sábado, abril 30, 2011

Fogo e abandono agrícola



Na sequência do post abaixo do Henrique Pereira dos Santos, queria encaminhar todos os interessados para um texto que a Vânia Proença e eu próprio preparámos sobre a dinâmica do fogo no Mediterrâneo, num relatório sobre cenários para a biodiversidade. O problema que temos é que a recorrência de fogos curtos dificulta a evolução para florestas adultas após o abandono, como esquematizado acima. Podem consultar o relatório aqui. Para mais, é um processo que se reforça a si próprio - fogo favorece vegetação pirófita que facilita o fogo - e que tem por isso características de "tipping point", exigindo por isso especial atenção.

2 comentários:

Anónimo disse...

Caro Henrique

Nada a opor ao esquema genérico que apresentas. Contudo, "there's more than meets the eye" no que respeita ao fogo recorrente. Áreas que ardem frequentemente (usualmente por fogos pequenos, de origem silvopastoril) contribuem para reduzir a área ardida por incêndios de grandes dimensões. Um ciclo curto de fogo pode portanto proteger do fogo outras áreas e nelas favorecer a persistência/evolução florestal. Nada de surpreendente, afinal de contas é esta a lógica da prevenção "estrutural" de incêndios. Realmente surpreendente foi recentemente termos constatado que quase 90% da variação da dimensão dos grandes incêndios se explica através de variáveis que descrevem a pirodiversidade da paisagem, ou seja a sua "memória" dos fogos anteriores. Reduzida pirodiversidade equivale a grandes incêndios. Acresce que mais nenhuma variável, incluindo as condições meteorológicas associadas a cada incêndio, conseguiu explicar a variação residual na sua dimensão. Talvez isto explique a percepção (local, não minha) de que em Montalegre há cada vez mais fogo mas também cada vez mais carvalhal.

Paulo Fernandes

Henrique Miguel Pereira disse...

Caro Paulo,

Obrigado pelo teu comentário. Fazes uma observação bem pertinente: fogos recorrentes contribuem também para a redução da carga de combustível e evitam fogos maiores.
Mas se quisermos aumentar a área florestal incentivando a regeneração natural, os fogos recorrentes atrasam o processo.
O caso do aparente aumento em Montalegre de carvalhal deverá está relacionado com: (1) redução da pastorícia; (2) redução dos cortes para lenha e outros.
Ou seja, o abandono é um força motriz de tal forma intensa, que mesmo num contexto de fogos recorrentes podemos ter expansão de carvalhal.
Como sabes, a nossa paisagem silvo-pastoril do princípio do século XX seria essa: muita pressão de pastorícia, utilização de lenha, fogo qb. Consequência: inexistência de floresta, e erosão a rodos.
Isto não é para dizer que a pastorícia e o fogo controlado não têm um lugar hoje. Têm, especialmente se forem feitas de forma planeada e tendo em vista criar descontinuidades em áreas crescentes de floresta autóctone. Mas decerto concordas com isto

Henrique Miguel Pereira