Faz agora pouco mais de quinze dias que decorreu com enorme sucesso o Fórum Biodiversidade promovido pela Câmara Municipal de Cascais, inserido no Green Festival 2009 que esta autarquia pretende levar a cabo todos os anos no final de Setembro e que contou com alguns especialistas internacionais. Foi lá que encontrei o meu amigo Sebastian Winkler da IUCN e responsável pelo Countdown 2010.
Foi de facto um prazer encontrarmo-nos para um cafezinho e passar de novo em revista alguns temas que fizeram o meu quotidiano durante alguns anos. Durante a conversa perguntei-lhe quais eram as novas tendências ambientais a nível global que vislumbrava no horizonte. Sem a mínima hesitação respondeu-me: em primeiro lugar “Green Economy”, em segundo e terceiro lugar “Green Economy”. E tal forma assim era, que a IUCN tinha criado um novo departamento sobre esta temática e estava a reestruturar-se internamente para se ajustar a estes novos tempos. Aliás, em parte era essa também a razão porque se iria reduzir substancialmente a delegação em Bruxelas (o acompanhamento e influência junto da Comunidade Europeia começava a ser pouco interessante…) e passar as equipas para Genebra o que lhe faria mudar de local de trabalho já para o ano.
Com alguma admiração referi que eventualmente haveria algum exagero nesta sua afirmação e que só faltava dizer-me que o prémio Nobel seria dado a quem se tivesse debruçado sobre estas matérias. Ao que me retorquiu que não sabia se seria já neste ano ou nos próximos, mas que podia contar com isso para breve tal era o movimento nesta matéria nos fóruns internacionais.
Vem, esta história a propósito do prémio Nobel para a economia deste ano. Um dos vencedores é Elinor Ostrom e o Sebastian tinha razão até mais cedo do que julgava.
A Elinor Ostrom não é uma cientista da ecologia nem da economia verde embora estes temas estejam claramente nas suas preocupações académicas e de vida. Mas sem dúvida que o Comité Nobel quis dar um sinal claro que as temáticas económicas que estão para além do estudo dos Mercados e do Estado fazem sentido e desta forma também se aproximar dos grandes temas ambientais e sócio-políticos globais deste novo século como o estudo económico sobre as “alterações climáticas”, a “biodiversidade”, a “gestão dos oceanos”, a “gestão das florestas” e outros que obrigam a uma lógica de gestão partilhada, multi-temática e colectiva de recursos do planeta.
Elinor Ostrom teve a ousadia, e já há muitas décadas (os seus primeiros trabalhos datam do final dos anos cinquenta) de desafiar o pensamento económico convencional de que a propriedade comum é mal gerida e que os indivíduos têm a tendência de sobre - explorar estes recursos comuns desresponsabilizando-se da sua evolução futura levando ao colapso destes (o que Garrett Hardin chamou "the tragedy of the commons"). As soluções nesta visão tradicional seriam ou uma regulamentação forte pelas autoridades centrais/regionais ou a privatização com o accionar dos mecanismos de mercado.
Fortemente baseada em numerosos estudos realizados por todo o mundo sobre a gestão de activos que são comuns e que são geridos de forma organizada pelas colectividades que os exploram, sejam estes stocks de peixes, lagos e bacias, bosques, florestas, pastagens e mais recentemente informação e conhecimento (é forte defensora da livre circulação de informação na internet) Elinor Ostrom desenvolveu uma metodologia de análise que permite analisar os esforços multidisciplinares para a compreensão de sistemas complexos “sócio – ecológicos” e não só concluiu que estes podem ser bem geridos como a sociedade tem a ganhar com estas acções colectivas, particularmente quando os consumidores desses recursos comuns formam um grupo homogéneo e bem definido, aprenderam a confiar, a comunicar e a controlar-se uns com os outros, esperam partilhar um futuro comum e conjecturam deixar esses recursos de forma sustentável para os seus herdeiros.
Este prémio Nobel ao romper com as abordagens clássicas traz um imenso desafio não só para aqueles que estudam estas matérias, mas fundamentalmente para aqueles que pretendem colocar na agenda sócio – política os temas que inevitavelmente estão associados aos estudos da Elinor Ostrom. Dentro destes, os ambientais estarão na primeira linha e também em Portugal.
terça-feira, outubro 13, 2009
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2 comentários:
Mais sobre o Nobel a Ostrom.
Vale a pena comparar os comentários em torno deste prémio Nobel nas imprensas anglo-saxónica e portuguesa. Nos países de língua inglesa lêem-se comentários entusiásticos, quando não de estupefacção, pelo facto do comité Nobel ter seleccionado uma autora que "demonstra" que a tragédia dos comuns não é uma inevitabilidade. Esta atitude não surpreende. A revolução agrícola – incorrectamente conhecida como 1ª revolução agrícola - que decorreu de mãos dadas com a revolução industrial nos sec. XVIII e XIX, deveu o seu sucesso à aniquilação de direitos comunitários medievais (e.g. compáscuo e pastagens comunitárias). Por isso, para um inglês ou um estadounidense, as teorias de E. Ostrom embora empírica e teoricamente sustentadas soam anti-intuitivas, uma das sensações mais agradáveis para quem se entusiasma com ciência. Em Portugal, seguramente por miopia ideológica, assiste-se a uma espécie de copy e past desta lógica, que nada tem a ver com Portugal! Já encontrei na internet comentários a artigos de jornal onde se defende que a Prof. Ostrom prova que as Unidades Colectivas de Produção eram afinal viáveis.
A nossa ruralidade é muito distinta da inglesa, ou a de qualquer outro país anglo-saxónico. Por exemplo, a dita 1ª revolução agrícola não se fez sentir em Portugal (e.g. nunca se generalizaram entre nós rotações de sequeiro com leguminosas), e muitos dos direitos consuetudinários de raiz medievais estão ainda presentes nas nossas comunidades rurais (e.g. a figura do res nullius na caça e na recolha de cogumelos, os baldios, e os direitos de pastagem nos pousios). As teorizações de E. Ostrom têm, na realidade um sinal oposto em Portugal! Como as condições para uma "boa" gestão de activos comunitários enumeradas por E. Ostrom simplesmente já não se verificam nos nossos espaços rurais, necessitamos, libertos de Marx e de Jorge Dias, de repensar as leis dos baldios e da caça, e os direitos de usufruto da terra.
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