Esta é a segunda questão marginal emergente da discussão das escolas.
Eu compreendo quem defende que o abandono agrícola é uma questão inexorável e que além disso não há razão nenhuma para gastar dinheiro público com a meia dúzia de pessoas que ainda por lá andam e que irão acabar daqui a meia dúzia de anos.
Acho perfeitamente razoável esta posição e é parcialmente verdade que este processo permite a recuperação dos sistemas naturais demasiado simplificados e domesticados pelos últimos dez mil anos de esforço em os manipular a favor da nossa espécie.
O que não compreendo é a posição intermédia que acha que isto é só um problema das aldeias e que as vilas e alguns centros urbanos intermédios são socialmente úteis e viáveis, devendo concentrar-se aí o dinheiro público disponível. E não compreendo que se omita o custo social do processo de transição de um território povoado como está hoje e o futuro radiante que vem aí com o abandono rural.
Qual é o contributo da maioria dos centros urbanos que temos em Portugal para a nação?
Se retirarmos a riqueza que resulta do emprego criado pelo Estado (serviços camarários, escolas, centros de saúde, GNR, serviços sociais, bibliotecas e por aí fora) o que sobra de verdadeira criação de riqueza?
Sobra a construção civil (que vive dos rendimentos deste eemrpego artificial e das remessas de quem trabalha noutros lados), sobra o comércio e serviços (que vive da riqueza criada por este emprego artificial) e pouco mais.
Há aqui e ali alguma indústria, algum turismo e pouco mais.
O pouco mais são os serviços de proximidade que estes centros urbanos sempre prestaram aos verdadeiros produtores de riqueza que existiam no seu hinterland, produzindo alimentos e fibras.
Portanto, para quem entenda que é mais razoável ao país abandonar o território que usá-lo (porque os solos são pobres, um argumento típico dos anos 50 do século passado quando produzir mais era aumentar quantidades produzidas e ainda vinha longe a ideia de que criar valor pode ser conseguido com diferenciação e nem sempre com aumento de produção) não faz sentido defender o investimento na maioria das sedes de concelho do país.
E não faz sentido defender a despesa em combate aos fogos, por exemplo, uma consequência desta opção. Nem faz sentido defender alternativas económicas com base no turismo, dada a uniformidade de paisagem e a perda de diversidade cultural inerente a esta opção e a vantagem competitiva que Portugal tem no sector, quer pela sua diversidade, quer pela simpatia no contacto com as pessoas, quer pela diversidade e qualidade gastronómica.
A quem defender coerentemente o que acima está dito não tenho mais que dizer que intelectualmente é uma ideia interessante, socialmente é inaplicável.
E explicar que há um conjunto de serviços que uma boa parte dos produtores primários prestam a toda a comunidade e que o mercado não valoriza (ou valoriza em economias que não remuneram os seus produtores, por exemplo a paisagem, remunerada aos agentes turísticos e não aos seus produtores) como a variedade paisagística, a diversidade cultural, a diversidade biológica, quer a que decorre da diversidade paisagística, quer a que decorre do uso de variedades localmente adaptadas, o controlo social do território, a gestão de combustiveis, etc..
A questão é pois a de saber se o sobrecusto por aluno que está associado à educação dos filhos desta gente não é a mais que justa retribuição que as comunidades mais ricas devem a quem se dispõe a produzir tanta coisa pela qual não cobra.
A resposta provavelmente não sim ou não, a resposta provavelmente é: talvez, dentro de determinados limites.
O que gostava de perceber é se alguém fez as contas ao que um rebanho de cem cabras nos poupa em sapadores florestais. Ou em despesas de combate aos fogos.
Suspeito que não. Nem essas nem as outras que dizem que não há dinheiro para suportar algum sobrecusto com uma rede escolar adaptada às necessidades dos produtores de riqueza em comunidades com povoamento esparso.
henrique pereira dos santos
2 comentários:
É esta a cegueira, de facto.
Henrique, ainda ontem saíu no JN que a EB1 de Várzea de Abrunhais vai fechar http://jn.sapo.pt/paginainicial/interior.aspx?content_id=1588580
"Vencedora do Concurso Mundial de Escolas Inovadoras 2009, pelo trabalho de inovação pedagógica a partir das Tecnologias da Informação e Comunicação, a EB1 de Várzea deve ser uma das que mais meios informáticos possuem actualmente. Para além dos "Magalhães" de cada um dos 23 alunos, a escola possui mais nove de reserva, oito computadores de secretária e dois portáteis, para além de dois quadros interactivos com a Plataforma Camões que sincronizam com os computadores individuais dos alunos e rede de Internet sem fios. Ou seja, tudo muito à frente, numa aldeia do interior do país."
Mas é também toda essa multiplicidade de factores que aqui descreves e muito bem.
Não conhecia, João Soares, este exemplo elucidativo do absurdo.
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