sábado, julho 15, 2006

A previsão, mais uma vez

Tenho na minha cabeça um modelo interpretativo do problema dos fogos que tem em conta factores estruturais do mundo rural e a sua relação com condições meteorológicas específicas.

Depois de muitas discussões sobre o assunto com muitos especialistas (e não escrevo uma linha certificada cientificamente sobre o assunto por não ter competência para tal) resolvi que a única maneira, disponível para mim, de procurar demonstrar que o meu modelo é uma boa aproximação à realidade era testá-lo, prevendo o que vai acontecendo com um, ou dois dias de antecedência, pelo menos. Amaneira alternativa seria ir olhar o histórico dos fogos dos dias terríveis (a tal dúzia de dias no ano em que ardem dois terços de todo o ano) e das condições meteorológicas nesses dias, para o que me falta tempo e acesso aos dados históricos do boletim meteorológico.

Paulo Fernandes ou Henk Feith, e bem, já disseram que são previsões temerárias as minhas. Eu concordo. Mas decidi correr publicamente esse risco neste blog, em vez de ficar na confortável posição de vir amanhã explicar por que razão a minha previsão de ontem afinal não se verificou hoje.

E ontem ao fim da tarde referi que apesar das altas temperaturas e baixos teores de humidade não me parecia que viesse aí alguma tempestade incediária.

Mas hoje, ao ler o jornal, fui confrontado com uma previsão de mudança de rumo do vento, que embora fraco, passa a soprar de Leste, Sueste ou Nordeste (confesso que a previsão não era muito clara para mim).

Coerentemente venho também matizar a minha previsão: não sei o grau de humidade da vegetação que ainda perdura depois da semana de chuva do meio de Junho, mas se realmente se verificar a mudança de rumo anunciada para hoje e amanhã, provavelmente o padrão de muitos fogos extintos em poucas horas que tem sido o dos últimos dias será mudado para um padrão de muitos fogos (provavelmente mais) com alguns deles a durar mais de vinte e quatro horas, apesar do vento fraco. Nas zonas em que o vento soprar moderado, a situação será mais crítica.

Qualquer um poderá verificar se o modelo que tenho na cabeça se aproxima ou não da realidade: basta confrontar o que se passar nestes dois dias com o que escrevi quer ontem quer hoje.

Se falhar, lá arranjarei uma explicação (como o grau de humidade da vegetação, que é de facto para mim um factor de incerteza significativo). Mas estou convencido de que não será preciso explicar.

henrique pereira dos santos

2 comentários:

Henrique Pereira dos Santos disse...

Não se verificou a previsão do vento Leste. Manteve-se o padrão de muitos fogos (todos os dias mais), mas com extinções relativamente ráidas e sem grandes dramas.

Esperemos que se mantenha assim.

henrique pereira dos santos

Henrique Pereira dos Santos disse...

Caro Luís Matos,

A prova real de um modelo é a sua capacidade de antecipar a realidade.

É isso que estou a fazer, de um modo que pode ser verificado por qualquer pessoa.

Qual é o objectivo? Primeiro, comprender bem um sistema complexo, depois actuar sobre ele.

Se o meu modelo tiver alguma consistência (em rigor ele não é meu, limito-me a talvez ser mais insistente em alguns pontos do conhecimento generalizado que vai sendo produzido sobre a questão) algumas conclusões se podem tirar.

E a primeira delas é a de que afinal a situação dos fogos em Portugal não decorre da essencialmente incompetência do planeamento e prevenção dos fogos ou da má gestão da floresta, mas da evolução do nosso mundo rural, que em grande parte é formatado pelas políticas agrícolas. E mais, que não há recursos, nem nunca haverá, para prevenir os fogos na dúzia de dias em que arde 80% da área de cada ano, se não se actuar na gestão de combustíveis a montante. Gestão essa de combustíveis que não pode ser paga pela exploração florestal em 50% do território, por falta de viabilidade económica.

Isto é, o principal responsável político a quem nos devemos dirigir não é o Ministro da Administração Interna, mas ao Ministro da Agricultura (os actuais ou quaisquer outros que ocupem essas pastas). E dirigirmo-nos ao Ministro da Agricultura, não porque tutela as florestas, mas porque tutela os instrumentos de intervenção no mundo rural.

E é aí que entronca a minha guerra pelo reconhecimento da utilidade dos pequenos ruminantes no controlo dos combustíveis, ou a da necessidade de pagar convenientemente o uso de matos na estrumação das terras, ou mesmo a minha oposição total e completa em relação a uma política agrícola que pretende usar os dinheiros comunitários sobretudo para estruturar as fileiras que são competitivas no mercado (vinho, azeite, horto-frutícolas), e que devem sobretudo gerir-se com os instrumentos do mercado, em vez de pagar os serviços ambientais prestados pelas agriculturas que têm dificuldades de sobrevivência nos mercados, como é o caso do serviço de gestão de combustível e de quebra da continuidade dos povoamentos florestais, duas questões essenciais na gestão do fogo nas nossas condições bio-geográficas e socio-económicas.

Faço com todo o gosto uma previsão do que serão as nossas matas em 2050 se primeiro o Luís Matos me fizer a previsão do que serão os preços do petróleo ao longo destes 40 anos até 2050.

Sem essa condição prévia não me parece que qualquer previsão do que serão as matas, as economias e o mundo rural tenha grande credibilidade.

Poderemos discutir cenários que partem de pressupostos cuja solidez de previsão não sabemos calcular. Pouco mais.

henrique pereira dos santos