quarta-feira, junho 23, 2010

Burrocracia


A vida ensinou-me, ao longo de 41 anos, a ter pouco respeito pela burocracia. Sei que as generalizações nunca são correctas e que a realidade é mais complexa. Se quiserem poderei dizer que tenho pouco respeito pela burrocracia. Com dois "r".

Os Estados, quando não sabem o que fazer, tendem a inventar normas que têm como único resultado entorpecer a vida aos cidadãos, consolidar uma casta de funcionários cuja sobrevivência depende da existência de uma burocracia complexa e favorecer a pequena (por vezes grande) corrupção.

Vem isto a propósito da indefensável decisão da FCT de dificultar o acesso de estudantes comunitários às bolsas de doutoramento. A nova norma obriga estes cidadãos a ter um certificado de residência. É uma norma estranha já que os cidadãos Europeus não são obrigados, por Lei, a ter um certificado de residência quando vivem noutro País da Europa. Mas a norma, como tantas outras, permite "furar" o sistema.

A partir de agora, um investigador de um centro Português que queira que um estudante estrangeiro concorra a uma bolsa de doutoramento terá de pedir, além do projecto científico da tese, que o estudante se desloque a Portugal para solicitar um certificado de residência. Como não reside, não tem morada e não ter morada impede a residência. A solução passará por alguém bem intencionado e com vontade de ajudar, mentir alegando que a pessoa reside na sua casa.

Em abono da verdade esta mentira é um acto de pequena corrupção. Actos de pequena corrupção como este são comuns quando a burocracia se transforma em burrocracia. Curiosamente, são actos que com o tempo se tornam oficiosos. Mas fazer depender o sucesso da investigação científica de expedientes como estes dificilmente se reconhece como boa política científica. O único resultado palpável é colocar os investigadores Portugueses em desvantagem na hora de recrutar os melhores cérebros para ajudar a desenvolver a ciência Portuguesa. Triste sina a deste País.

Alguém falou no SIMPLEX?.

2 comentários:

Anónimo disse...

"colocar os investigadores Portugueses em desvantagem"

Em desvantagem relativamente a quem?

Eu penso que a maior parte dos países nem sequer concede bolsas a estudantes de doutoramento estrangeiros. Portugal é mais uma exceção (positiva) do que a norma.

Mesmo em países onde bolsas são concedidas a estudantes estrangeiros, essas bolsas são raras relativamente ao número total de estudantes estrangeiros. A maior parte dos estudantes estrangeiros são financiados pelo seu próprio país, e não por bolsas do país recetor.

Com a evolução do sistema científico nacional, acho normal e desejável que o sistema de bolsas se vá aproximando daquilo que existe em países mais avançados, em que só se atribui bolsas a estudantes nacionais, não (a não ser em casos excecionais) a estrangeiros.

Luís Lavoura

Miguel B. Araujo disse...

Ao contrário de Espanha, ao contrário de França, ao contrário da Dinamarca, ao contrário, segundo julgo saber, da Alemanha, etc. Há países, como o Reino Unido, que têm medidas proteccionistas como as que a FCT agora criou mas o Reino Unido não é Portugal e não tem quaisquer problemas de atrair bons estudantes estrangeiros para a sua investigação mesmo sem lhes dar financiamento directo. O seu problema é retê-los depois de se formarem mas isso é outra conversa.