segunda-feira, junho 20, 2011

Da fé


A discussão sobre caça e conservação é uma discussão difícil para quem resolva avaliar racionalmente a informação existente.

Nos meios conservacionistas a caça é considerada um elemento muito relevante na conservação das espécies. Depois há duas linhas de pensamento: os que acham que a caça deve ser banida (com argumentos filosóficos ou técnicos) e os que acham que a caça deve ser regulamentada de modo a evitar os problemas que causa e potenciar alguns aspectos positivos (de maneira geral incluem-se nestes os económicos, os mecanismos de gestão associados que podem ser usados positivamente para a conservação e os de relação com as populações).

Mas conservacionistas como eu, que atribuem pouca relevância à caça na dinâmica das espécies (com as excepções e ressalvas que já fiz antes), somos de facto poucos e com uma vida difícil nestas discussões.

O curioso é que a teoria evolucionista aponta exactamente no mesmo sentido que eu (é a inversa, evidentemente, eu é que aponto no sentido da teoria): os grandes riscos que correm os genes no seu objectivo de reprodução vêm dos organismos patogénicos e dos companheiros que competem por reprodução, abrigo e alimentação. Não vêem dos predadores.

O que os conservacionistas fazem para sustentar ao mesmo tempo o evolucionismo e o que dizem sobre a caça é eleger a espécie humana como uma espécie fora do jogo da sobrevivência e da evolução, postulando, sem demonstração, que as regras gerais que se aplicam às dinâmicas das outras espécies não se aplicam a nós. Ou seja, a caça não é uma actividade de predação, é uma coisa muito mais eficaz e letal porque temos instrumentos de transformação do mundo muito mais poderosos.

Ora o que é poderoso em nós é a capacidade do mudar o mundo para o tornar mais favorável para a nossa espécie, não é a nossa capacidade de sermos supercaçadores.

Vejamos os casos concretos referidos pelo Alexandre Vaz nos comentários ao post anterior (o Alexandre, que nunca responde aos meus argumentos, limitando-se a ir buscar argumentos novos de cada vez que os anteriores são rebatidos, acha que eu quero simplesmente ganhar um combate retórico. Eu, que analiso cada um dos argumentos do Alexandre, que vou ler sobre as espécies de que fala, que vou estudar os assuntos para poder argumentar com coisas concretas, acho que o Alexandre não sabe o que é retórica).

Pinguinus impennis. Volto a notar que esta espécie cai integralmente numa das excepções em que admito que a caça possa ser relevante: a dependência da espécie de ilhas e ilhéus. Mas o Alexandre resolve omitir um aspecto que está à distância de um clik: os marinheiros que começaram a explorar as zonas onde estes pinguins existiam, introduziram nestas ilhas os ratos, que como se sabe podem ter um efeito devastador em posturas que não co-evoluíram tendo de defender-se dessa ameaça. O artigo da wikipedia discute também o eventual efeito de alterações climáticas na conservação da espécie. A última colónia islandesa desapareceu submersa por uma erupção vulcânica. É por essas e por outras que o resumo de um dos livros citados nas referências é o seguinte: "But as Gaskell shows, the extinction of the Great Auk was not a straightforward tale of overhunting. In this subtle, nuanced book, he reveals the ways in which its fate was inextricably bound up with the social, economic, and political history of the time. ". Exactamente o essencial do meu argumento. Volto a repetir, nas condições desta espécie, isto é, estritamente dependente de ilhas, a caça pode desempenhar um papel mais relevante que o habitual na dinâmica da espécie, mas essa é a excepção, não a regra. A página 18 desse livro, disponibilizada na net, é notável na descrição da catástrofe ecológica (e económica) associada a erupções de vulcões em 1783 (bem como dos efeitos da guerra entre franceses e ingleses, na página anterior). A introdução é aliás notável, como apoio ao meu argumento: "over the centuries so many creatures have suffered progressive decimation of their numbers through incessant slaughter that we are apt to forget that, as a rule, it is difficult to drive animals and birds to extinction by that means alone: in the great majority of cases the loss or degration of natural habitat is the primary cause of a species' desappearance from the face of the earth".

Vou passar por cima da Cabra do Gerês porque é um absurdo completo pretender que a cabra do gerês foi extinta por causa da caça e não pelas alterações de habitat que se acentuam a partir do século XVIII e que levam à extinção do urso e à redução acentuada de todas as espécies mais dependentes da mata e menos dependente da clareira. A cabra do gerês simplesmente foi substituída pela pressão do pastoreio.

Todos os ungulados citados nos comentários do Alexandre, quer sejam no Sahel ou na África do Sul, em condições ecológicas aliás idênticas (e que dependem da circulação geral da atmosfera) têm a mesma dinâmica populacional que pode ser entrevista nesta síntese: " few causes that contributed to the extinction of scimitar-horned oryx in the wild include climate change, human encroachment on their habitat for agriculture, hunting, and excessive domestic livestock grazing on limited vegetation."

Uma mera volta pela internet permite perceber que os problemas associados à conservação dos ungulados das zonas áridas estão muito longe de se restringir, ou mesmo de ter como primário, o problema da caça. A caça, comparada com o aumento do pastoreio nessas áreas, é uma brincadeira de crianças para a conservação destes ungulados.

Ora em lado nenhum se diz, como se diz da caça, que o habitat destas espécies foi pastoreado até à extinção das espécies.

Para quem quiser deixar destes jogos florais e perceber o que realmente se passa o melhor mesmo é dar uma vista de olhos aqui.

Mais uma vez lá aparece a caça como responsável: "The main threats identified were still as follows: poaching, constant hunting, drought and desertification, the loss of favourable habitats, a lack of resources and commitment, and some indifference on the part of the international community in regard to a region that does not hold a high concentration of the world’s biodiversity." Mas lendo este parágrafo, alguém no seu perfeito juízo, e sabendo como estas declarações oficiais são negociadas para não ferir susceptibilidades políticas, compreende que na "perda de habitat favorável" não esteja implicada a forma como essas paisagens são geridas pela economia, em especial o pastoreio? O que provoca essa perda de habitat favorável? A seca? Pois em parte será. A desertificação? Pois é uma consequência da seca com certeza, pelo menos parcialmente. Mais nada? A forma como se gere a economia da região não tem nada que ver com esta perda de habitat?

Talvez ao olhar para documentos menos comprometidos politicamente se faça alguma luz sobre o assunto.


...

Grassland in semi-arid regions has been desertified under excessive human pressure. The 1977 UN Conference on Desertification indicated that, in general, 6% of the world’s area is ‘man-made desert’, and 25% is threatened by desertification. The annual degradation of land to ‘desert-like’ conditions is estimated by UNEP (1992) as 60,000 km2. Mackinon & Mackinon (1986) indicate that 65% of the original ecosystems south of the Sahara have been subject to major ecological disturbance.

...

"Dregne & Chou (1992) estimate that 70% of the land (921 million ha) in the Arab countries, is moderately desertified. Of the rangelands, which represent 42% of the total area, 330 million ha are either severely or very severely desertified, and 150 million ha are moderately desertified. The overall proportion of desertification is more than 80% of these rangelands, while in the rain-fed agricultural land, it is 67%, and in irrigated agricultural land, 34%. These high percentages of desertification give an impression of the severe deterioration of biodiversity in the arid regions of the Arab countries, and the extinction of many plant and animal species. But, little information is available on the relationship between the degradation of these drylands and loss of biodiversity. How- ever, it is well known that many species found in deserts are highly endangered: desert tortoises, Asian and African wild asses, sundry species of cactus, and a variety of antelopes such as the addax, scimitar-horned oryx and the Arabian oryx, to name some of the better-known endangered taxa (Hunter, 1996)."

Perante descrições como esta há quem se entretenha a falar de caça.

Eu acho uma conversa chilra.

A conservação não é uma questão de fé e moral, é uma chatice económica que começa nos nossos consumos.

henrique pereira dos santos

29 comentários:

Anónimo disse...

Só quero acrescentar que não tenho nada contra a caça como forma de subsistência. Não posso é aceitar argumentos do tipo: se não houvesse touradas, não havia gado bravo...

Alexandre Vaz

P.S. Se alguém quiseres conversar sobre retórica tenho todo o gosto.

Henrique Pereira dos Santos disse...

Já argumentos é que é coisa mais complicada.
Dá um trabalhão, tira imenso tempo e ainda corremos o risco da realidade nos demonstrar que estamos errados.
Aceitar ou não aceitar sem perguntar porquê ou para quê é mais simples, prático e dá milhões.
henrique pereira dos santos

Anónimo disse...

Caro Alexandre Vaz:

- Estou como o Henrique e não se ofenda nem leve a mal que o meu objectivo não é esse, mas de facto você enferma do mal que é o de, creio eu, não estar habituado a discutir esgrimindo argumentos, mas sobretudo a conversar com quem pensa como você, logo o que fazem é acrescentar argumentos sobre argumentos... talvez porque não tenha normalmente quem advogue opiniões contrárias de forma esclarecida e sustentada. É além disso bem claro que da sua parte existe preconceito e falta de capacidade de aceitar outras idéias, ainda e sempre porque talvez não esteja habituado a ver as suas, rebatidas... um exemplo disso é a sua afirmação de que não pode aceitar o argumento de que sem toiradas não havia gado bravo!
E não pode aceitar porquê? porque a recusa liminarmente e nem sequer lhe passa pela cabeça que a sua idéia não seja a única e a verdade!
O que é mau, e limitador, quer em termos de construcção de idéias ou na evolução... sabe bem o quanto custou à humanidade essa sua forma de pensar, que foi também a do Santo Ofício? E de alguns regimes políticos totalitários...
Repare, hoje mais do que nunca o lado economicista impera! O toiro bravo só tem interesse económico enquanto ouver toiradas, porque é um animal de maneio problemático que precisa de espaço e tem muitas condicionantes, além de ser pouco precoce... logo, se acabarem as toiradas, os ganaderos vão acabar com a sua criação... ficarão apenas alguns em zoológicos? É isso que você não quer sequer discutir? Acha que haverá alguma organização dos amigos dos animais que vá comprar herdades para manter os toiros bravos? Não creio...
Perdoe esta minha longa diatribe, mas é o que penso e tenho para lhe dizer... acho que deve abrir a sua mente à discussão e analisar os argumentos contrários, tentar perceber e depois contrapor, o que vai ter dois resultados:
- Um é o reforçar das suas opiniões, e outra, alcançar a compreensão e quem sabe se a verdade... lá se diz:
- Da discussão nasce a luz!
E creia que do lado dos caçadores e aficionados, há gente capaz de argmentar e que sabem do que falam, porque pensam assim e praticam as coisas que você recusa. Que o compreendem a si e até aceitam as suas opiniões, não podendo, isso não, aceitar a sua imposição e a obliteração daquilo em que acreditam ou fazem, coisas que são legítimas!
Lembre-se disto:
1 - Contar sempre com a inteligência dos outros!
2 - Você luta para impôr as suas idéias, eu luto para ter direito a ter as minhas...

Cumprimentos e renovo a minha intenção de introduzir uma discussão séria e não de ofender sensibilidades nem a ninguém!

António Luiz Pacheco

Anónimo disse...

Caro Henrique P. dos Santos

Uma vez mais as suas opiniões são esclarecidas e cheias de sensatez, porque você em primeiro lugar preocupa-se em perceber e em segundo não tem prúridos em aceitar as evidências como em renegar a falta delas! Infelizmente nestas discussões há muito mais de filosófico do que de científico... sim!
A caça tem de ser percebida como o que é: actividade cinegética!
- A caça de subsistência, praticada ainda hoje por povos que dela dependem para sua sobrevivência, tem de ser vista como aquilo que é, pois sempre se fez e não foi nem é agressiva, é recolecção! Quem viva num apartamento climatizado com o frigirífico bem abastecido, um ordenado fixo e o supermercado perto, não pode nem devia tentar fazer legislar para os esquimós ou bosquímanos... é uma falta de entendimento, de honestidade e sobretudo uma cruel falta de entender as coisas e condenar povos inteiros! Prova de um egoísmo feroz e cego.
- Finalmente e como muito bem o Henrique vem diferenciando, o abate por vezes industrial e sistemático de animais, sejam os pinguins pelas penas, os bisontes pela carne e peles, os castores pela pele, as baleias pelos subprodutos oleicos! Ou o abate de elefantes e rinos pelo marfim e o "chifre", do tigre para medicina, não pode ser confundida com caça!
Não tem nada a ver, como não tem a ver com caça a extinção de outros animais que concorriam e concorrem com o pastoreio ou uso agrícola, como se fez no Quénia em que se abateram milhares de búfalos para extinguir a tsé-tsé e libertar espaço dos elefantes e rinos para a pecuária!
A história está cheia de exemplos destes, em que animais são extintos pelo homem e as suas realizações em prol da economia, seja pelo abate directo ou indirecto, como pelas doenças introduzidas ou pelas alterações à paisagem! E não pela "caça" na sua acepção.
Aliás tem sido a actividade cinegética quem permite manter e recuperar muitas populações, sobretudo pelas verbas que disponibiliza e gera! Porque a boa vontade não chega...

Gostei de vir aqui, espero não ter ofendido ninguém, se bem que preveja a natural contestação e se calhar alguma reacção preconceituosa a que de resto estou habituado e vivo em com ela.

Cumprimentos a todos!

António Luiz Pacheco

Anónimo disse...

Henrique, pela primeira vez estamos de acordo nessa coisa do "trabalhão e do tempo"... É claro que eu te podia responder ponto por ponto, e admito até em alguns casos reconhecer que tens razão e que a minha opinião podia ter sido em alguns casos mal fundamentada, mas no final, teria tido um enorme "trabalhão" e teria "perdido imenso tempo" e no essencial eu continuaria a achar a mesma coisa e tu também... Como não vejo estas trocas de mensagens como uma metáfora dos tempos modernos na qual afirmo a minha virilidade, nem me fazem sentir a adrenalina percorrer-me as veias, nem me elevam o ego, não vale a pena...
Ao contrário do que possas pensar, não sou fundamentalista anti-caça (nem anti-eucaliptos, nem anti coisa nenhuma). Tentei nos breves comentários que fiz recentemente apenas ilustrar que a extinção de algumas espécies era por muitos autores associada a actividades cinegéticas. No entanto, como eu próprio ressalvei, há sempre outros factores que concorrem para o problema. Se te agarrares sempre a esses factores para ilibar o impacto da caça a discussão não vai a lado nenhum já que é impossível determinar com exactidão qual o real contributo da caça. O mesmo se quiseres também se aplica em sentido contrário. O caso do Aix sponsa que é muitas vezes dado como uma recuperação que contou com o contributo decisivo dos caçadores não se pode determinar qual a real dimensão do seu contributo.
Depois há a questão ética, de que já falamos aqui em tempos, e que como sabemos nos coloca em universos tão distantes que a discussão jamais poderá ser profícua.
Em conclusão:
1- Considero que a caça foi em muitas situações responsável pelo acentuado decréscimo ou mesmo extinção de populações de animais selvagens.
2- Reconheço que há casos em que a actividade cinegética promove a conservação de espécies e habitats embora não me pareça que os fins justifiquem os meios.

António, não me leve a mal, mas não consegui sequer ler o seu texto até ao fim uma vez que não lhe reconheço autoridade moral para tecer considerações generalizadoras sobre a forma como costumo discutir.

Henrique Pereira dos Santos disse...

Alexandre,
Pelos vistos a discussão é mesmo impossível.
Estou há três posts a tentar explicar que o meu ponto de vista é o de que a caça é pouco importante na dinâmica das espécies (seja no sentido positivo ou negativo).
Que há muitos autores que atribuem peso à caça nessa dinâmica é exactamente o que eu contesto com os argumentos que uso (e cito aliás os mesmos autores, que de maneira geral acabam por concluir que com ou sem caça as alterações de paisagem são de magnitude tal que a espécie seria profundamente afectada na mesma).
Se nem sequer consegues perceber que é este o meu argumento e não o argumento clássico de que a caça pode ser positiva para a conservação (sim, pode, muito limitadamente e na medida em que pode ser uma actividade económica que faça a gestão da paisagem) não me parece que haja nada a dizer.
Aliás limitas as tuas intervenções a reafirmar coisas que nunca fundamentas.
É pena. Assim não se progride.
henrique pereira dos santos

Lowlander disse...

E a pesca? Sera a filha bastarda da caca (com cedilha) ?

Anónimo disse...

O Alexandre não me reconhece autoridade moral... por isso nem lê nem responde! E assim encerra uma hipotética discussão, porque o decidiu ele, na sua posição que de tão elevada e esclarecida é mais do que única, incontestável...
E eu, que me reduza à minha insignificância... moral e em tudo o mais. Tem sido assim que se comportam ditadores e outros do género, ainda que na forma tentada.
De facto com quem pense e se comporte deste modo é impossível conversar: só se ouvem a si mesmo, nem reconhecem a ninguém qualquer direito de os poder contradizer ou questionar.

António Luiz Pacheco

Henrique Pereira dos Santos disse...

A pesca de águas interiores penso que ainda se poderá pensar que tenha algumas parecenças com a caça, embora a maioria das águas interiores funcionem como as ilhas funcionam para a caça, sendo por isso mais fácil que a pesca afecte a dinâmica de algumas espécies.
A pesca intensiva de alto mar penso que tem efeitos importantes na dinâmica das espécies, embora eu perceba pouco disso.
Do que sei, reconhecidamente pouco, a distribuição das espécies e populações no mar não tem as mesmas características que a distribuição das espécies e populações em terra, em especial porque as transições de condições ambientais, são muito mais graduais no mar que em terra.
Como associado a isso a pesca intensiva é uma pesca em massa que cada vez mais facilmente detecta as grandes aglomerações de indivíduos o seu efeito deve ser muito mais importante.
Por outro lado os efeitos de gestão positiva que se poderão querer alcançar em terra, gerindo peisagens com objectivos de criar biodiversidade, não me parece que possam ser obtidos no mar (damos agora alguns passos com recifes artificiais e coisas do tipo, mas estamos longe dos milhares de anos de experiência na manipulação dos sistemas terrestres.
Mas repito, percebo pouco do assunto.
henrique pereira dos santos

Anónimo disse...

Caro ALPacheco,
À sua argumentação, educada e fundamentada, respondeu o Alexandre Vaz com uma fuga a lembrar uma virgem ocupadíssima, que apesar de violada não tem tempo para exigir a reposição do hímen.
Lamento tê-lo desafiado...
jaime

Lowlander disse...

"Mas repito, percebo pouco do assunto."

Pois... lapidar.
Mas nao ha prob nenhum, se esta declarado que caca (com cedilha) e factor negligenciavel nao deixemos que a realidade que se processa no habitat que cobre 70% da superficie terrestre nos perturbe.

Anónimo disse...

Henrique, há estudos muito interessantes sobre dinâmica populacional de por exemplos espécies de tordos migradores e dos impactos da caça nessas populações. Eu não domino a matéria, e pelas razões que atrás já disse não as vou estudar apenas para te tentar convencer de que estás enganado. É verdade que em populações saudáveis a maioria das espécies se adapta à pressão predatória, mas também estão documentados casos em que essa pressão ultrapassa a plasticidade da espécie. Se estás interessado no assunto sugiro também que olhes para o caso da ilha de Malta que é normalmente apontado como um caso extremo de pressão cinegética.

No teu texto sobre o leão dizias: "Estou convencido de que para a grande maioria das espécies selvagens, e sobretudo para os predadores de topo ou os grandes herbívoros, o caçador, por mais exímio que seja, é muito menos perigoso que o amante da natureza, por mais bem intencionado que seja, que se senta no seu sofá a ver documentários sobre vida selvagem comendo uns snacks que sustentam o alargamento das áreas agrícolas e bebendo uns sumos naturais que aprofundam a transformação das paisagens africanas."

Não leves a mal, mas isto para mim é um exemplo acabado de desonestidade intelectual. O que dizes faz pensar que são apenas os amantes da natureza que comem snacks e bebem sumos de frutas (porque os caçadores só comem azeitonas e vinho nacional?).
É por isto que não podemos discutir.

Alexandre Vaz

Henrique Pereira dos Santos disse...

Lowlander,
Não percebo o seu comentário. Para além de chatear o que pretende? Se o que quer dizer é que a sobrepesca é um problema sério diga-o sem problema, escusa de usar um paralelismo arrevesado, que ninguém fez, entre caça e pesca.
Eu fiz uns posts sobre caça, o primeiro um comentário ao Filipe Nunes Vicente, os outros procurando responder a argumentos do Alexandre Vaz, porque tenho ideias sobre o assunto (certas ou erradas é o que se discute).
O lowlander resolveu colocar uma questão sobre pesca a que procurei responder seriamente e dizendo que me parece que não há paralelismo nenhum, mas sou leigo no assunto.
O lowlander conclui com um comentário qualquer que não percebo, excepto que pretende criticar o facto de eu falar de caça e paisagens terrestres, de que percebo alguma coisa, em vez de falar de pescas e ambientes marinhos, de que percebo pouco.
O almoço caiu-lhe mal? Zangou-se com as pessoas que estão à sua volta? Ou é mesmo vontade de chatear como se depreende do comentário ao outro post?
henrique pereira dos santos

Henrique Pereira dos Santos disse...

Alexandre,
Peço desculpa mas acho que precisas de umas aulas de interpretação de textos. Onde é que eu disse que só os amantes da natureza é que comem snacks e bebem sumos de fruta?
Só com muita, mas mesmo muita má vontade se consegue interpretar assim uma alegoria perfeitamente clara: os consumos (de todos) têm muito mais importância na conservação das espécies que as interacções directas (como por exemplo, a caça).
henrique pereira dos santos

Henrique Pereira dos Santos disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Lowlander disse...

Pronto! Sou um chato! A pesca nao e uma forma de caca (com cedilha) e quem aponta para a falta de logica desta assercao e obviamente um chato, com indigestao e (claro!)poucos amigos.

"A discussão sobre caça e conservação é uma discussão difícil para quem resolva avaliar racionalmente a informação existente."

A ironia da coisa e verdadeiramente deslumbrante.
Mas prossiga la a sua avaliacao racional da informacao existente (n.b. excluindo Oceanos).
E fascinante!

Henrique Pereira dos Santos disse...

Se fosse mais claro e directo, dizendo que o que eu dizia só pode ser válido se se considerar que a pesca não é uma forma de caça eu teria simplesmente concordado consigo e estava o assunto arrumado.
Tem razão, os meus argumentos só podem estar certos se se excluir a pesca do conceito de caça, e sim, tem razão, é defensável incluir a pesca no conceito de caça.
Eu diria que no português comum caça e pesca são coisas diferentes, sendo que apenas na pesca submarina eles se confunfem, designando-se a actividade quer por pesca, quer por caça.
Estamos esclarecidos ou é precisa mais alguma clarificação do contexto em que usei o termo caça?
henrique pereira dos santos

Anónimo disse...

Se me permitem uma achega:

Caça é a apreensão de animais...
Pesca a apreensão de peixes...
Creio que a pesca pode de facto ser considerada como caça, falando na generalidade.

A pesca industrial está para a pesca dita lúdica ou desportiva como os abates estão para a caça.

Tal como há caça de subsistência existe pesca de subsistência, e repito que julgo que estas devem ser deixadas em paz! Há povos que as praticam ainda, e creio que todos nós, sejamos caçadores ou não caçadores, devemos respeitar e pugnar que assim se mantenham, sinal de saúde dessas sociedades e do ambiente natural que os envolve.
São o último elo com a Natureza e liberdade, um testemunho de ancestralidade. Curiosamente são os governos mais atrasados social, económica e políticamente quem mais tenta acabar com esses últimos redutos da humanidade... veja-se o que se tem feito aos bosquímanos por exemplo! É um crime de lesa humanidade!

A caça, a caça desportiva ou moderna, ou como lhe queiram chamar, tem pois o seu próprio enquadramento na actualidade e é sem dúvida uma ferramenta na conservação, o que por exemplo já é admitido pela UE, o que ainda há 5 anos não acontecia, mas hoje a UE comsidera que as actividades cinegéticas são fundamentais para a manutenção da biodiversidade, dos habitats e das populações. Muitos cientistas, académicos, investigadores o aceitam, e foram sobretudo eles quem o concluiu afinal.

Existe um plano, Wildlife Estate, apoiado pela UE e que é uma iniciativa conjunta da FACE e da Comissão da UE que visa aproveitar as cinergias da caça na conservação e fazer ambas beneficiarem dessa dinâmica.

Afinal... onde haja caça, e, o interesse seja que continue a haver, talvez seja mais difícil entrar o betão! Espero bem...

Cumprimentos a todos e perdoem meter-me na conversa!

António Luiz Pacheco

Henrique Pereira dos Santos disse...

António Luis, não me diga que da próxima vez que for ao galinheiro apanhar uma galinha tenho de ir tirar uma licença de caça.
Claro que estou simplesmente a usar uma ironia para mostrar que o cenceito de caça não é simplesmente o de apanhar animais (há muito pouco quem considere caça o abate indiscriminado de animais, que é o que é feito na pesca há milhares de anos, pelo menos desde que inventaram as redes).
Mas o essencial é que quero fugir da discussão bizantina sobre se a pesca é caça ou não. O que quero é deixar claro que o conceito de caça que usei não inclui a pesca (e acho muito pouco útil incluir porque os métodos de captura e de gestão são substancialmente diferentes, e a continuidade de ambientes também).
henrique pereira dos santos

Anónimo disse...

"Só com muita, mas mesmo muita má vontade se consegue interpretar assim uma alegoria perfeitamente clara: os consumos (de todos) têm muito mais importância na conservação das espécies que as interacções directas (como por exemplo, a caça)."

Esse é o argumento de quem se mete no carro todos os dias para ir para o trabalho: "a poluição dos aviões e das fábricas é tanta que não é o meu carro que vai fazer diferença"...
É verdade que a destruição de habitat, poluição, introdução de espécies exóticas ou as alterações climáticas têm muito maior impacto nos ecossistemas do que a caça, o atropelamento de animais ou a colisão com linhas eléctricas. Nisso estamos de acordo. O que não significa que os impactos destas últimas não sejam significativos e merecedores de atenção ou reflexão...

Alexandre Vaz

P.S. Essa atitude insultuosa e arrogante ("acho que precisas de umas aulas de interpretação de textos")é um pouco aborrecida e também não encoraja muito o debate que alegadamente gostavas de manter num patamar de elevação e objectividade.

Anónimo disse...

Henrique: percebo-o e sei que me percebeu... e agradeço o seu ponto de ordem.

Claro que quando se fala de apreensão de animais, as galinhas de capoeira estão fora do contexto
como a pesca está fora (para já!) do contexto desta conversa.

Bem haja pela sua esclarecida não-caça!Se bem que goste de galinhas!

Acho que todos, caçadores e não-caçadores teríamos muito a prender consigo!

António Luiz Pacheco

Henrique Pereira dos Santos disse...

Alexandre,
Fico satisfeito que ao longo desta discussão tenhamos partido de posições tão divergentes (tu atribuindo a responsabilidade de extinção de uma série de espécies à caça, eu dizendo que a caça é pouco relevante na dinâmica das espécies) para chegarmos a posições muito mais próximas (os dois a dizermos que há outros factores muito mais relevantes na dinâmica das espécies, embora mantenhamos divergências sobre o papel da caça como elemento complementar nessa dinâmica).
henrique pereira dos santos

Nuno disse...

Estando convencido do potencial da caça como um dos meios de apoio à conservação e economia de meios rurais é óbvio que existem situações em que gera danos, como tantas outras actividades humanas com influência ambivalente na paisagem.

Se calhar é mais fácil convencer cépticos em relação a este potencial relevando os exemplos positivos em que a caça tem um papel importante na conservação, mas por ignorância não estou certo de que exemplos deste tipo existirão em Portugal.

Henrique Pereira dos Santos disse...

O óbvio é uma coisa muito traiçoeira. Não acho nada óbvio e é por isso que acho que vale a pena discutir com fundamentos concretos em vez de partir do princípio de que as coisas são óbvias. Também é óbvio que sol roda à volta da terra e nem por isso a ideia é verdadeira.
henrique pereira dos santos

Anónimo disse...

Não sou grande apoiante da caça pois serve apenas de diversão e negocio, sem necessidade alguma.
Mas apoio claramente caso seja para diminuir um número de individuos em caso de praga ou eleminar espécies não autocnes ( caso não dê para entrega-las ao seu habitat natural)

Henrique Pereira dos Santos disse...

Caro anónimo, suponho que também é contra a televisão que também só serve para entretar e negócio.
Mas não foi este aspecto que me fez comentar: pelas mesmas razões que me fazem dizer que a caça não é muito importante na dinâmica das espécies, também diria que é muito pouco importante como controlador de pragas (algumas delas introduzidas ou difundidas por uma actividade cinegética mal orientada tecnicamente).
henrique pereira dos santos

Anónimo disse...

Henrique, penso que a razão porque a caça recebe maior atenção e é tida como maior relevância do que os outros factores que contribuem para a extirpação local ou extinção global de espécies se deve a ser vista como uma actividade facultativa.
O argumento é um pouco: os animais aguentam a perda de habitat, a introdução de novas espécies, a fragmentação, mas a caça é o 'coup de grace' que as leva à extinção.
Se calhar como factor é capaz de ser o que mais facilmente se pode pensar que se consegue controlar, ao mesmo tempo que pode levar uma pessoa interessada a querer agir. A questão da perda de habitat tem dificuldade em conseguir adeptos ou de mudança de uso dos solos. As alterações na paisagem são vistas como dado adquirido, impossíveis de contrariar.
Vê por exemplo a questão da seca no 'corno' de Àfrica. Esta seca é dada como a única causa para a nova vaga de fome que ali mata aos milhares. Nunca a sobrepopulação. A população é um enorme taboo em várias questões e a conservação da natureza é uma delas. A caça tornou-se no 'bode expiatório' de certa forma.
Por curiosidade, e para alimentar o debate, ia usar o exemplo da Steller's Sea Cow, uma grande vaca marinha que foi extinta em menos de 30 anos depois de ser descrita para a ciência. A caça foi, sem dúvida, o golpe de misericórdia para a espécie. Mas depois percebe-se que a diminuição da população já vinha de há mais tempo, que razões directas e indirectas tinham levado à existência de apenas uma última população numa ilha onde a população nativa nunca tinha chegado. Ou seja, é mais um exemplo que acaba por dar fundamento à tua análise sobre esta questão.
Mas se calhar a caça é um dos poucos contribuintes para a extinção que as pessoas sentem que podem mudar, daí ser dada tanta relevância.
A questão é se isto é ou não verdade, se a caça é das poucas coisas que se pode conseguir controlar?

Rui Pedro Lérias

Henrique Pereira dos Santos disse...

Rui Pedro,
Ora aí está um bom tema de debate para a Loja, quando quiseres.
A questão de fundo é que controlar a caça não resolve um único dos outros problemas e, se como parece, eles são a causa, o resultado vai ser o mesmo com caça ou sem caça.
Ao equacionar mal um problema só a sorte nos pode valer para encontrar a solução certa.
henrique

Anónimo disse...

Henrique, seria de facto um debate muito interessante aqui para a loja (exactamente o que pensei um pouco depois de escrever o meu comentário). Vou equacionar isso.

Rui Pedro Lérias