sábado, dezembro 01, 2012

Flora-on


"Classificar objectos é uma prerrogativa humana baseada na capacidade da mente de conceptualizar e reconhecer a presença de propriedades similares em objectos individuais." Para W. Quine, o autor desta frase, classificar é inato. A diversidade de objectos, seres vivos ou comportamentos com os quais convivemos é incognoscível sem uma taxonomia. Classificar exige rótulos, que são, em si, uma expressão sintética de um conjunto de propriedades. Classificar é, portanto, indissociável de rotular: como dizem os bascos,  "só existe o que tem nome". Classifica-se porque o ato de classificar é adaptativo. 
Para agir informadamente e com sucesso sobre a realidade é necessário: 1) torcê-la, reduzi-la, simplificá-la para caber num sistema de classificação; 2) dominar a sua taxonomia. Assim é com tudo, e com as plantas. Para conservar plantas e as suas socializações (a vegetação) é preciso dominar a sua taxonomia, do mesmo modo que para cozinhar comida vegetariana é necessário conhecer os legumes, ou para gerir adequadamente uma pastagem identificar as suas leguminosas.
As plantas alimentam-nos, curam-nos e envenenam-nos. Interagir com os seres vivos faz-nos felizes. Classificar plantas deve ser importante, mesmo. Por isso a botânica como ciência começou por ser taxonómica. E por certo éramos já botânicos profissionais quando deambulávamos sem destino, no limiar da extinção, nas margens do lago Turkana.
Se a sistemática botânica é importante então seria expectável que o sistema público de ensino (a todos os níveis), ou os institutos de conservação da natureza liderassem o seu ensino e difusão. Algo semelhante ao que se reclama para o sistema público de radiodifusão, não é assim? Informação livre regulada pelo estado!!! Mas, não. Cada vez se ensina menos o fundamental, e mais o assessório, o ultraespecializado de escassa utilidade prática, que embota a nossa capacidade agir sobre o mundo. Na escola aprende-se tudo sobre OGM's.  Enxofradelas desconexas e sem convicção sobre como maltratratamos o mundo são o prato do dia. Na biologia desce-se ao pormenor da estrutura e função dos organitos, dos mecanismos moleculares da célula, da bioquímica da respiração e da fotossíntese contabilizada ao átomo, mas nada ou muito pouco de botânica clássica. Do mesmo modo gastam-se horas com fitorremediação (uma técnica de escassa utilidade, Darwin explica porquê) ou a falar de algas para produzir combustíveis (explicando como se fertilizam com CO2 mas omitindo o fósforo), mas nada sobre o mais importante ramo da botânica aplicada: a agricultura. Aqui, em Portugal, e no mundo fora.
Felizmente a sociedade civil quer lá saber de ideias e grupos dominantes. Livres dos sistemas de reprodução social que colonizam o estado (e que bem se identificam na educação!), das ideias feitas dos pensadores da educação, dos licenciados disto e daquilo, de quem vence o concurso de catedrático, dos Lysenkos e dos comissários, teimam em seguir o seu caminho, e viver a sua liberdade.
Por isso admiro tanto o projecto Flora-on (www.flora-on.pt). Informação livre, democrática para todos sobre uma coisa muito importante: as plantas. Quem sabe e quer contribuir,contribui. Quem não quer, não consegue estragar. Sem subsídios ou concursos públicos, a utilidade social do Flora-on cresce de dia para dia. São estas coisas que me dão esperança.

1 comentário:

Anónimo disse...

Olá Carlos,

Reli hoje este post e vou guardá-lo para voltar a ler nos períodos em que é dificil arranjar tempo para cultivar a "planta", pois o último parágrafo faz renascer o empenho em acrescentar algo mais ao projecto.

Obrigado,

AC