sexta-feira, agosto 01, 2008

Guia de Leitura do Novo Regime Jurídico da Conservação

Inicialmente escrito a pensar nos meus colegas que me pediram para ajudar a uma leitura geral do novo regime jurídico da conservação fiz uma escolha pessoal de aspectos que me pareceram significativos.
Não é pois um comentário jurídico (para o que de resto me faltaria competência) mas apenas a simplificação de um conjunto de normas jurídicas cuja forma no diploma torna difícil aos leigos perceber o que significam na prática.
Volto a repetir, com base numa leitura pessoal do diploma.
Aspectos mais significativos:

  1. A formalização de uma Rede Fundamental de Conservação da Natureza que integra as diferentes figuras de protecção dos recursos. Merece destaque a integração da Reserva Agrícola Nacional nesta rede fundamental que vincula a protecção do solo agrícola à política nacional de conservação da natureza;
  2. São simplificadas as categorias de áreas protegidas em Parques Nacionais, Parques Naturais, Reservas Naturais, Paisagens Protegidas e Monumentos Naturais. Todas estas categorias, com excepção dos Parques Nacionais, podem ser classificadas a um nível nacional, regional ou local;
  3. Merece destaque o facto das paisagens protegidas colmatarem uma lacuna nos instrumentos de protecção da paisagem enquanto tal, que não existiam no direito interno, sendo a anterior designação de paisagem protegida usada inadequadamente para as áreas locais, independentemente do fundamento da sua classificação;
  4. São clarificadas as responsabilidades de gestão em função do nível nacional, regional ou local das Áreas Protegidas;
  5. É também clarificado o procedimento de classificação podendo qualquer pessoa ou entidade propor a classificação de uma área protegida, estando definidas as peças que devem instruir o processo;
  6. Merece destaque o facto de pela primeira vez ser explicitamente obrigatório o diploma de criação da área protegida conter a definição dos “recursos financeiros, materiais e humanos mínimos para a gestão da área protegida”;
  7. A classificação de áreas protegidas regionais e locais é feita por deliberação das assembleias municipais dos concelhos envolvidos, numa inovação que vale a pena destacar, mantendo-se na autoridade nacional de conservação uma verificação periódica de manutenção dos pressupostos de classificação;
  8. É simplificado o regime de ordenamento às circunstâncias das áreas protegidas, sendo obrigatória para os parques nacionais e naturais nacionais, facultativa (prevista ou não no seu diploma de criação) para as reservas naturais e paisagens protegidas nacionais e não existindo nas restantes classificações considerando-se os Planos de Municipais de Ordenamento do Território como os seus instrumentos de gestão territorial;
  9. É legalmente consagrado o sistema de inventário e disponibilização da informação, designado Sistema de Informação para o Património natural (SIPNAT);
  10. Merece destaque a criação ex-novo do Cadastro Nacional de Valores Naturais Classificados (prazo de dois anos para elaboração do primeiro) que não deve ser confundido com o inventário do património natural. O cadastro é o registo dos valores classificados, é revisto periodicamente e sujeitas as revisões a discussão pública. Na prática, entre outras coisas, este cadastro vem dar conteúdo jurídico aos livros vermelhos que eram, até agora, instrumentos técnicos de apoio à decisão. Outra das consequências do cadastro é criar um instrumento de classificação nacional de espécies e habitats que apenas existia enquanto subsidiário de classificações supra-nacionais. Refira-se ainda que qualquer pessoa ou entidade pode propor a integração de qualquer valor no cadastro desde que fundamentado em informação científica;
  11. Refira-se a expressa previsão de planos de inspecção e fiscalização que até ao momento, a existirem, não decorriam da lei e cuja elaboração passa a ser uma obrigação da Autoridade Nacional de Conservação;
  12. Relevante é também o direito de acesso e a decisão de embargo que é conferido às autoridades administrativas no âmbito da fiscalização;
  13. Uma inovação a destacar consiste na ligação da gravidade das contra-ordenações ao estatuto de protecção dos locais onde é praticada mas também ao estatuto de ameaça constante do cadastro, o que vem conferir um alcance jurídico novo à determinação do estatuto de ameaça das espécies e habitats, reforçando o carácter jurídico associado aos livros vermelhos;
  14. Chama-se ainda a atenção para as disposições transitórias que regulam a transição das actuais classificações para as novas, que em caso de incumprimento pode, em alguns casos identificados, revogar a classificação existente.

Henrique Pereira dos Santos

1 comentário:

Miguel B. Araujo disse...

muito útil, henrique. obrigado