sexta-feira, outubro 26, 2007

Os protocolos lavam mais verde

Pedro Veira no seu blog fez um post sobre a iniciativa business and biodiversity que então comentei.

Com base nesse comentário o Pedro fez um novo post a que resolvo responder aqui na Ambio por achar que há vantagem no cruzamento da discussão entre os dois blogs e respectivos públicos.

Primeiro quero precisar a minha declaração de interesses: não só trabalho no ICNB como sou o responsável operacional na iniciativa business and biodiversity.

Posta esta declaração de interesses, vou então comentar o post do Pedro Vieira.

A questão do compromisso do cumprimento da lei é um bocadinho mais larga que Pedro Vieira sugere. Na verdade Pedro Vieira entende que esse é um compromisso sem interesse porque já é uma obrigação das empresas. Independentemente de esse ser o primeiro compromisso de todos os sistemas similares que conheço e de grande parte dos processos de certificação (o que significa que o não cumprimento desse requisito pode levar não só às sanções previstas na lei mas também à perda da certificação), a opção de sofrer as consequências (por exemplo, em coimas) de não cumprimento da lei em vez do seu estrito cumprimento não é totalmente absurda em muitas circunstâncias (por exemplo, quando o valor das coimas é muito baixo face aos custos do cumprimento da lei). Ora com o compromisso de cumprir a lei as empresas estão a dizer que renunciam a esta lógica. Mas esta é uma questão realtivamente marginal

Onde há uma diferença profunda entre o que diz o Pedro Vieira e a iniciativa é na natureza de se devem revestir os compromissos. Pedro Vieira entende que a verdadeira postura ambiental é colocar recursos em projectos com os quais a empresa não beneficia nada, porque essa sim, seria uma postura moralmente inatacável.

A iniciativa parte de pressupostos totalmente diferentes. A iniciativa parte do pressuposto de que para lá das intervenções mecenáticas e filantrópicas como as que Pedro Vieira refere, a nova oportunidade para a biodiversidade surge quando as empresas reconhecem o valor da biodiversidade para o negócio e o integram nas suas opções de gestão.

Isto é, a iniciativa não pretende ajuizar moralmente a postura das empresas, pretende sim demonstrar que a consideração da biodiversidade nas opções do negócio é benéfica para o negócio. As razões para esta opção são várias, as duas principais prendem-se com a complementaridade desta visão em relação às visões regulamentar e filantrópica, a segunda prende-se com a sustentabilidade da opção pela biodiversidade no seio da empresa: só é garantida quando se considera que essa opção faz parte do negócio. Doutra forma, à primeira crise, ao primeiro emagrecimento conjuntural das despesas da empresa fica em risco a afectação de recursos, como sabe qualquer organização que baseie o seu financiamento na filantropia e no mecenato.

O terceiro aspecto que gostaria de comentar prende-se com o papel do ICNB, que Pedro Vieira desvaloriza dizendo que as empresas não precisam do ICNB para nada (para logo a seguir dizer que a presença do ICNB é muito interessante do ponto de vista do marketing). A verdade é que antes do lançamento da iniciativa pelo ICNB ela não existia. E a verdade é que muitos dos compromissos das empresas são influenciados pela presença do ICNB (e já agora, em alguns, de vários outros agentes do lado da biodiversidade, quer seja no domínio da produção de informação, como é o caso do CIBIO ou da Universidade de Évora, só para citar compromissos que Pedro Vieira critica, quer do lado da acção, como é o caso do WWF e da QUERCUS, noutros compromissos).

Por último, apenas para dar uma pista de investigação, fica uma notícia sobre o BES, para se perceber que o mundo é muito menos a preto e branco que o pintam. É que se o ICNB não fiscaliza a iniciativa (embora naturalmente se possa demarcar de quem não cumpra os compromissos assumidos voluntariamente) o índice FTSE4Good tem um sistema de verificação bastante sólido e só integra empresas quando lhes reconhece credibilidade no cumprimento dos critérios que o suportam.

Diário Económico 2007-09-14 "Banco Espírito Santo integra índice de responsabilidade social Banco chega ao FTSE4Good na próxima semana. Pedro Latoeiro.

"A responsabilidade social tem sido uma das maiores preocupações das empresas nos últimos tempos e o Banco Espírito Santo (BES) viu agora premiado o seu esforço, tornando-se na única instituição financeira portuguesa a figurar no índice FTSE4Good.
O banco liderado por Ricardo Salgado vai assim integrar o FTSE4Good a partir do próximo dia 21 de Setembro que, a par do Dow Jones Sustainability (DJSI), é um índice de referência internacional para empresas cotadas com as melhores práticas em termos de desenvolvimento sustentável. Do sector bancário marcam ainda presença o BBVA, Barclays, ABN Amro, HSBC, Crédit Agricole e BNP Paribas, numa lista que continua a não admitir tabaqueiras, produtores de armas nem operadores de energia nuclear.
Lançado em 2001, o FTSE4Good entrega parte das suas receitas para a UNICEF e é constituído por um conjunto de índices negociáveis e comparáveis para investidores com preocupações de responsabilidade social.
Os critérios de ingresso no índice visam avaliar as práticas que minimizam os riscos sociais, éticos e ambientais e foram desenvolvidos por ONG, consultores, académicos e investidores.
Na última revisão semestral do FTSE4Good, o BES foi uma das quarenta e duas empresas a reunir todos os critérios de elegibilidade, destacando, em comunicado, “a política de comercialização de fundos éticos”, as directrizes sócio-ambientais adoptadas nos projectos de investimento e a recente declaração de compromisso Business & Biodiversity, “que pressupõe o apoio à protecção da biodiversidade e a comercialização de produtos específicos relacionados com o tema.”.

henrique pereira dos santos

4 comentários:

João Soares disse...

Caro Henrique,
por este artigo do Ecologist http://www.theecologist.org/archive_detail.asp?content_id=1112
traduz tudo o que tenho a dizer.
Saudações

Anónimo disse...

O blog Ambio passou agora a página oficial do MA?

Henrique Pereira dos Santos disse...

Caro Anónimo,

Os factos de eu achar relevante que finalmente as áreas protegidas deixem de existir sem planos de ordenamento e também achar que a iniciativa business and biodiversity é muito interessante devem ser calados pelo facto de coincidir com opiniões que podem ser lidas como posições oficiais do Ministério do Ambiente?

henrique pereira dos santos

garina do mar disse...

por acaso nunca me lembrei de divulgar o B&B no nosso blog... e uma vez andei à "caça" de informação sobre isso mas depois passou-me
mas temos procurado divulgar as áreas protegidas!! e nenhum de nós tem nada a ver com o MA (ou outro!)... é mesmo só porque achamos que o que Portugal tem de bom deve ser divulgado!
enfim, mania nossa

acho a ideia do B&B óptima! e espero que seja um sucesso... a bem do País