quarta-feira, maio 26, 2010

Morte e extinção (II)

Imagem da necrópsia do macho de águia imperial abatido. O relatório da necrópsia pode ser lido aqui.
A propósito da águia imperial morta no ano passado e subsequentes discussões escrevi alguns posts há tempos, aqui e aqui, por exemplo.
O Secretário de Estado Ambiente terá dito este sábado:
A Ministra do Ambiente terá dito:
Vamos esquecer as justificações, que são meramente políticas e sem nada que as suporte, vamos admitir que há eventualmente algum exagero na contabilização (não sei se há) e mesmo assim o que vemos na evolução da águia imperial é exactamente o que tinha sido previsto neste blog (mas não pelas associações que usaram a dramatização do costume): a morte do macho de um casal de águia imperial é um caso de polícia, mas está longe de ser um problema importante de conservação.
Não tenhamos dúvidas: se as populações de coelho continuarem a recuperar como aparentemente estão, também recuperarão os predadores que lhe estão associados, incluindo o lince e o lobo ao Sul do Douro.
Esqueçam as estradas, as barragens, os fios eléctricos, a perturbação, a caça e essas coisas todas que pontualmente e em algumas circunstâncias podem de facto ter algum impacto porque o que estas espécies têm é fome.
henrique pereira dos santos

12 comentários:

Floripes disse...

caro Henrique,sou natural de Olhão e sei que todos os anos as aves que deviam ser protegidas na ria formosa ,morrem nas lagoas de decantação das ETARS,de Faro nascente e de Olhão poente. em anos passados fou divulgado o resultado da autópsias como sendo as aves vitimas de Botulismo, todos os anos as aves protegidas,morrem nessa lagoas e as aves que tem ido para ser autopsiadas numca mais se soube de nada,será que continuam a morrer de Botulismo.
não será um caso de saude publica,além de criminoso para as aves protegidas por lei pois a RIA Fomosa faz parte da rede natrua 2000 e da convencção de Ramsar.
agradecia a resposta.

Henrique Pereira dos Santos disse...

Lamento, mas não conheço o assunto com pormenor suficiente para ter opinião sobre ele. Tenho ouvido aqui e ali notícias sobre o assunto mas nunca olhei para ele com suficiente detença.
henrique pereira dos santos

Floripes. disse...

é pena srº Henrique, é pena, pois as aves todos os anos morrem na lagoas cheia de bactéria para onde as aves são atraídas, e com a chegada do verão ,mais uma centenas vão morrer e ninguém faz nada.
já agora se conhecer alguém que queira anilhar colhereiros conheço uma colónia na ria formosa que posso fornecer informação,e que fazem nidificação conjuntamente com garças de patas amarelas.

Anónimo disse...

Eu diria que Barrancos e a Idanha são zonas muito marginais do território português... estarmo-nos a gabar de que a águia voltou a Portugal só porque há algumas nessas zonas ultra-periféricas e quase espanholas, parece-me disparatado...

Luís Lavoura

Gonçalo Rosa disse...

Luis: "nessas zonas ultra-periféricas e quase espanholas..."

Espantoso!

Eu acho que o Henrique, por vezes, radicaliza o discurso, minimizando algumas potenciais ameaças que provavelmente terão impacte, mas o seu comentário, Luís, é bem demonstrativo do pessimismo sem fim com que muitos ambientalistas vêm a conservação da natureza no nosso país.

Deixe que lhe diqa que, lá pelo início da década de 90, quando era sócio da Quercus, muitos dirigentes desta associação apresentavam o Tejo Internacional como um último reduto para muitas espécies próximas da extinção - a Águia-imperial, real e Bonelli, o Abutre-preto e do Egipto, o Grifo, a Cegonha-preta. Uns vinte anos depois, quase todas evoluiram positivamente (exceptuando abutres-do Egipto, cuja população decresceu e eventualmente cegonhas-pretas, em situação estável.

Que razões há para tanta negritude?

Gonçalo Rosa

João Branco disse...

Caro Henrique

Quando só existe um casal de águias num país e se abate o macho a tiro, está a desaparecer 50% do efectivo da espécie. Por isso acho relevante o acontecimento em termos de conservação.
Mesmo agora, se há cinco casais a nidificar, se for abatido um exemplar desaparece 10% do efectivo da espécie. Continua a ser relevante.

Henrique Pereira dos Santos disse...

Caros Luís Lavoura e João Branco,
verdadeiramente disparatado é considerar que existem populações portuguesas destas espécies.
Existem populações ibéricas que em função das variações das suas áreas de distribuição aparecem em Portugal ou não.
O resto é irrelevante.
Por isso me estou nas tintas (tirando o facto de ser um caso de polícia que deve ser resolvido como qualquer caso de polícia) para que seja morto 50% do efectivo da espécie em Portugal (está enganado, o efectivo da espécie é maior que o número de indivíduos pertencentes a casais nidificantes).
Como o tempo veio demonstrar não é dessa morte que depende a dinâmica da população, mas sim de factores mais gerais que afectam a população ibérica.
E esses estão do lado das espécies nesta altura.
Podem mudar, mas para já, estão do lado destas espécies.
Gonçalo,
Eu radicalizo o discurso? Mas quem é o radical aqui: quem se limita a expressar uma opinião sem nenhum impacto concreto na realidade ou quem usa o discurso das ameaças para afectar ao que lhe interessa recursos que fazem falta noutros lados?
henrique pereira dos santos

Gonçalo Rosa disse...

Henrique,
Quando disse que radicaliza o discurso, referia-me ao facto de minimizar potenciais ameaças que, em diversos casos, são bem mais que potenciais. Admito que "radicalizar" seja uma expressão mal escolhi, mas acho que extrema o discurso.
De resto, estamos de acordo que existe uma verdadeira cegueira quanto à importância de alguns factores mais "chocantes", como o furtivismo, o embate em linhas/estruturas de transporte e distribuição de energia eléctrica ou a mortalidade em aerogeradores, em detrimento de outros, bem mais silenciosos, como as alterações do habitat ou decréscimos drásticos de populações-presa, mas não raras vezes a afectarem boa parte das populações de espécies ameaçadas. E o problema, como diz, é que com tais cegueiras, combate-se o acessório e esquece-se o essencial.
Gonçalo Rosa

Henk Feith disse...

O Henrique tem toda a razão do mundo. Já tentei remar um pouco contra a corrente do fatalismo ambiental num post recente, mas a realidade vai nos esfregando notícias positivas na cara. Desde esta primavera Portugal conta com mais uma espécie de ave nidificante, o flamingo (o que por sí não diz nada porque como quase todas as (re-)ocupações das últimas duas décadas são consequência das expansões das suas populações ibéricas (e são muitas), sinal da recuperação dos ecossistemas ibéricos. Nada nos leva a crer que esta tendência se inverterá. Motivo para alegria e otimismo, no meu ver.

É altura de olhar para a biodiversidade como um desafio e um espaço de trabalho, onde se consegue fazer milagres ao metro quadrado. Em vez de nos deprimir com a perda dos corais no Pacífico (sinceramente, deve ser um problema enorme, mas não consigo ficar acordado de noite a pensar no problema), mostra o que acontece por cá e ensina nos o que cada um pode fazer para empurrarmos a biodiversidade para frente. É isso que espero das nossas ONGA e dos nossos investigadores.

Henk Feith

Miguel B. Araujo disse...

Caro Henk, Este inverno fez frio. Muito frio. Acontece que foi o quinto inverno mais quente do registo histórico a nível global. É sempre bom olharmos mais além do nosso próprio quintal para fazermos afirmações com valor geral. Miguel

Henk Feith disse...

Caro Miguel,

Não sou negacionista. Nunca me canso a dizer que os problemas existem. Mas o que tu queres que eu faça com a notícia que foi o quinto inverno mais quente desde que haja registos? Eu digo-te: limito-me a juntá-la na gaveta dos irresolúveis que já transborda de tantas outras que recebo permanentemente.

Sou um otimista por natureza (isto torna-me um outlier social, bem sei). Veja sinais positivos e oportunidades por toda a parte. Se assim não fosse, não estaria empenhado em promover a biodiversidade e a sustentabilidade, à minha modesta escala. À medida que a escala aumenta, perco relação emocional com os problemas. E acho que é totalmente irrelevante eu preocupar-me com a perca dos corais. Não resolve rigorosamente nada.

Miguel: já seria muito bom se eu conseguir resolver alguns dos problemas no meu quintal. E tenho confiança que haja gente capaz de resolver o problema dos corais ou outros assim.

Henk Feith

Anónimo disse...

Eu penso que o Henrique tem razão: as aves não conhecem fronteiras e é largamente irrelevante saber se uma determinada ave que aparece em Barrancos faz ninho do lado português ou espanhol. E foi isso que eu pretendi focar com o meu comentário anterior: que é disparatado afirmar que há uma determinada ave em Portugal quando ela só aparece numa região ultra-periférica do país, mesmo junto à fronteira com Espanha, porque essa ave que aí aparece deve-se essencialmente a condições favoráveis que apenas ocorrem, precisamente, em regiões periféricas do país.

Para mim tem muito mais significado saber que existem linces no Algarve, por exemplo, do que na serra da Malcata. Os linces do Algarve refletem boas condições de conservação no país, os linces da Malcata refletem, em grande parte, boas condições ambientais num território que é em larga medida espanhol.

E o que é verdade para linces, muito mais verdade é para aves.

Isto não pretende retirar mérito a projetos de conservação como o do Tejo Internacional. Pretende é dizer que, se os espanhóis ao pé do Tejo virem por lá grifos, não poderão possivelmente gabar-se deles, pois os méritos estarão talvez em esforços do lado português da fronteira.

Luís Lavoura