quarta-feira, junho 05, 2013

Da precaução excessiva


Há bastante tempo que oiço histórias de avistamentos de lince em Portugal, às vezes mais que avistamentos. Ainda hoje de manhã me telefonaram a falar de mais um avistamento, aparentemente credível, pela zona do Tejo Internacional, há menos de um ano.
Devo dizer que estes avistamentos, em si mesmos, incluindo o que foi confirmado esta semana por fotografia, têm muito pouco significado para a discussão da conservação da espécie porque o mais natural é que existam por aí alguns linces divagantes que, uma vez por outra, chegam mais longe.
Para quem, como eu, acha que é natural e razoável admitir que existam linces aqui e ali, sem que isso tenha qualquer relevância no estatuto de conservação da espécie (o que importa é a definição das áreas de criação, e não o raio de acção dos divagantes), esta observações isoladas são curiosidades.
Admito que para quem acha que não há mesmo linces em Portugal há bué, a observação de um animal seja muito excitante.
O que me interessa fazer notar é que grande parte das observações que conheço (já dando o desconto daquelas que não têm a menor consistência) provêm de caçadores. E a última coisa que querem é que se saiba que existem linces na sua zona. Ou mais precisamente, até querem que se saiba (a mim dizem-me), muitos até têm orgulho nessa presença de lince (mesmo que fugaz) mas não querem de todo complicações e restrições que associam (do meu ponto de vista, muitas vezes erradamente) à confirmação oficial da presença de uma espécie protegida.
O que me parece que merece consideração e discussão é o facto de tanto alarido, a que se associa uma precaução extrema em estabelecer regras e regrinhas, em contestar estradas e estradinhas, barragens e barraginhas e o mais que se lembrarem sempre que se está na presença de um desses bichos, conduziu a um verdadeiro corte de comunicação do sector da conservação com a generalidade do sector da caça (que é, muitas vezes, o da agricultura e da pastorícia).
Esta desconfiança extrema impede que estas observações sejam integradas e escrutinadas, que no seu conjunto ganhem um significado que isoladamente nunca terão, obrigando o sector da conservação a procurar por si os indícios de presença do bicho, prescindindo do facto de haver milhares de caçadores no terreno, com as antenas bem afinadas para a vida selvagem.
Como o lince agora aparecido parece confirmar, bem andaria o sector da conservação em avaliar se de tanto querer não asfixia a coisa amada, como o ciumento que não suporta a liberdade da vida dos outros.
henrique pereira dos santos

1 comentário:

Jaime Pinto disse...

Por aqui nada há a dizer. Num grupo fechado de caçadores (e não só) do FB, já se colocaram mais de 500 mensagens relativamente ao lince de VNMilfontes. Umas das discussões mais interessantes tem sido se serão 2 linces, pois as fotos, segundo muitos, para aí apontam. Também tenho colaborado nessa discussão. Uma das mensagens foi:

Um pouco fora da linha desta discussão, gostaria de referir algo que para mim é importantíssimo. Caso em lugar de ter sido o confrade Caim a obter as fotos tivesse sido um dos ambientalistas/empresários que sustenta a vida via projectos lifes e quejandos, pois bem poderíamos tirar o cavalinho da chuva que nunca teríamos a oportunidade de estarmos com estas discussões. Isso ficaria no segredo dos deuses e dos cientistas, quando muito uma fotinha nos media para fazer prova, encher o peito de glória e fama, sem esquecer argumentação fenomenal no sentido do caminho ser aquele, tinha de vir mais massa dos contribuintes, evidenciando o fantástico trabalho que se estava a desenvolver. Bem-haja pois quem guiou o Hongo (pelo menos) na direcção da câmara de um felizardo caçador. A exultação da natureza é assim permitida aos humildes que sustentam elites, senadores e comissários da natureza. E se a discussão tem sido extraordinária e proveitosa, sem tiques de vedetismo, sempre com educação, elevação e respeito pelas opiniões dos outros.