segunda-feira, novembro 09, 2009

Fui apanhar castanhas


Quando comecei ainda mal se via, mas logo uma espécie de pedra esquisita me chamou a atenção. Afinal era um cogumelo arredondado e sem pé visível que estava no meio do caminho.
Eu não percebo nada de cogumelos de maneira que passei como cão por vinha vindimada.
Provavelmente irritado com a minha indiferença, o mundo dos cogumelos passou o tempo todo a provocar-me com a demonstração reiterada da minha ignorância a cada passo.
Soubera eu alguma coisa do assunto e ter-me-ia vingado com um belo cozinhado.
Mas não com todos os cogumelos que me apareciam, uns tão pequeninos e com uma cor tão incaracterística que não valeriam os esforço de os apanhar. E ao outro, também mínimo mas com uma cor de quaresma que era mais que uma ameaça.
Uns cinzentos com cor de pano do chão emparelhavam bem com os outros de um leitoso sujo, bem diferentes do encarnado a laranja orgulhoso, com pintas ou sem pintas brancas em que eu ia tropeçando à medida que apanho umas castanhas pelo meio das silvas.
Como de costume lá se escapou uma chioglossa que devo ter acordado debaixo das folhas.
Não foi longe dos outros cogumelos de um amarelo limão muito pálido. Não, não eram os que tinham um anel de um amarelo quase desmaiado que depois de concentrava dum degradé que no pico do chapéu acabava no amarelo torrado. Esses estavam um bocadinho antes dos outros, que nem sei se chegavam a ser cogumelos, naquela forma de coral amarelo claro.
É triste não saber ler as histórias que em cada passo encontrava escritas sem conseguir ler. Ao contrário do que acontecia quando via os sinais do tractor por baixo de um castanheiro, tirando o meu trabalho de abrir os ouriços para chegar às castanhas.
Aí sim, eu sabia ler a história de abandono e riqueza relativa que permite deixar no campo óptimas castanhas, gordas, bonitas, com uns olhinhos piquininos a brilhar lá no fundo, como diria o João Villaret, ao contrário do que acontecia há uns anos atrás, em que haveria sempre um miúdo a aproveitar todos os restos, todas as castanhas, ou as espigas que caíam dos carros, no transporte.
E também sei ler as silvas nos combros abandonados, a levada meia desfeita com uns bons centímetros de folhas mortas, os moinhos inúteis e totalmente submersos em plantas, o laço furtivo à espera do javali, mas não sei ler o que querem dizer todos aqueles cogumelos diferentes em tão pouco espaço.
É triste ser ignorante.
henrique pereira dos santos

3 comentários:

Anónimo disse...

muito bonito
gostei de ler
f3rnando m01t4l

ricardo disse...

muito interessante henrique... certamente não és o único analfabeto, a situação segue sem grandes mudanças no mundo todo: enquanto existem dicionários e gramáticas na Europa e outros países do hemisfério Norte, no Brasil (e na maioria dos países tropicais) não temos mais que algumas anotações esparsas, fragmentadas, desconexas...

Henrique Pereira dos Santos disse...

Ricardo,
As minhas filhas fizeram as minhas máquinas fotográficas andarem por aí e por isso não tirei fotografias. Mas pensei que pelo menos o roxo encontrasse facilmente na net.
Percebi quando procurava uma ilagem para o post como é difícil em Portugal aprender. E não encontrei uma fotografia com o tal cogumelo roxo.
henrique