terça-feira, julho 07, 2009

Bem aventurados os pobres de espírito...


Ao ler os comentários ao post que fiz sobre fogo e insectos tenho a demonstração de como se é feliz sendo um pobre de espírito.
Fui dar um passeio ao campo e resolvi usar parte da informação que trouxe na minha cabeça para fazer uns posts.
E escolhi um título provocatório num deles, chamando porcarias aos invertebrados, porque essa é forma como a maioria das pessoas os veêm.
A reacção é muito curiosa, já que a maioria dos comentadores não se preocupam em saber se a informação está errada ou certa mas se está cientificamente validada ou não, coisa que nunca pretendeu ser.
Eu, na minha pobreza de espírito, tentei explicar que um post é um post, não é um artigo com peer review, e que a informação do post era apenas uma informação que coligi porque achei graça (é um direito que assiste às pessoas comuns, o direito à asneira).
Agora é o Pedro Gomes que pedagogicamente me vem explicar que estou a ser demagógico, que há uma questão muito importante na problemática dos indicadores de que me estou a esquecer e que o leva a concluir que eu não tenho uma grande experiência na identificação de artrópodes e outras coisas que tais.
Pedro Gomes foi, tanto quanto sei, responsável por gerir e aplicar um orçamento muito relevante em estudos sobre o Parque Nacional da Peneda-Gerês. Esta situação não decorreu de qualquer concurso público mas de adjudicações directas feitas por um colega da sua Universidade que episodicamente era director do Parque Nacional da Peneda-Gerês.
Eu sou um pobre de espírito que não compreendo os assuntos de que falo e que não tenho muita experiência na observação de artrópodes.
E como pobre de espírito pergunto-me o que foi feito com os recursos excepcionais postos à disposição desta equipa de investigação?
Uma boa aproximação de resposta está nas quatro referências bibliográficas indicadas num comentário anterior onde se discutem coisas absolutamente centrais para a conservação no Parque Nacional da Peneda Gerês como a sobreposição dos hábitos alimentares e dos nichos ecológicos do coelho, da raposa, do gato bravo e da geneta, esse momentoso problema de conservação e profunda lacuna de conhecimento cuja colmatação era fundamental para a gestão do PNPG.
E o mais curioso é que pelo menos uma das conclusões não tem qualquer suporte a não ser umas inferências estatísticas erradas (não estatisticamente, mas biologicamente) sobre a relação entre o coelho e os matos altos.
Mas como eu sou um pobre de espírito ignorante do processo científico e da realidade aconselho que antes de começarem já a explicar que o que digo decorre da minha incapacidade em ter um pensamento científico por favor leiam isto.
Não é verdade que eu não tenha grande experiência na observação de artrópodes. O que é verdade é que não tenho nenhuma. Nem de outros invertebrados. E olhe, mesmo assim tinha pensado para mim se a diferença que via nas libelinhas não era apenas resultante de dimorfismo sexual e vi claramente vista a diferença de comportamente das tais duas libelinhas. E expuz, com a leveza que me dá a pobreza de espírito, a minha ignorância dizendo que esperava não estar a dizer nenhuma asneira. E por isso acrescentei a história da libelinha igual mas azul para que quem soubesse mais pudesse interpretar, que muitas vezes a nós, simples pobres de espírito passeantes, basta-nos o prazer de ver, sem qualquer pretensão científica, não sendo má ideia registar, mesmo que só na memória, o facto cujo significado desconhecemos, porque pode ser útil a quem saiba dar-lhe utilidade ("guarda o que não te faz falta e acharás o que precisas").
Já agora, o processo de florestação, sobretudo no Gerês, não é dos anos 40 e 50 mas tem o seu início em meados fins do século XIX.
Caros investigadores, discutam as minudências do processo científico com os vossos pares e não queiram estragar o prazer dos pobres de espírito que se contentam em ir acumulando informação inútil e de forma caótica e, apesar disso, conseguem dizer, fundamentando, que alguma da informação que consta das vossas publicações está errada, e muita outra é inútil, em vez de se limitarem a discutir os milhares de outras possibilidades de olhar para cada um dos assuntos que nos chamam a atenção.
Seria útil que também em relação ao post explicassem os seus erros, em vez de explicarem que não podem dizer nada porque não está cientificamente validado (curiosamente ninguém quiz saber coisas normais como onde era, o que lá estava antes, há quanto tempo ardeu, que características tinha o fogo, etc.),
Não admira que em Portugal haja tão poucos naturalistas empíricos e por isso os investigadores passem a vida a fazer modelos sem solidez por falta de dados de campo.
É que nem toda a gente está para ser tratado do alto da burra.
henrique pereira dos santos

4 comentários:

Anónimo disse...

O Henrique escreve muito bem. Expõe os seus argumentos de um modo muito acessível e directo e muitas vezes toca em pontos pertinentes escondidos atrás de temas "comuns".
No entanto, ai de que o contraria..

E aqui perde a razão. É que em posts anteriores criticou o empirismo (p. ex. na área da conservação) e aqui está a defender a relevância dos seus dados empíricos.

Anónimo disse...

Esqueci de dar os parabéns ao blog. Ao menos põe-nos a discutir o ambiente. Esperemos que todos mantenham a discussão saudável, pois infelizmente o azedume e a cólera povoam tristemente a blogosfera nacional.

Henrique Pereira dos Santos disse...

Reconheço o defeito de ser demasiado bruto e directo na argumentação (abrasivo foi a melhor definição que ouvi).
Nunca critiquei a produção de dados pelo empirismo.
O que critico é a falta de profundidade crítica e de base científica nas interpretações e na fundamentação das interpretações.
Neste caso o que foi criticado foi uma observação por ser uma observação.
Se tivessem criticado essa observação com base em conhecimento científico que a invalida, nada a dizer. Assim...
henrique pereira dos santos

Anónimo disse...

Charles Darwing, o Mestre dos actuais cientistas da natureza, começou por estudar medicina, depois teologia, apesar de gostar de coleccionar besouros e outros bichos esquisitos em jovem. Acima de tudo era um observador que sujava as mãos e gastava botas, no campo. Suponho que nunca subiu a escada académica (licenciatura-mestrado-doutoramento) considerada indispensável pelos actuais detentores do saber científico para se poder botar opinião válida, ou certificada. Morreu há mais de 100 anos, obviamente sem sonhar com computadores.