sábado, janeiro 02, 2010

O DDT, a malária e os adolescentes inconsequentes


A propósito das alterações climáticas, um comentador anónimo (ou se se preferir, um comentador que usa um pseudónimo) resolveu fazer um violento ataque a Rachel Carson e à irresponsabilidade dos ambientalistas, que acusa de criminosos.
O nível da argumentação e a violência do ataque merecem resposta, sobretudo porque pessoas bem intencionadas mas sem tempo para verificar o que se sabe sobre o assunto podem ficar seduzidas pela segurança das afirmações feitas, confundido preconceitos com factos.
"Objectivamente a interdição de uso do DDT matou +50 milhões de pessoas" diz-se, com absoluta segurança. (ver aqui a perfeita desmontagem desta estupidez)
Não sei qual é a fonte para esta afirmação tão taxativa, nem sei como se faz a contabilidade, sobretudo sabendo que o DDT foi proibido em muitos países mas continuou a ser usado em muitos outros, em especial naqueles onde a malária (ou paludismo) é endémica e ataca mais fortemente, até porque as restrições ao seu uso sempre incluíram excepções para o controlo de doenças.
Nem sei como se chega a conclusões destas sabendo que um dos problemas principais do uso de pesticidas como o DDT é a bioacumulação ao longo da cadeia trófica, que tem efeitos especialmente graves nos predadores, muitos deles predadores dos mosquitos veículos de malária.
Uma coisa é discutir seriamente qual é a utilidade do DDT no controlo da malária, discutir os custos e benefícios do seu uso apesar dos efeitos secundários, discutir os mecanismos alternativos de controlo da malária, discutir o desenvolvimento de resistências ao DDT nas populações de mosquitos e por aí fora (um link equilibrado para a discussão).
Outra coisa é agir como um adolescente inconsequente, esquecer os efeitos de longo prazo do DTT, considerar que é possível erradicar a malária matando todas as populações de mosquitos que lhe servem de veículo.
Esta ideia de interferir nas cadeias tróficas de forma drástica tem sido trágica e ao longo da história causou desastres ambientais de que resultaram milhões de mortes, como no mais que conhecido caso chinês com o controlo dos pássaros para aumentar as culturas, ou, em muito menor escala, na secagem das zonas húmidas, quer para as reconverter para a agricultura, quer exactamente para diminuir as sezões (outro dos nomes dados ao paludismo e malária).
Querer resolver problemas complexos, num mundo complexo, com ideias simples é muitas vezes desastroso.
Acusar de criminoso quem simplesmente se limita a pôr em cima da mesa as limitações dessas ideias simples, querendo levar essas pessoas a tribunal em vez de demonstrar onde estão erradas é infame e ultrapassa o direito à asneira de que todos somos detentores.
henrique pereira dos santos
Adenda: Deixei de responder ao comentarista que fez este ataque de baixo nível sobre o DDT quando percebi que as suas referências sobre as alterações climáticas eram risiveis, sendo o seu valor inversamente proporcional à arrogância das suas certezas e à agressividade face a quem se limita a pensar de forma diferente. Para se perceber melhor a indignação que me fez escrever este post aconselho a leitura integral do artigo da Wikipedia em inglês sobre o DDT, com dezenas de referências bibliográficas, discutindo equilibradamente a sua relação com o controlo da malária, bem como todo o processo que levou à proibição do seu uso na agricultura (e nunca foi banido no combate ao vector da malária, ao contrário do que foi afirmado). Este blog preza a liberdade de expressão e o contraditório, mas o que foi dito sobre Rachel Carson e o movimento ambientalista a propósito do DDT é de facto inaceitável, não por ser uma opinião divergente sobre o DDT mas por, à falta de factos, se usar uma mentira evidente com o único objectivo de atacar quem pensa de maneira diferente.

20 comentários:

Olympus Mons disse...

Parte I
caro HPS,
Talvez exagere ao dizer isto, mas nada me assegura melhor, nem me acicata mais seriamente a convicção de que muito do que representa o movimento ambientalista não passa de um movimento sociológico de personalidades com dificuldade em ultrapassar o complexo de super herói, do que a reacção do HPS. Assim que alguém encontra forma de vos retirar do papel em que se auto-representam, heróis de espada na mão, algo que convirá é um bocadinho imberbe e adolescente, para que reajam com laivos de amuo perante “O nível da argumentação e a violência do ataque”.
Assim que na proposição veiculada (no caso a que eu fiz) deixam de ter possibilidade de obter retorno emocional de endorfinas segregadas (algo que os coitados dos vilões como eu nunca obtêm) ficam nesse estado.

Esta questão do DDT levaria horas a contextualizar, contudo, pergunto-lhe a si. Quantas pessoas morrem de malária em África por ano então?
Porque foi erradicado a Malária na Europa e América do norte, aliás de todos os países desenvolvidos até 1967, e não poderia ter sido em África?

"In May 1955 the Eighth World Health Assembly adopted a Global Malaria Eradication Campaign based on the widespread use of DDT against mosquitos and of antimalarial drugs to treat malaria and to eliminate the parasite in humans. As a result of the Campaign, malaria was eradicated by 1967 from all developed countries where the disease was endemic and large areas of tropical Asia and Latin America were freed from the risk of infection. The Malaria Eradication Campaign was only launched in three countries of tropical Africa since it was not considered feasible in the others. Despite these achievements, improvements in the malaria situation could not be maintained indefinitely by time-limited, highly prescriptive and centralized programmes."

[Bull World Health Organ 1998;76(1):11-6]

Quanto ao que significava o DDT para as pessoas do mundo. Pessoas, Antónios, Marias, ou se quiser Djambos, Mukabandas, etc, pessoas como o HPS e eu, e que pena não haver um DDT body count como o Iraqui body count, não é?

*******
"To only a few chemicals does man owe as great a debt as to DDT... In little more than two decades, DDT has prevented 500 million human deaths, due to malaria, that otherwise would have been inevitable."

[National Academy of Sciences, Committee on Research in the Life Sciences of the Committee on Science and Public Policy. 1970. The Life Sciences; Recent Progress and Application to Human Affairs; The World of Biological Research; Requirements for the Future.]


***** It is believed that [malaria] afflicts between 300 and 500 million every year, causing up to 2.7 million deaths, mainly among children under five years.[Africa News, January 27, 1999]

***** Não sendo a fonte acima a minha preferida, porque tinha como referencias as fontes dadas por http://news.nationalgeographic.com/news/2003/06/0612_030612_malaria_2.html , Que eram http://www.childinfo.org/eddb/Malaria/ e http://www.rbm.who.int/cmc_upload/0/000/015/370/RBMInfosheet_3.htm mas que agora (estranhamente?) foram removidas da WHO, mas fique com http://www.rollbackmalaria.org/keyfacts.html

Daqui poderíamos estar horas a discutir os argumentos que foram usados para se chegar ao evento da não utilização do DDT, mesmo tendo em conta os benefícios acima mencionadas para a espécie humana. Contudo no contexto em que aqui estamos essa discussão seria de strawman. Aquilo que nos trouxe aqui, a este blog será mais:

"If the environmentalists win on DDT, they will achieve a level of authority they have never had before. In a sense, much more is at stake than DDT."
[Charles Wurster, chief scientist for the Environmental Defense Fund, commented, Seattle Times, October 5, 1969]

Olympus Mons disse...

Parte II
Daquele ponto, das palavras do Charles wuster aos filmes da Rachel Carson, até á morte daquela daquela gente toda houve uma linha consequencial e devia ter havido, ou haver, um inquérito, porque não foram palitos de fósforo que morreram, foi gente e é o valor dessa gente que deve ser usado como benchmark para aquilo que por vezes se preconiza nos nossos dias como forma de abordar a adição de CO2 na atmosfera e os seus efeitos.
Pese embora de uma forma embrionária naquela altura (60/70), estamos hoje novamente perante o mesmo modus operantis, as mesmas formas de proceder: tal como hoje (nature e science) revistas cientificas se recusam a publicar artigos que contradissessem a nova verdade sobre o DDT, estudos que revelavam a não existência de efeitos para os níveis de exposição a que os humanos estavam sujeitos não foram aceites, cientistas que tentaram ser cépticos foram acossados (como Thomas H. Jukes), desmistificações dos efeitos foram ignorados, associação a tudo o que é assusta as populações (na altura era o cancro), associação a todas os declínios de espécies (falcão peregrino, pelicano castanho, etc.) …. Parece-lhe familiar? Pois é, porque é mesmo. Estamos a ver o mesmo filme e parece-me a mim que devemos começar a tratar do Climate Change body count versus o Climate change policys body count. O primeiro parece-me que já existe… naturalmente do segundo com é expectável, nem vislumbre. Mas devia, porque aquilo que eu espero é que com esta questão das alterações climáticas não volte a haver o branqueamento das consequências, como se os meninos já acabassem de brincar, “limpa lá a casa e deixa-os ir dormir”, e haja um estabelecido processo de “accountability” para todos os envolvidos. No mundo real, todas as nossas opções tem consequências. Todas. É ao perceber isto que somos adultos!

Volto a perguntar….
Porque foi erradicado a Malária na Europa e América do norte, aliás de todos os países desenvolvidos até 1967, e não poderia ter sido em África? Quantos milhões acharia então que teriam sido salvos? Quantos milhões morreram? Qual o preço em vidas humanas, que acha justo pela “ideia de interferir nas cadeias tróficas”?

Diga lá caro HPS e abuse “do direito à asneira de que todos somos detentores” porque aparenta ter carradas para abusar.

Anónimo disse...

Olympus, sabe quantas espécies de mosquitos hematófagos existem nas regiões tropicais? Muitas.

Sabe quantas espécies de mosquitos hematófagos existem nas regiões temperadas, onde a malária foi erradicada? Poucas.

Nem que submergissem a bacia do Congo com DDT exterminavam todos os mosquitos

Não deixo de registar o paralelo que se pode estabelecer entre os negacionistas da evolução, das alterações climáticas e dos efeitos do DDT: falta de conhecimento científico, falta de honestidade intelectual, motivações económicas e religiosas e espírito do contra.

O foco do combate à malária deve focar-se no tratamento e prevenção. Isso sim é que é cost effective. E não existe cura exactamente
porque a doença não existe, praticamente, no mundo desenvolvido. Caso contrário já existiria.

Este é que é a parte fulcral da questão.

Mais, acho incrível como é que se pode usar a desgraça de milhões de pessoas como pretexto para destilar o ódio contra quem procura defender o meio ambiente e (não digo que seja o caso do Olympus, atenção)e para apoiar interesses de companhias que fabricam pesticidas.

joserui disse...

Caro HPS, muito bom texto. As fontes deve encontrar no site Junk Science ou nos "think tanks" americanos junto aos "factos" sobre aquecimento global, tabaco e ozono.
Quanto ao resto, que conversa de chacha inacreditável. JRF

Henrique Pereira dos Santos disse...

O parágrafo seguinte ao citado no primeiro comentário (e que começa com In May 1955...), para se ter a noção da seriedade posta na discussão:
Also, vector resistance to DDT and of malaria parasites to chloroquine, a safe and affordable drug, began to affect programme activities. A global Malaria Control Strategy was endorsed by a Ministerial Conference on Malaria Control in 1992 and confirmed by the World Health Assembly in 1993. This strategy differs considerably from the approach used in the eradication era. It is rooted in the primary health care approach and calls for flexible, decentralized programmes, based on disease rather than parasite control, using the rational and selective use of tools to combat malaria. The implementation of the Global Strategy is beginning to have an impact in several countries, such as Brazil, China, Solomon Islands, Philippines, Vanuatu, Viet Nam and Thailand. The lesson from these areas is clear: malaria is being controlled using the tools that are currently available. The challenge is now to apply these tools among vulnerable individuals and groups experiencing high levels of morbidity and mortality, particularly in sub-Saharan Africa, for which long-term investments are required.
henrique pereira dos santos

Olympus Mons disse...

Caro Anónimo, “sabe quantas espécies de mosquitos hematófagos existem nas regiões tropicais” que não denotem comportamentos de “avoidance contact” com o DDT? Nenhuma (o que é directamente relevante para o ponto em questão).

Agradeço que concorde que as mortes provocadas pela ausência de utilização do único meio comprovadamente eficaz de o fazer, o DDT, tenha sido uma “desgraça de milhões de pessoas”. Já me espanta,um bocadinho não muito, que não considere de importância relevante apurar responsabilidade pelo fenómeno e aprender lições para o futuro.

Quanto ao que diz sobre combater eficazmente as variantes hematófagas em Africa, lamento discordar. Eu sou de África, mais propriamente da região do actual Sumbe, Angola… e se acha que não se consegue controlar as manifestações endémicas destes bichinhos aconselho-o a ir investigar um bocadinho mais, e já agora, se quiser pode começar pelo Sumbe onde em 30 anos se passou de uma situação endémica perfeitamente pavorosa para uma situação perfeitamente controlada nos anos 50/60 onde o número de óbitos era bastante reduzido. Como se conseguiu esse milagre pelas sua própria avaliação? --- Sim… com DDT!

Henrique Pereira dos Santos disse...

When it was first introduced in World War II, DDT was very effective in reducing malaria morbidity and mortality.[15] The WHO's anti-malaria campaign, which consisted mostly of spraying DDT, was initially very successful as well. For example, in Sri Lanka, the program reduced cases from about 3 million per year before spraying to just 29 in 1964. Thereafter the program was halted to save money, and malaria rebounded to 600,000 cases in 1968 and the first quarter of 1969. The country resumed DDT spraying, but it was largely ineffective because mosquitoes had acquired resistance to the chemical in the interim, presumably because of its continued use in agriculture. The program was forced to switch to malathion, which though more expensive, proved effective.[18]

(que paciência, santo Deus)
henrique pereira dos santos

Olympus Mons disse...

Caro HPS,
Fraco, fraquinho. Tem que começar a esforçar-se um bocadinho mais.
Essencialmente terá que começar a reponder às intervenções dos outros, algo que tem falhado repetidamente em todas as abordagens que tem feito a comentários meus. De todas as vezes fico com genuínas dúvidas se entendeu, sequer, qual o meu ângulo, qual o a minha perspectiva sobre qualquer dos assuntos, porque objectivamente não denota tê-los entendidos, quer sejam de carácter cientifico, quer sejam deontológicas, quer sejam metodológicos.

Confesso, o meu caro deixa-me confuso.

mas já agora, bom 2010 para si.

Olympus Mons disse...

JoseRui... olhe, bom 2010 para si.

Henrique Pereira dos Santos disse...

Caro Olympus Mons,
Ponto 1 - o DDT nunca foi banido para usos relacionados com a saúde pública. Portanto o seu primeiro pressuposto é mentira. E como não acredito que não saiba que é mentira pura e simplesmente acho que não vale a pena responder-lhe. Vou dando informação a outras pessoas sobre o que diz para que estejam precavidas em relação aos seus hábitos de poupança no que diz respeito ao uso da verdade.
Ponto 2) Os programas de erradicação da OMS pararam por falta de dinheiro, de enquadramento institucional e porque a sua eficácia se reduziu drasticamente à medida que o mosquito ganhou resistências aos DDT e o outro bicho ao principal remédio usado.
Ponto 3) "“No responsible person contends that insect-borne disease should be ignored,” Carson wrote in Silent Spring. “The question that has now urgently presented itself is whether it is either wise or responsible to attack the problem by methods that are rapidly making it worse. . . . Resistance to insecticides by mosquitoes . . . has surged upwards at an astounding rate.”"
henrique pereira dos santos

Olympus Mons disse...

Henrique pereira dos santos
Só agora vi a sua adenda e parece-me um bocadinho baixo nível e algo histérico. Assim como, nível do herman josé dos tempos mais rascas, não lhe parece?

“aquele que fundamenta o seu argumento no escândalo e na fúria mostra que a sua razão é fraca” – Michel de Montaigne


Deixou de me responder? não, nunca me respondeu. Aliás no inicio ainda pensei que fosse uma estratégia sua, mas rapidamente percebi que não respondia porque na verdade não sabia o que dizer. Daí a dizer, das minhas referencias, que são risíveis ( - entendido meu chapa, entendido – o tal bloguista que falava do Goebbels sabia do que falava, não sabia? )… não sabe qual a minha formação e muito menos sabe quais as minhas referências.

Apesar do seu apego á “liberdade de expressão” (olho logo por cima do ombro quando oiço alguém dize-lo) vou calmamente aguardar a chegada do momento em que me vai banir do blog, se naturalmente a estratégia agora encetada por si não resultar (que é o ad hominem baixo nível e indigno de um moderador de blog) e se eu pelo meu lado não considerar que não vale a pena contribuir num blog se significa atura-lo a si. É que é uma pena que seja tão profícuo, porque traz muito ruído ao blog.
De um post seu “Um contribuinte do blog de nome Miguel de vez em quando respondia-me, cordialmente embora nunca usasse um único argumento de substância e um outro, André Azevedo Alves, do alto da sua autoridade, ia dizendo que não percebo nada de peer review” -- O HPS já foi comigo o tal Miguel e já foi o tal André… agora só falta mesmo banir-me do blog.

Percebo que o seu papel não é fácil… mas quem não quer ser lobo, não lhe vista a pele.

Anónimo disse...

Olympus, vá à internet pesquisar sobre resistência a pesticidas por parte de insectos.

Depois de ler isso com muita calma e sem pressa, pesquise sobre resistência ao DDT. A seguir faça o favor de procurar fontes bibliográficas posterior a 1969 sobre a matéria e de as usar na sua argumentação.

Quer-me parecer que o mais histérico da discussão até é o Olympus. Por isso peço-lhe que se acalme um bocadinho, para que isto não descambe. Por mim prefiro que fique por aqui.

É preciso que se saiba que há quem defenda o DDT e ouvir os seus argumentos. Quanto mais não seja para que ninguém se esqueça que há sempre alguns prontos a repetir erros do passado, mesmo tendo na sua posse a informação que os deveria aconselhar não os repetir.

Se não é indiscriçã, gostaria de perguntar ao Olympus qual é a sua formação/profissão? Eu apesar de anónimo sou biólogo.

Anónimo disse...

Olympus, vá à internet pesquisar sobre resistência a pesticidas por parte de insectos.

Depois de ler isso com muita calma e sem pressa, pesquise sobre resistência ao DDT. A seguir faça o favor de procurar fontes bibliográficas posterior a 1969 sobre a matéria e de as usar na sua argumentação.

Quer-me parecer que o mais histérico da discussão até é o Olympus. Por isso peço-lhe que se acalme um bocadinho, para que isto não descambe. Por mim prefiro que fique por aqui.

É preciso que se saiba que há quem defenda o DDT e ouvir os seus argumentos. Quanto mais não seja para que ninguém se esqueça que há sempre alguns prontos a repetir erros do passado, mesmo tendo na sua posse a informação que os deveria aconselhar não os repetir.

Se não é indiscriçã, gostaria de perguntar ao Olympus qual é a sua formação/profissão? Eu apesar de anónimo sou biólogo.

Anónimo disse...

os efeitos imediatos da não utilização de DDT na década de 60 eram conhecidos: - um aumento exponencial das picadas de Anopheles que assim infestavam os seres humanos na mesma proporção com os Plasmodia falciparum, vivax, ovale ou malarae, segundo a prevalência.

quanto aos efeitos a longo prazo da acumulação de DDT no organismo, são referidos os neurológicos e os que derivam da sua possível acção desreguladora endócrina diminuindo a fertilidade (muito questionável).

eu e dezenas de milhares de pessoas contactámos com as campanhas de pulverização com DDT (a célebre tifa) em Angola, durante a nossa meninice e adolescência.

se houve ou não consequências neurológicas ou de desregulação endócrina devido à exposição que tivemos a níveis elevados de DDT, só posso falar por mim, meus irmãos e irmãs, meus amigos e colegas - não conheço qualquer caso de infertilidade ou de perturbação neurológica na população adulta com quem continuei a manter contacto (este testemunho vale o que vale).

quanto aos efeitos imediatos, nas zonas pulverizadas deixámos de ouvir relatos de mortes de crianças (principalmente) devido ao paludismo como acontecia antes das campanhas, apesar dos tratamentos com o quinino e seus sucedâneos serem instituídos à época.

no final da década de 60 já ninguém utilizava as redes mosquiteiras para dormir.

Se houve resistência do mosquito ao DDT nesse período? É natural que após 6 anos de utilização os insectos tenham ganho resistência ao DDT. Mas a luta ininterrupta que foi efectuada na minha cidade (e regiões contíguas, Sumbe incluído) - enquanto a resistência não se instalou - permitiu baixar consideravelmente a circulação de Plasmodiae e consequentemente os casos de infestação humana (mecanismo bem conhecido que levou à extinção da doença noutras zonas do globo).

na altura os chineses já conheciam o efeito plasmodicida das artemisininas sobre o falciparum, mas só após os actos de espionagem americana para o efeito (na década de 80), se ficou a saber no ocidente que moléculas eram usadas e de que planta provinham, a Artemisia annua.

eu pasmo com a desumanidade de quem fala em custo benefício, quando está em causa a vida de milhões de seres humanos.

c´est la vie !?

Henrique Pereira dos Santos disse...

Caro último anónimo,
Com argumentações racionais é possível avançar na discussão.
Ponto prévio pessoal só para eliminar essa argumentação de desumanidade: só não vi o meu melhor amigo morrer de malária porque ao fim de mais de uma semana em delírio quase permanente lá se conseguiu safar. E conseguiu porque vivia em boas condições, tinha boa assistência médica e era bem constituído, mesmo depois de um acampamento de vários dias com maus cozinheiros. E só não digo que o vi delirar mais de uma semana porque nos primeiros dias dessa semana, eu próprio estava a contas com um ataque, felizmente bem mais suave, de malária.
Ou seja, sei suficientemente bem o que é a malária e os seus efeitos.
(continua)

Henrique Pereira dos Santos disse...

(continuação)
Posto isto, o que o aconselho é a ler os relatórios da Organização Mundial de Saúde sobre o assunto.
Verá que a erradicação da malária nos países temperados começa em meados do século XIX (evidentemente sem DDT, que só passa a estar disponível em larga escala imediatamente a seguir à segunda guerra mundial) e leva o empurrão final, com o DDT, logo a seguir à guerra. A erradicação foi um êxito nos países menos afectados pela doença e com maior desenvolvimento económico, mais estruturados organizacionalmente e com razoáveis cuidados de saúde.
Essa erradicação nos países mais ricos não teve paralelo nos países mais afectados, pesem embora alguns êxitos temporários em alguns países tropicais. A partir de certa altura (anos 50, 60) os programas de erradicação da OMS tiveram um recuo enorme nos países mais afectados, sobretudo em África (e qualquer pessoa se deveria perguntar por que razão a esmagadora maioria das mortes se dá em África se os efeitos do uso indiscriminado do DDT são globais) por razões financeiras, por razões organizacionais e, é bom não esquecer, porque a eficácia no uso do DDT diminuiu drasticamente face ao desenvolvimento de resistências nos mosquitos (para além da resistência aos remédios desenvolvida pelas estirpes do bicho que provoca directamente a malária).
Se for ler com atenção, os principais problema do uso indiscriminado do DDT prendem-se exactamente com o desenvolvimento de resistências nos mosquitos e com a contaminação da cadeia trófica, não tanto com os efeitos directos de exposição a concentração baixas de DDT (sim, também eu flitei quartos, começando das zonas mais longe da porta e recuando sempre no sentido da porta, que se fechava rapidamente e onde era proibida a entrada por umas horas, sendo depois amplamente arejados, e se é certo que ninguém já dormia com redes mosquiteiras, também é certo que todas as janelas da minha casa tinham uma rede que estava sempre fechada, embora permitindo abrir a janela de vidro).
O que os relatórios da OMS sugerem é que teria sido possível ir mais longe no controlo da doença se não tivesse havido abandono dos programas (provavelmente porque entretanto o problema ficou resolvido nos países ricos e as convulsões da descolonização africana não facilitavam o trabalho da OMS e dos serviços de saúde nacionais) mas não encontra em lado nenhum um simples indício de que o problema se teria resolvido com DDT.
Actualmente existe um esforço forte de controlo da doença, com fortes meios financeiros (incluindo da fundação Melinda e Bill Gates, reforçada com fundos do Warren Buffet), e com uso do DDT em meio fechado (ou seja, dentro de casa) integrado numa lógica de cuidados de saúde.
Por volta de 50% das mortes ocorrem em crianças até aos cinco anos de idade, entre outras razões porque são crianças frágeis, mal alimentadas, carregadas de doenças e má nutrição, sem cuidados de saúde adequados.
O que verdadeiramente mata é a fome e a pobreza. A malária é só um dos instrumentos.
Provavelmente o papel do DDT foi subestimado durante alguns anos, e há uma responsabilidade da cultura de catástrofe instalado no movimento ambientalista nesse ponto concreto.
Mas nada disso justifica as idiotices ouvidas por aqui a este respeito. Entre outras razões porque a responsabilidade do movimento ambientalista é ínfima face à responsabilidade da OMS, da insdústria farmacêutica e, antes de mais nada, aos governos desses países.
henrique pereira dos santos

Olympus Mons disse...

Parte I
Caro Anónimo I,
Vou terminar a minha participação, voltando a este post, para lhe afirmar o seguinte.
1. Mas que quer exactamente afirmar com o ir á internet investigar “vá à internet pesquisar sobre resistência a pesticidas por parte de insectos”? Que quer exactamente dizer com isso? Quer o anónimo dizer que países continuaram a usar o DDT ao longo destes anos todos, desde os anos 70, precisamente porque não funciona?
Quer o anónimo dizer que a OMS, Hoje em dia, aconselha (e revisto em http://malaria.who.int/docs/ecr20_annex1.htm) desde 2006 o uso de DDT porque os mosquitos são resistentes e o seu uso é inconsequente? É isso?
Na sua opinião, a OMS confirma a “inutilidade” do uso do DDT, HOJE, quando afirma…
“i) The urgent and immediate need of many of the malaria-endemic countries to maintain their reliance on the use of DDT for indoor residual spraying to control insect vectors, particularly malaria vectors, until viable, effective and affordable alternatives are found. This will ensure that the Convention does not result in sharp increases in malaria epidemics and deaths.3”
(http://www.chem.unep.ch/DDT/documents/WHO_positiononDDT.pdf)

Não me parece, que esta inversão lógica seja a sua perspectiva sobre o assunto. Ou pelo menos espero. Daí que o seu comentário seja essencialmente um strawman. O meu argumento era que o DDT era, e é, um mecanismo eficiente no combate à malária, cuja utilização foi minada pelos grupos ambientalistas . E o meu argumento reside especificamente na sequência de eventos e isso é que os torna relevantes, culminando no ressurgir do DDT no combate é Malária e no seu concreto aconselhamento de uso por parte da OMS. Este é o ponto! A exigência de um olhar com atenção e responsabilizador para o hiato temporal existente e a sua fraca utilização durante décadas é fundamentada por este fenómeno! Deu para entender?
----
2. Depois segue-se que afirmar que nada proibiu o uso do DDT para fins de prevenção, é uma falácia no contexto da realidade observada! Se de facto um conjunto corajoso de cientistas conseguiu, CONTRA A PRESSÃO DOS AMBIENTALISTAS, colocar esse caveat na “POPs Treaty” em stockholm, a realidade mostrou que muito por força dos organismos das Nações Unidas e sob pressão dos ambientalistas, tornar-se prática comum pressionar para o completo “phase-out” do uso do DDT, essencialmente nos países em desenvolvimento e subdesenvolvidos acoplado como condição sine qua non na atribuição de fundos (ou que os fundos não seriam usados de forma alguma para a compra de DDT) que aqueles tão desesperadamente necessitavam. Disso é usado como exemplo da Eritreia, com níveis altíssimos de fatalidades por Malária, a quem o Banco Mundial, a UNICEF e a USAID, atribuíam fundos mas… ““present by the end of the second year, a program and schedule for substituting DDT residual house-spraying by chemicals or techniques that are safer to the environment and human health.””
Pensa o caro anónimo que estas condições saiam da cabeça dos burocratas do Banco Mundial, ou eram o resultado prático do trabalho dos grupos ambientalistas? Que me leva ao último ponto.

(cont)

Olympus Mons disse...

Parte II

3. Rachel Carson foi pivoteal nestes eventos todos. Ela conjuntamente com muitos outros que nunca foram chamados á pedra, seja em que dose ou proporção seja, deviam tê-lo sido! Nada. E Rachel Carson e Silent Spring possuem, a meu ver, deliberadas (para alguém com a formação dela) falsas representações de palavras de terceiros, de estudos, quantidades aceitáveis e recomendadas, etc. que ela tinha de certeza saber serem falsas ou incorrectas ao ponto de esse facto constituir um argumento para se considerar que ela intencionalmente produziu um evento de propaganda, sendo isso um evento politico do qual ela (e outros) devia ter sido chamada á responsabilidade, talvez eu exagerando um pouco ao afirmar pena de prisão, quando naturalmente ela nunca foi sujeita a um processo judicial. Mas a inexistência de pelo menos a ideia de um processo judicial, ou pelo menos de uma severa reprimenda moral, á luz dos eventos que relato em 1 e 2, é que é uma vergonha.

4. É essa ideia dos grupos ambientalistas, do ““limpa lá a casa e deixa-os ir dormir”, que já não devia ser aceitável á luz do peso que hoje em dia a ecologia e os grupos ambientalistas detém nas sociedades actuais, em que são, por direito próprio, um parceiro politico de corpo inteiro. Ser parceiro político obriga a fenómenos de responsabilização que não se coadunam com a realidade observável ainda hoje em dia, disso sendo exemplo o Sr Al Gore, que comete as mesmas irresponsabilidades da Sra. Carson na abordagem aos temas.
Só o faz, porque os antecessores (as) nunca foram chamados á liça, nem moralmente, pelos actos de propaganda e pelo lobbying exercido, á semelhança do que se faz noutros aspectos políticos.


Um bem-haja para si e bom ano de 2010.

José M. Sousa disse...

O dito link da OMS que Olympus refere também diz:


«DDT no longer merits being considered the only insecticide of choice);»

Henrique Pereira dos Santos disse...

Caro Olympus Mons,
1) Gostaria de em primeiro lugar sublinhar a grandeza destes seus últimos comentários. Nem toda a gente tem a capacidade e a humildade para reconhecer que exagerou na argumentação e retomar a discussão numa base mais racional e isso merece ser sublinhado.
2) O uso do DDT em meio fechado que hoje é preconizado é substancialmente diferente dos programas de erradicação de malária que pressupunham o uso extensivo nas áreas de mosquito (incluindo o seu uso na agricultura). É exactamente este uso extensivo que permite o desenvolvimento de resistências e por isso o cuidado em que o uso seja em ambiente fechado e controlado. E é o facto de se ter parado esse uso extensivo quer permite manter a eficácia do DDT.
3) A sua visão sobre o peso dos ambientalistas e outros (incluindo a indústria química) nos processos de decisão parece-me claramente distorcido. Em primeiro lugar desde o início das proibições que ficou salvaguardado o uso para fins de uso público. Isso resulta do processo social de decisão onde cada grupo exerce as influências que acha o melhor para si e para o mundo. Penso que não lhe passa pela cabeça culpar os grupos anti-droga de um eventual exagero no banimento do uso de cannabis para fins terapêuticos. Corajosos não forma os cientistas maistream apoiados pela indústria e a inércia do business as usual, corajosos foram os que puseram o seu percurso profissional em risco para defender as suas ideias que, como sabe, eram no início ultraminoritárias (Silent Spring é de 1962, as decisões de Estocolmo de 1972 porque durante esses dez anos muita evidência científica foi produzida, não porque o peso político da Rachel Carson e do movimento ambientalista fosse dominante).
4) Não tenho problema em concordar consigo que na discussão muita gente distorceu e exagerou argumentos, de ambos os lados (tal como agora nas alterações climáticas, ou nos riscos económicos da descarbonificação da economia). Isso é humano (nós temos o estúpido hábito de cometer erros). Não me parece que o exagero do movimento ambientalista (incluindo eventualmente rachel carson) seja tão diferente do exagero do outro lado para merecer reprimendas, tanto mais que o exagero do outro lado tinha uma consequência prática também não negligenciável. Julgar moralmente a história, embora esteja na moda, é um disparate.
5) Basta ler o post que fiz e as suas referências, incluindo o Sr. John Costella, ou mesmo o Sr. McIntyre para se ter a noção de que os exageros do Sr. Gore, ou mesmo do IPCC (que existem e devem ser combstidos, veja-se a carta do Miguel Araújo e outros publicada pela Nature e que os negacionistas exibem como exemplo de literatura científica negacionista, o que evidentemente não é), dizia que os exageros de Gore ou do IPCC são uma brincadeira de crianças quando se comparam com as verdadeiras barbaridades, umas filhas da ignorância, outras da desonestidade, que todos os dias saltam do campo oposto.
Gostei de retomar a discussão numa base racional.
henrique pereira dos santos