"Além da questão da postura das ONG ambientais, a proposta em si não lhe merece análise? Numa altura em que estamos novamente sem soluções para o cadastro não acha que abdicar destes licenciamentos é desperdiçar uma boa fonte de informação que pelos vistos já há (finalmente)alguém encarregado de compilar?
Considero que há ainda muito espaço para a área de eucalipto crescer em Portugal, mas gostava de saber onde e como, em vez de dizer que sim por todo o lado. Pelo menos uma vez gostava de ouvir alguém do lado das
celuloses (não é o seu caso) dizer explicitamente onde é que acham que NÃO se deve/pode plantar. Na minha opinião a única coisa que falta à floresta portuguesa e aos seus donos, é uma carta de ordenamento florestal nacional, aplicável à escala municipal, que diga onde e como se planta e o quê, não me parece assim tão complicado, no máximo restringe a liberdade individual dos proprietários de fazerem asneiras. Muito mais simples e barato do que a metodologia actual de:
1-Licenciar mobilizações de solo pelas autarquias, que apesar de terem gabinetes técnicos pagos pelo seu amigo FFP, muitas vezes não sabem o que é uma ripagem ou licenciam "surribas" (não-técnica de mobilização de solo que consiste em "sachar" com uma retroescavadora) que é a forma usada pela esmagadora maioria dos proprietários, sem condicionantes. 2- Parecer da CCDR, em caso de REN ou RAN, cujas condicionantes não são fiscalizadas pelas autarquias e de forma mais ou menos simultânea com o parecer da AFN cujo parecer ao plano previsional recentemente exigido é invariavelmente positivo.
A questão não se resume à espécie a plantar, mas também à técnica de mobilização do solo, que tem efeitos potencialmente nefastos, ou não? quem fiscaliza se não há lugar à identificação do responsável? Vejo todos os dias situações que configuram ilegalidades a este nível (mobilizações), com esta lei, o que estamos a fazer é assumir que uma vez que não conseguimos fiscalizar legalizamos! tudo!
Termino só dizendo que já existe muito eucaliptal abandonado, improdutivo, e os seus donos investem tanto na sua reconversão como os donos do pinhal na sua condução, zero.
Espero sinceramente que mais alguém venha "atiçar este lume", salvo seja e que não venha vento leste."
A citação foi longa mas merece. É um bom comentário, cordato, razoável e com substância.
E sinto-me na obrigação de responder.
Na verdade escrevo cada vez menos aqui (e noutros lados) porque estou cansado de estar permanentemente a nadar contra a corrente. Talvez tenha nascido para salmão mas que cansa, cansa.
Se hoje fiz um segundo post sobre a discussão de ontem do regime de arborizações foi porque senti que tendo manifestado uma opinião tão crua e crítica tinha a obrigação de a fundamentar um bocado mais.
E se respondo a este comentário fazendo este post é porque também sinto a obrigação de explicar por que razão não escrevi nada sobre a proposta em si.
Ontem fiz uma curta intervenção na discussão apenas para dizer: 1) que não fazia sentido obrigar a autorização as florestações abaixo de cinco hectares nas áreas protegidas. Ou se entende (como é a minha opinião) que as autorizações para estas arborizações não são determinantes para a conservação dos valores, e nesse caso está-se a manter uma burocracia pouco útil, ou se entende que as autorizações são fundamentais e, nesse caso, dever-se-iam aplicar à rede natura e não às áreas protegidas; 2) que mais uma vez o Estado estava a promover a concorrência desleal da floresta aos seus usos alternativos, com a pastorícia à cabeça, por simplificar os procedimentos da floresta e manter o kafkiano Regime de Excercício da Actividade Pecuária que torna mais difícil uma cabra ir de uma aldeia para outra que eu ir daqui para Pequim.
E de facto não me parece que o diploma valha muito mais tempo perdido.
Penso que o diploma, tal como está, dificilmente passa num conselho de ministros de tal modo é frágil na articulação com o resto da legislação. À boa maneira de florestal despachado alguém achou que a boa técnica de fazer o diploma era decidir e depois dizer aos outros que se amanhassem. Se uma avaliação de impacte ambiental demora 90 dias, ou se a legislação do domínio hídrico prevê 45 dias para a emissão de um parecer, bastava que para as florestas ficasse dito que era tudo em trinta dias e os pareceres em 15 porque evidentemente a floresta não pode estar à espera dos outros valores sociais em presença.
Como se sabe a política florestal não é uma política social mas uma emanação divina e portanto não tem de prestar vassalagem a coisas sem importância como, por exemplo, o resto da legislação existente. E como os actores do sector batem palmas não se vê por que razão não deva ser o sector a definir as melhores regras para si mesmo.
Só que as florestas são uma coisa importante demais para serem entregues aos florestais e portanto julgo que o diploma, tal como está, dificilmente verá a luz do dia.
Mesmo que veja a luz do dia ele apenas servirá para facilitar a vida a quem gere bem os seus povoamentos: a indústria de celulose e meia dúzia de grandes proprietários, os únicos que ainda se preocupam em cumprir a legislação actual. E desse ponto de vista é positivo por acabar com uma discriminação negativa a quem melhor serve o sector (quando o pessoal do pinho e do mobiliário protestar nestas discussões apetece-me logo perguntar-lhes quantos hectares de pinho gere cada serração ou fábrica de móveis para garantir o abastecimento, como faz a celulose)
De resto a grande maioria dos intervenientes na floresta estar-se-ão nas tintas quer para o diploma actual quer para o que vier. E as suas decisões serão comandadas essencialmente por factores sócio-económicos.
Na minha pequena consultoria ao sector tenho afirmado, e reafirmado, que me faz confusão como a indústria de celulose, que gere apenas 150 mil hectares, se deixa enrolar pela incompetência de gestão da maioria dos outros 600 mil hectares de eucalipto (dos quais um décimo de cerca de dois ou três hectares são meus, sendo que sou o único dos dez irmãos que sabe minimamente onde são as estremas da propriedade, dividindo-se os outros entre os que não fazem a mínima ideia de como se vai à propriedade, os que têm uma ideia de como se lá vai mas não garantem que lá chegam e os que sabem lá chegar mas não fazem ideia das estremas).
A grande maioria do eucaliptal, tal como o resto da floresta em Portugal, é mal gerida, na melhor das hipóteses, ou não é gerida, na maior parte das vezes.
Ora isto não é nada que se resolva na lei.
Isto resolve-se no terreno, com instrumentos económicos (o principal dos quais a rentabilidade dos povoamentos, que integra a percepção de risco face ao fogo) e com capacidade técnica de extensão rural, próxima dos agentes. Devo dizer que não entendo a passividade das celuloses perante este problema, que poderiam ajudar a resolver e que os impacta negativamente de forma brutal, nomeadamente por via regulamentar, com legislação que responde mais aos fantasmas do movimento ambientalista e ruralista que à realidade da produção florestal.
Por isso discutir esta proposta de lei é para mim marginal.
Os turcos estão a trepar pelas muralhas e nós estamos a discutir uma lei de arborizações.
Serão precisos dez dias de vento Leste para toda a discussão se voltar a reposicionar.
Quanto tempo demorará até essa tragédia é matéria que me escapa.
Que seja precisa essa tragédia para finalmente haver um nova oportunidade para repôr a gestão florestal no seu lugar é uma tristeza que me acompanha.
henrique pereira dos santos
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