Faz agora vinte anos que o Muro de Berlim caiu e nesse dia também eu me senti um Berlinense. Estive em Berlim (Oeste) pela primeira vez em 1974, era um jovem e recordo aqueles locais que me ficarão para sempre na memória. O muro, a plataforma em frente da Porta de Bradenburg que a permitia ver bem assim como a uma cidade cinzenta e em ruínas do outro lado, o checkpoint charlie, que separava o sector americano do sector soviético da cidade, o qual durante muitos anos preencheu o meu imaginário a ler os livros de Jonh le Carré e as conversas que invariavelmente se focavam nas questões da Liberdade e da reunificação Alemã.
Mas o que mais me marcou foi, aquando da viagem de autocarro pelo interior da RDA até Berlim, ao pararmos numa estação de serviço para as necessidades habituais e por me ter atrasado um pouco, deparo com o condutor em pânico tentando arrastar-me para a viatura. Tal devia-se ao facto de, se nos demorássemos mais do que o definido, não só teríamos que prestar declarações à polícia no último controlo da Alemanha de Leste antes de entrar em Berlim, como o mais certo era ele não poder voltar a fazer aquele trajecto.
Voltei a Berlim, agora à parte Leste, em 1976, vindo da antiga Checoslováquia e talvez por isso o controlo sobre os meus movimentos foi menos rigoroso do que para a generalidade dos ocidentais. Tive a oportunidade de estabelecer contactos e amizades que perduraram e lembro-me dos ideais e das conversas daquela que também era a minha geração. A vontade de viajar pela mundo e a possibilidade de consumir produtos ocidentais estavam no centro das reivindicações, mas embora mais ténues do que no ocidente também lá estavam as questões políticas, a vontade de assumir os erros do passado e o querer construir um futuro. A curiosidade por um Portugal que na altura tinha conseguido ultrapassar uma ditadura sem sangue, consolidava uma democracia representativa e ambicionava construir um projecto de integração europeia, era obrigatoriamente tema para os meus anfitriões.
Só voltei a Berlim depois de o Muro ter caído, mas não tenho dúvida que muitos dos valores que assumi e das opções políticas que tomei ficaram marcadas por estas viagens e pela história desse Muro.
Voltei a reviver estes temas há uns anos, por razões profissionais, aquando da Tripla Presidência da União Europeia. A Presidência Alemã fez questão numa das várias reuniões em Berlim de me convidar, e aos meus homólogos dos países da União, para uma amena conversa no Bundestag (parlamento alemão) sobre o que considerava ser o seu papel no domínio do Ambiente.
Já no final da sessão um dos meus colegas questionou se a duplicação de serviços do Ministério do Ambiente em Berlim (uma vez que os acordos de unificação obrigam a manter idêntica estrutura em Bona) não causava problemas de produtividade. A resposta veio por uma das Secretárias de Estado presente (cito evidentemente sem rigor) “Nasci na parte leste de Berlim, as últimas três gerações da minha família, aliás como as de todos alemães, todos os dias destas últimas décadas idealizaram uma Alemanha unida capaz de lhes trazer a segurança, a prosperidade, o bem-estar e um papel de relevo junto dos outros povos. Berlim simboliza esse sonho, não realizá-lo implica destruir a energia acumulada que impedirá a concretização dessa Alemanha”. A resposta foi obviamente política, mas como eu desejei que em Portugal um qualquer “Muro” tornasse as coisas assim tão claras!
1 comentário:
Estive em Berlim Ocidental em 1966 ou 1967.
Fui de comboio a partir de Londres e voltei de autocarro para Hannover.
Em Berlim passei várias vezes para Berlim Oriental pelo Check Point Charlie.
O pessoal da Volks Polizei era de uma forma geral simpático e só dizia "Benfica" e "Eusébio".
O que mais me irritava quando passava o muro era ter de cambiar ao cambio de um marco oriental por um marco ocidental, cinco marcos.
Creio que muito do que se diz sobre a defunta Ost Deutschland é bastante exagerado.
Anos mais tarde, tinha a Alemanha sido reunificada há um ou dois anos, fui a uma reunião em Praga com delegações de países do Leste Europeu.
Estavam lá alguns alemães de leste que não pareciam lá muito satisfeitos com a reunificação.
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