Ontem com o Público vinha uma revista chamada Recicla, da sociedade Ponto Verde (será que faz sentido a sociedade Ponto Verde ter uma revista institucional a distribuir com o Público? É isso uma adequado uso da taxa que todos pagamos para a reciclagem e o tratamento de resíduos?).
Nela há uma entrevista da Luísa Schmidt que se recomenda.
E há uma resposta notável a uma pergunta banal (o facto de ser banal não invalida a razoabilidade da pergunta na entrevista): "Que balanço faz do Ano Internacional da Biodiversidade em Portugal?"
A primeira frase é o que seria expectável de Luísa Scmidt "O balanço é negativo". A fundamentação está ao nível do que é hábito nestas opiniões muito assertivas de Luísa Schmidt: "As efemérides são sempre importantes, blá blá, fizeram-se alguns estudos, blá ,blá.". E depois começa o que realmente me interessa: "No entanto, e na prática, o que aconteceu às áreas protegidas é deprimente (o uso de adjectivos é especialmente interessante, sendo parte integrante da atracção pelo que escreve Luísa Schmidt. A par dos trocadilhos fazem parte do engraçadismo que nas suas opiniões substitui o trabalho e análise ponderada, tornando-os uns textos muito agradáveis de ler e bastante irrelevantes). A última reforma foi absolutamente nefasta. A verdade é que estão mais desprotegidas do que há dois anos: têm menos técnicos no terreno, menos capacidade económica, menos visibilidade e estão mais degradadas".
Deixem-me ser bruto com Luísa Schmidt como ela é com quem lhe apetece: isto é um chorrilho de disparates e uma resposta completamente idiota à pergunta que é feita.
Ao contrário de Luísa Schmidt, que diz de terceiros coisas semelhantes ao que eu agora disse de uma resposta dada por si, mas com mais elegância e piada, é certo, o que disfarça com frequência a violência do que diz, vou tentar fundamentar esta minha opinião em questões objectivas e verificáveis.
Em primeiro lugar, reduzir a prática da conservação da biodiversidade às áreas protegidas não faz o menor sentido. Em segundo lugar, comparar a gestão das áreas protegidas em dois momentos separados por dois anos, atribuindo tudo o que se passa a um facto ocorrido há quatro anos não tem ponta por onde se lhe pegue. Mas estas duas questões, não sendo marginais, têm ainda em si um grau de incerteza que permite interpretações criativas como as de Luísa Schmidt.
O resto é que é de cabo de esquadra.
Vejamos as razões objectivas invocadas por Luísa Schmidt para tirar a conclusão de que a última reforma do ICNB "foi absolutamente nefasta".
"têm menos técnicos no terreno"
O que tem este aspecto com a reforma levada a cabo? Nada, rigorosamente nada. Aliás, se tivesse alguma coisa, seria exactamente no sentido de que haveria mais técnicos no terreno porque alguns anteriores dirigentes passaram a técnicos, melhorando substancialmente o rácio de dirigentes por técnico. Ora isso pode implicar uma gestão pior por sobrecarga dos dirigentes, mas em caso algum tem como consequência a existência de menos técnicos no terreno. Na verdade até podem existir menos técnicos no terreno, mas isso deve-se à política de José Sócrates para a funçao pública em geral (eu sou um exemplo disso, mas há mais, muitos mais técnicos que se cansaram de aturar as tolices nesta matéria e ou se reformaram, ou usaram outros mecanismos de saída da função pública,sem que fossem substituídos). No máximo, e mesmo assim marginalmente, deve-se também à sensação de irrelevância da política de conservação neste governo, mas isso não decorre da reforma do ICNB mas das opções políticas deste Governo.
"menos capacidade económica"
O que tem isto com a reforma do ICNB? Zero. A capacidade económica das áreas protegidas resulta das decisões que todos os anos são tomadas no orçamento do Estado (que como se sabe são influenciadas pela conjuntura económica). Portanto atribuir isto à reforma do ICNB é simplesmente uma tontice.
"menos visibilidade"
Não vou discutir este argumento. Não tenho, nem eu, nem Luísa Schmidt, a menor informação objectiva sobre o assunto, quer de alterações nos últimos dois anos, ou quatro, ou seis ou sessenta. É o único destes argumentos cuja lógica de ligação à reforma do ICNB se pode admitir, argumentando-se que um director em cada área pode ter maior capacidade de comunicação. Claro que avaliar as autonomias que em Espanha têm, com bons resultados, o modelo de gestão de áeas protegidas adoptado para o ICNB está fora de causa, que ainda estragaria o argumento.
"estão mais degradadas"
Estão mais degradadas sob que ponto de vista? E avaliadas com base em que critérios? Claro que ninguém sabe responder. Mas se avaliadas do ponto de vista da recuperação dos sistemas naturais, o mais provável é que as áreas protegidas, não por causa das políticas de conservação, mas porque essas são as tendências sócio-económicas, estejam melhores. Essa é pelo menos a tendência geral do território. Avaliadas sob critérios de gestão da organização, o mais natural é que estejam como estão há muitos e muitos anos: mal, muito mal.
Sem registo, sem monitorização, sem formalização de instrumentos formais de gestão (planeamento e reporte), sem vigilância, sem visitação de qualidade e por aí fora.
Pretender que isso se deve à reforma do ICNB e não que a reforma decorre do reconhecimento dessa situação "é ideia que não cabe cá nas minhas".
henrique pereira dos santos
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