A primeira questão é: prioridades a que escala? E prioridades para quem?
Vou esquecer as prioridades a escalas muito globais: não tenho informação suficiente para ter uma opinião muito clara. O para quem veremos ao longo do post.
Do ponto de vista de conservação é em primeiro lugar preciso clarificar que a mudança é inerente aos processos naturais. E que essa mudança está em permanente mudança.
Portanto antes de mais é preciso perceber que variações para melhor ou pior em espécies ou sistemas são o normal. Excepcional é a estabilidade.
O que significa que o fundamental é olhar para os processos em detrimento da realidade em cada momento.
Em Portugal (aqui incluindo o que está para lá das fronteiras e se reflecte cá dentro), do ponto de vista expresso acima, é preciso olhar para as principais forças de modelação da paisagem e, a partir daí, perceber o que se vê em cada momento.
O que temos é um processo de razoável estabilidade demográfica, com forte expansão urbana e infra-estrutural, com abandono agrícola acentuado e com alteração da exploração da terra de sistemas mais intensivos para sistemas mais extensivos. Isto para a generalidade do território, com importantes excepções.
Daqui resulta uma contracção das clareiras e espaços abertos e uma recuperação notável da vegetação e dos sistemas naturais. O que significa uma maior dificuldade para as espécies que dependem do campo aberto e uma menor dificuldade para as que dependem da mata e de sistemas mais fechados.
Acresce que a pedra base dos sistemas tróficos existentes, o coelho, um animal de clareira, foi devastada por duas doenças brutais.
Este é o quadro que temos e do qual resulta que a primeira prioridade de conservação no país é recuperar as populações de coelho. A segunda, é manter a relação espaço aberto/ espaço fechado em níveis que permitam o refúgio das espécies dependentes do espaço aberto.
Significa que devem ser estas as prioridades das ONGAs?
Não, as ONGAs são grupos de interesse e as suas prioridades devem ser definidas em função do interesse dos seus sócios e não das prioridades de conservação do país.
Naturalmente uma ONGAs que resolve conservar a libelinha das bolinhas amarelas terá o número de sócios, e os recursos correspondentes, ao das pessoas que se interessam pela libelinha das bolinhas amarelas.
O que é grave é quando as ONGAs dizem que defendem a conservação em termos genéricos mas depois não sabem explicar por que razão na sua agenda este assunto está acima ou abaixo de outro (por exemplo nas vinte cinco espécies que a QUERCUS considera prioritárias é impossível saber por que razão a Leuzea longifolia, que nem sequer está especialmente ameaçada, está acima de muitas outras espécies da flora). E mais grave se torna quando com argumentos falaciosos capturam recursos públicos para as suas indiossincrasias.
O que leva a uma prioridade constante dos programas de conservação a todos os níveis, sobretudo tendo em atenção a mudança permanente: a correcta avaliação de resultados que permita uma gestão adaptativa.
E, pessoalmente, me leva a interessar-me mais pelas ONGAs que colocam no topo das suas prioridades a custódia sobre o território, isto é, a capacidade de tomar decisões de gestão sobre o território que assentam em compromissos de longo prazo apenas dependentes da vontade e dos recursos da organização.Estamos longe disso. E eu tenho pena de que assim seja.
henrique pereira dos santos
3 comentários:
Henrique, para alguém como tu normalmente tão focado no pragmatismo este texto resvala perigosamente para uma vertente mais filosófica e metafísica...
A mim os comentários parece-me pertinentes, mas a montante desta discussão parece-me estar uma questão conceptual relacionado com aquilo que se espera do esforço concervacionista e que raramente vejo ser debatida com pés e cabeça.
No limite a questão pode ser resumida à simples pergunta: "Qual a diferença entre um formigueiro e uma cidade?".
Alexandre Vaz
Henrique, Não vejo muito bem onde está a resposta à pergunta: prioridades para quem?
Vejo que explicas o que julgas serem para ti as prioridades. Mas era aí que querias chegar?
Miguel,
Pensei que o texto era claro em identificar três níveis: o nacional, que deveria corresponder ao interesse público e consequente afectação de dinheiros públicos; o das organizações que trabalham no assunto e que deveria orientar a afectação de recursos das organizações; e o pessoal que explica as minhas próprias preferências.
Procurar escrever textos curtos em pouco tempo tem estes riscos.
henrique pereira dos santos
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