Quando por estes dias ruiu o conto de fadas sobre os fogos construído pelo Governo nestes últimos anos, de que o dispositivo tinha melhorado muito e por isso tinha descido a área ardida, como demonstravam não só os números globais como ainda a relação entre o número de fogos e a área ardida total, foi preciso rapidamente encontrar novas linhas de comunicação.
A tecla agora era que o dispositivo aguenta 250 ignições por dia (se não forem muito concentradas) mas Portugal tinha um enorme problema de ignições a que era impossível responder.
Esta linha de comunicação traduziu-se em variadíssimas notícias sobre incendiários, detenções e outras coisas que tal, culminando neste fim de semana com o Expresso a publicar uma entrevista com Gil Martins (de resto, interessante) titulada "A floresta não arde sozinha" e as quatro lamentáveis páginas do Público, totalmente governamentalizado nesta área, que incluem esta delicada subtileza de raciocínio de Manuel Carvalho "é certo que uma fatia importante dos fogos tem mão humana e criminosa, como atesta o facto de 38% das ignições acontecerem durante a noite" (aparentemente Manuel Carvalho nunca ouviu falar de ignições retardadas, mas isso é lógico para um jornalista que só acompanha o sector florestal há mais de dez anos).
Como corolário a Autoridade Nacional de Protecção Civil passou a incluir na informação diária não só o número de fogos, como também o número de fogos diurnos e o número de operações dos meios aéreos, para as pessos perceberem bem que está tudo bem do lado do dispositivo, mas não se pode governar este povo de pirómanos infrenes.
Ora foi com essa informação que construí o gráfico que se segue.
Principal conclusão?
Não só há muitos incendiários como são estúpidos como uma porta, porque a percentagem de ignições nocturnas dispara quando não há condições para grandes fogos (havendo inclusivamente previsão de chuva).
henrique pereira dos santos
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
3 comentários:
Não está a ver bem caro cronista.
Puxar fogo à noite reduz a probabilidade de ser apanhado e aumenta a probabilidade do fogo não ser apagado rapidamente.
De resto, quem disse que os incendiários são animais 100% racionais?
E já agora qual a teoria para os fogos à noite? Rescaldo? Se for essa, santa ignorância. Muitos fogos à noite começam em localidade onde não houve incêndios recentes. Posso afirmá-lo pois já vi vários começarem assim.
Parece-me que não terá reparado que o post não diz nem que não haja fogo posto, nem que parte dos fogos nocturnos não sejam fogo-posto.
O que não diz, embora esteja implícito no gráfico, é que os fogos nocturnos, como os outros, acompanham as condições meteorológicas.
Se ler os comentários dos posts sobre ignições reparará que se tentou explicar o aumento de ignições com a ideia de que os incendiários sabem que são os melhores dias e portanto aumento o esforço inciendiarista.
O que o post vem dizer é que a proporção de fogos nocturnos, quando as condições são menos favoráveis à existência de grandes fogos, para surpresa minha (estaria à espera que se mantivesse entre os trinta e quarenta por cento do resto do tempo), sobe significativamente.
Ora admitir que todos os fogos nocturnos são fogo-posto significa que estes dados teriam de ser interpretados no sentido dos incendiários fazerem um maior esforço relativo em condições que qualquer criança sabe que não dão origem a qualquer fogo relevante.
Parece-me um evidente contra-senso.
Quanto à sua segunda questão.
Se falar com quem anda a cuidar de fogos há muito tempo e é cuidadoso na análise dos factos, ficará facilmente a saber que muitos dos fogos nocturnos se verificam em zonas onde houve actividades durante o dia (limpeza de matos, actividades com máquinas e muitas outras possibilidades). O que provavelmente acontece (tanto em consequência das actividades, como de descuidos, seja por cigarros mal apagados, seja outra coisa qualquer do género), é que ficou no terreno um pequeno foco de ignição a morrinhar, pelo qual ninguém deu e de noite, numa virado do vento qualquer, a brasa, por pequena que seja, é soprada e deflagra em chama.
É por isso que a meteorologia explica as ignições em mais de 90%: é que este tipo de coisas, que acontecem permanentemente, em algumas condições meterológicas mais extremas localmente, tornam-se muito frequentes (e próximas, outro sintoma que costuma ser associado a fogo-posto mas que não é assim tão linear).
O post limita-se a dizer que há mais mundo que estas asserções simples e por isso repito: tanto quanto sei, ninguém estudou seriamente as ignições nocturnas. Mas alguns factos são dificilmente compativeis com a ideia de que todos os fogos nocturnos (ou a esmagadora maioria) têm em origem em fogo-posto.
E sim, muitos são reacendimentos. O rescaldo em Portugal é especialmente mal feito, diz o Paulo Fernandes, que sabe mais disso que eu, e eu tenho comprovado. Outros serão fogo-posto.
Só que o essencial não é isso e por isso tenho insistido nestes posts.
Com base nestes pressupostos vamos reforçar os mecanismos de polícia e os de informação, quando o problema é a acumulação de combustível.
Que o dispositivo está melhor, dou de barato.
O que este ano demonstra, coisa que tenho vindo a dizer há anos, é que isso não resolve o problema, sendo susceptível de o agravar se as melhorias do dispositivo não forem acompanhadas de verdadeiras medidas de gestão de combustíveis.
Os incendiários no meio disto tudo não passam de uma manobra de diversão e têm muito menos importância do que aquela que lhe é dada.
henrique pereira dos santos
Caro hps:
Penso que o número de incêndios nocturnos está relacionado com outros factores:
1- perfil psicológico dos incendiários (solitários e alcoólicos); quando noite cai a cabeça está tolhida pela solidão e pelo vinho
2- à noite a mobilização dos meios é inferior e a capacidade de resposta imediata é diminuta (ñão há meios aéreos)
3 - quando as noites estão quentes, o bicho-incendiário frequenta mais a rua.
Explicações adicionais ao porquê dos fogos nocturnos é ciência bacoca!
Ass: o incendiário!
Enviar um comentário