacionais, nacionais e regionais com a região de Lisboa e Vale do Tejo. Além disso, esta plataforma logística alarga o hinterland portuário, através da oferta de actividades logísticas complementares das portuárias (Portugal, 2006, p. 22). O área de influência desta plataforma estende-se a 3,2 milhões de pessoas e 45 por cento do PIB industrial nacional. A empresa construtora desta plataforma é a Abertis Logística. Segundo esta empresa serão criados 17 500 postos de trabalho, sendo cinco mil postos de emprego directos. Esta plataforma com um investimento de cerca de 370 milhões de euros, ocupa uma área de 100 ha entre a central termoeléctrica do Carregado e a nova estação de caminho-de-ferro de Castanheira do Ribatejo. Em 2011 são comercializados os primeiros armazéns e está a laborar totalmente em 2018 (Lopes, 2008).
A plataforma possui áreas logísticas diversas, tais como: multifunções/multicliente, monocliente, especializadas e de transformação. A plataforma envolve também um terminal intermodal marítimo e ferroviário; serviços de apoio a empresas e veículos; e áreas de negócio e comércio. Com a função de auxiliar a plataforma, a estação de caminho-de-ferro de castanheira do Ribatejo possui uma dupla função de mercadorias e passageiros, com a possibilidade de ser efectuada uma quadruplicação da via, tudo isto num território próximo da plataforma (Venda, 2007)."
A plataforma possui áreas logísticas diversas, tais como: multifunções/multicliente, monocliente, especializadas e de transformação. A plataforma envolve também um terminal intermodal marítimo e ferroviário; serviços de apoio a empresas e veículos; e áreas de negócio e comércio. Com a função de auxiliar a plataforma, a estação de caminho-de-ferro de castanheira do Ribatejo possui uma dupla função de mercadorias e passageiros, com a possibilidade de ser efectuada uma quadruplicação da via, tudo isto num território próximo da plataforma (Venda, 2007)."
Mas por estes dias a posição confortável desta plataforma no campeonato da idiotia em matéria de ordenamento do território parece estar seriamente ameaçada:
parece que vem aí a linha de TGV entre o Caia e o Poceirão.
Da sim, dia não, vou confirmando que a maior ameaça ambiental em Portugal é o endividamento.
henrique pereira dos santos
7 comentários:
Caro Henrique,
É óbvio que o local é bem escolhido para uma plataforma logística. Se assim não fosse o promotor não o tinha escolhido. Tu é que não aceites o sacrifício de 100 ha de terra agrícola para esse fim, o que é uma posição defensável. No entanto, a avaliação deste caso não pode dispensar os locais alternativos. E pergunto eu, se não fosse naquele lugar, onde é que havia de ser construída a plataforma logística? Ou será que nem era preciso uma plataforma?
Penso que a questão não se resume a 100 ha de (boa, ninguém duvida disso) terra agrícola. Antes de tudo deve ser questionado que falta é que a infraestrutura faz ao país. Mas também deve ser questionado o que de bem se fazia naquele pedaço de terra antes da plataforma. Produzir milho para rações da indústria pecuária? Veja os pivôs de rega na orto do sítio da Quercus...
Irás dizer que independentemente do que se produz lá agora, será perdido para sempre o destino agrícola daquele terreno. E tens razão; se calhar é o argumento mais forte contra a mudança funcional daquela terra.
Henk Feith
Henk,
Em lado nenhum eu digo que a localização da plataforma não é excelente para o promotor. Estou convencido de que sim, e uma das razões será comprar solo agrícola e vender solo urbano. Outras razões prendem-se com a quantidade de modos de acesso ao local.
Simplesmente o ordenamento do território pretende equilibrar os diferentes interesses que existem e competem pelo uso do território e num país como Portugal, com a escassez de solo agrícola e a abundância de solo não agrícola que existe, sacrificar um valor natural não renovável e escasso, como é o solo agrícola, em função de questões conjunturais (a hipotética existência de uma aeroporto, por exemplo) ou questões mais que duvidosas (com mais de dez plataformas logísticas, como pode esta servir 45% do PIB, por exemplo) é uma decisão estúpida do ponto de vista do ordenamento do território.
Que o promotor queira fazer ali percebo, que o autorizem é que me espanta.
PS A plataforma esteve prevista para outro sítio, mas o promotor disse que tinha de ser ali, e o Governo achou que mais valia um promotor na mão que outros valores a voar.
henrique pereira dos santos
Só para ilustrar que este não é um caso acidental ou isolado basta ver o caso em tudo idêntico da Plataforma Logística da Trofa no Vale do Coronado:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Plataforma_Log%C3%ADstica_da_Maia/Trofa
É de referir que os promotores desta obra recusaram repetidamente a implantação junto ao próximo parque industrial da Maia, ampliando-o e aproveitando todas as acessibilidades de que já dispõe. Foi escolhido o terreno RAN ali mais à frente precisamente por ser mais para o baratinho.
http://valedocoronado.blogspot.com/
Não venho aqui defender uma opção que desconheço de todo, nem em termos de alternativas ou de necessidades. Mas a minha pergunta é tudo menos retórica: o que é mais estúpido: subsidiar (quer dizer gastar o dinheiro dos contribuintes) a agricultura em dezenas de milhares de hectares do milho e produtos semelhantes, que alimentam uma indústria de carne ao preço de chuva, no bem tão precioso que são os solos da RAN ou permitir uma infraestrutura que dá emprego a centenas de pessoas no mesmo espaço em que havia com sorte uma pessoa a gastar subsídios para produzir milho. Afinal o que se faz de tão bem nesse solo agrícola? Contribui-se para um bem comum? cria-se riqueza? fomenta-se a biodiversidade?
A RAN, para ser defendida, precisa de evidenciar o seu valor para a sociedade e tenho dificuldade em vê-lo na agricultura atual. Mas admito ter as vistas curtas.
Henk Feith
Henk,
Há várias coisas no teu comentário que dariam discussões interminaveis, cada uma por si.
Vou tentar ser sucinto.
1) RAN e agricultura actual (ou mesmo política agrícola actual) são duas coisas com muito pouca relação. A agricultura actual trata da actividade diária de produção de alimentos e fibras (essencialmente), a RAN trata de manter potencial produtivo no futuro que desconhecemos;
2) A agricultura da Lezíria produz hoje bens (e serviços, mas vamos deixar de lado para não complicar). A plataforma promete produzir qualquer coisa no futuro que desconhecemos, mas ainda não produz nada (mesmo que crie emprego em aterrar solos agrícolas e leitos de cheia);
3) A promessa de produção de riqueza dos armazéns pressupõe que o business as usual se mantém, isto é, que o preço das energias fósseis se mantém eternamente baixo; a RAN pretende garantir que as flutuações de valor relativos dos produtos e serviços não destroem hoje um potencial produtivo que nos pode fazer falta amanhã.
4) Rigorosamente nada obriga a que a plataforma seja ali (ela aliás estava prevista nourto sítio), mas não é possível reproduzir as condições produtivas daquela situação noutro lado facilmente para as actividades relacionadas com a produção primária.
5) Isto nada tem com subsídios agrícolas, dos quais aliás discordo, mas ainda assim essa subsidiação é incomparavelmente mais pequena que a subsidiação que a sociedade faz ao promotor através da possibilidade que o Estado lhe deu de comprar terreno agrícola barato e vender como terreno urbano caro por mera decisão adminsitrativa.
henrique pereira dos santos
Caro Henrique,
Não gosto de discussões intermináveis, por isso vou tentar responder com a mesma contenção que tu:
1 - De acordo
2 - Discordo: esse argumento levava a um chumbo de qualquer projeto futuro. Isto é fomentar a Status Quo. o que te leva a duvidar a futura plataforma não cumprir a sua função?
3 - O que é que as energias fosseis têm a ver com isso? O que te permite concluir que futuramente os transportes continuam a base de energias fosseis? E achas provável, com a concentração das populações nos centros urbanos, que a logística do fornecimento dos bens deixa de ser baseada em transportes dos mesmos?
4 - De acordo.
5 - Incomparavelmente mais pequeno? 45% do orçamento da UE é destinado à agricultura! Sobre o promotor: desconheço por completo o negócio e admito que tem havido enriquecimento por reclassificação do solo. Mas isto é lateral à questão principal,que tem a ver com a função daquela terra.
Volto a dizer que não estou cá para defender o empreendimento. Questiono alguns dos pressupostos da sua rejeição, nomeadamente uma valorização absoluta da RAN, que para mim contrasta com a sua utilização agrícola, que não é questionada.
Henk
Henk,
2) Não é um argumento para chumbar ou aprovar, é apenas para responder ao teu argumento de comparação de produções. Limitei-me a constatar um facto: estás a comparar uma realidade com uma promessa de realidade. O que evidentemente não se deve fazer porque a segunda tem um grau de risco mais elevado (por exemplo, o da procura baixar significativamente).
3) Não sendo energias fósseis não sei o que seja (por enquanto não existem outras energias baratas). Claro que podes dizer que tens fé em que a energia será sempre barata, mas é uma profissão de fé. Parece-me muito provável que se a energia deixar de ser tão barata haverá uma reorganização económica.
5) Estou espantado com este teu argumento. O que interessa não é comparar a subsidiação global da agricultura com a mais valia urbanística daquele terreno, mas sim a subsidiação agrícola daquele terreno com a mais valia criada administrativamente, o que mesmo sem fazer nenhumas contas aponta para uma clara subsidiação bem maior através da captura da mais valia urbanística.
Não se trata de valorização absoluta da RAN, bem pelo contrário, trata-se de uma valorização relativa a um uso alternativo. Esse uso (e a função social que desempenha) poderia ser feito noutro lado, mas o potencial agrícola da área não pode ser substituído facilmente. Face ao conflito destes dois interesses públicos e à forma como foi resolvido que acho a decisão estúpida.
henrique pereira dos santos
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